Mariana 07/11/2020qualquer coisa sobre o mar é a pátria desses homens do cais, do povo de Iemanjá"Lívia saudou o mar com a mais bela canção que sabia e assim o saveiro atravessou o quebra-mar e entrou na boca da barra, porque as belas canções que as mulheres cantam compram o vento e o mar."
É um dos primeiros romances que Jorge Amado escreveu, da mesma época de Jubiabá e de Capitães da Areia. Faz parte de uma fase jovem do autor, e neste caso quem toma conta do livro é o romance entre os dois personagens. Por isso diz-se que, apesar de um livro político, é um livro lírico, que foca menos na estética socialista (presente em vários outros livros dele) e nas descrições sociais, para dar mais ênfase na descrição dos sentimentos dos personagens: de desejo, de perda, de medo, de raiva, de amor.
A história se passa em Salvador, e nela o mar não é só o plano de fundo, é também o principal meio de vida, de sobrevivência, fonte de amor e de medo de todos os personagens. O personagem principal é Guma, marítimo e dono de saveiro, que ganha seu sustento transportando cargas com seu barco.
O que mais gostei no livro foi o ambiente místico criado pelo autor, que faz do mar, ao mesmo tempo, um campo de batalha e um ninho de amor. Nele, Iemanjá, ou Janaína, a Princesa de Aiocá, é quem manda. E todos os mestres de saveiro sabem disso. Todos a amam e a respeitam, por ser mãe e amante de todos eles. Muito bonitas as referências!
"É uma imensa massa humana que se movimenta na areia. A igreja de Mont Serrat aparece no alto, mas não é para ela que se dirigem esses braços cheios de tatuagem. É para o mar, esse mar de onde virá Iemanjá, a dona daquelas vidas. Hoje é dia dela brincar na areia, dela festejar as suas bodas com os marítimos, dela receber os presentes que os noivos rudes lhe trazem, de receber as saudações daquelas que em breve serão suas sacerdotisas. Hoje é dia dela se levantar, de espalhar seus cabelos na areia, de brincar com eles, de lhes prometer bons ventos, cargas felizes, mulheres belas."
Gostei também da personagem da professora Dulce, moça boa que, de tanto conhecer a miséria do cais, começou a esperar por um milagre. Só um milagre salvaria aquela gente. Que milagre Jorge Amado nos propõe?
"quando a professora os via (chamava-se Dulce), não os reconhecia mais, eram uns homenzarrões, de peito descoberto e rosto queimado. Ainda passavam por ela, tímidos, de cabeça baixa, e todavia a amavam porque ela era boa e cansada de tudo o que via na beira do cais."
Não foi o romance de Jorge Amado que maaais gostei, acho que tem livros dele que me prenderam mais, mas é um bom livro!