Karlla.Daltro 14/05/2021
Vozes femininas colocando em pauta assuntos até hoje polemizados.
Esse é o terceiro romance da autora Lygia Fagundes Telles, onde 'As Meninas' que intitulam o livro são as amigas Lorena Vaz Leme, estudante de Direito, de comportamento guiado pelo ideal romântico de feminilidade, Lia de Melo Schultz, a militante de esquerda que estuda Ciências Sociais e a linda Ana Clara Conceição, estudante de psicologia assombrada pelo passado marcado por abusos sexuais e pelo presente dominado pelo uso de drogas.
Em 1969, ano que se passa os acontecimentos, as três vivem no Pensionato Nossa Senhora de Fátima, ao redor do qual ronda o fantasma da ditadura militar brasileira.
O livro merece constar entre os mais ousados da literatura brasileira, em primeiro lugar porque discute e relata explicitamente a barbárie dos porões da ditadura enquanto esta ainda estava em vigor no país, reproduzindo corajosamente e pela primeira vez na ficção do Brasil, um depoimento de tortura de um preso político.
Aliás, a razão pela qual 'As Meninas' escapou da censura é bem curiosa: segundo Lygia disse no documentário “Lygia, uma escritora brasileira”, produzido em 2017 pela TV Cultura, o setor responsável por avaliar o romance, achou o livro tão monótono que não passou das primeiras quarenta páginas lidas (ainda bem kkk).
Sendo assim, os efeitos da intervenção do regime político na vida individual da burguesia paulistana são amplamente questionados através da íntima trajetória das três amigas no intervalo de tempo em que a história acontece. Ainda que a opressão as afete de maneiras distintas, considerando as próprias diferenças de personalidade das meninas, o autoritarismo constitucionalizado as cercam com igual eficiência, mantendo elas em um mesmo cativeiro.
A autora não poderia escrever um romance "morno" no ano de 1970 (ano que ela planejou o livro). Ela sabia realmente os vícios daquela sociedade.
Por meio das vozes de Lorena, Lia e Ana Clara, são colocados em pauta assuntos até hoje polemizados, como a emancipação sexual feminina, a homossexualidade, o uso de drogas e o papel do militarismo dentro do Estado.
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