Nós matamos o Cão Tinhoso!

Nós matamos o Cão Tinhoso! Luís Bernardo Honwana
Luís Bernardo Honwana
Luís Bernardo Honwana
Luís Bernardo Honwana




Resenhas - Nós matamos o cão-tinhoso


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bibia.sucena 27/08/2023

"aos cavalos mansos mata-se todos os dias."
Todos os contos são extremamente tristes, fortes e reflexivos. O meu favorito sem dúvidas foi "a mão dos pretos", que é movido pela curiosidade de uma criança e da mente deturpada dos adultos.
gii.avellar 27/08/2023minha estante
esse conto e lindo demais


Rayoo 27/08/2023minha estante
terminei ontem e ainda me pego pensando nesse livro, o conto " a mão dos pretos" tbm foi meu favorito a frase final da mãe para a criança ainda passa na minha cabeça.




Evellyn.Souza 02/10/2023

Um pouco difícil de ler, mas acredito que seja uma grande obra, já que é cobrada no vestibular agora.
Mariane 03/10/2023minha estante
o primeiro conto (único que li) é angustiante


Evellyn.Souza 04/10/2023minha estante
Da raiva demaiss




aelinella 29/07/2023

Um ótimo livro para entender o colonialismo português em moçambique e suas consequencias na sociedade, mostrando o impacto sofrido em todas as esferas de trabalho e identidade. Alguns contos são pesados mas necessários para expressar a violência e o modo de vida dos nativos que sofreram com a colonização.
hoonautica 30/07/2023minha estante
?????




Isabela 15/02/2024

Retrata a violência que foi vivida durante a colonização em Moçambique, então tem cenas bem pesadas e reflexivas. Esse livro traz as injustiças que muitos moçambicanos sofreram e por isso eu considero esse livro tão importante.
Maria 15/02/2024minha estante
falou tudo diva




Millalud 20/07/2023

O cão colonizador
Escrito em 1964, mesmo ano em que o autor Luis Bernardo foi preso por sua participação na FRELIMO, o livro conta com 7 contos que dão voz à situação degradante em que Moçambique se encontrava sendo uma colônia portuguesa, e ainda crítica os valores coloniais.
O primeiro conto, que dá título ao livro, é uma clara reflexão sobre o colonizador na visão do colonizado, sendo o cão tinhoso com seus olhos azuis, uma alusão ao homem branco, algo que as pessoas precisavam eliminar - e de fato eliminam. Todos os outros contos, possuem mensagens como essa, Inventário de imóveis e jacentes e Nhinguitimo, criticando a imobilidade social, já Dina, Papá, cobra e Eu e A velhota, a opressão branca.
No geral, é um livro excelente e necessário para o conhecimento da realidade vivida pelos moçambicanos no meio dos conflitos que antecederam a Independência de Moçambique.
Pedro Cosmo 20/07/2023minha estante
?????




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Anny50 03/04/2023minha estante
atualizando: uma amiga leu dina e abstraiu de que a mulher no caso seriam os colonos moçambicanos que eram explorados pelos portugueses em troca de mixarias, assim como no conto, em que a moça foi abusada e ganhou algumas moedinhas em troca




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DANILÃO1505 28/09/2022minha estante
Parabéns, ótimo livro

Livro de Artista

Resenha de Artista!




wesley.moreiradeandrade 11/01/2017

“O Cão-Tinhoso tinha uns olhos azuis que não tinham brilho nenhum, mas eram enormes e estavam sempre cheios de lágrimas, que lhe escorriam pelo focinho. Metiam medo aqueles olhos, assim tão grandes, a olhar como uma pessoa a pedir qualquer coisa sem querer dizer.” (p. 13)

Nós Matamos o Cão-Tinhoso é um clássico da literatura moçambicana. Escrita e publicada no período em que a luta pela independência do país (o livro foi publicado em 1964) atingia seu ápice, esta coletânea de contos reflete bem este momento político. O livro foi escrito por Luis Bernardo Honwana enquanto estava preso e marcou uma nova fase para a então incipiente literatura do país africano que tem a língua portuguesa como língua oficial. Além do conto que dá título ao livro, o melhor de todos, temos outros textos que retratam a condição do negro (que o conto “As mãos dos pretos” expõe de forma original e poética), a tensão entre colonizadores e colonizados (muitos dos países africanos colonizados por Portugal apenas conseguiram sua independência na década de 1970) e a exploração e o preconceito existentes naquele país. O tom planfetário muitas vezes prejudica as narrativas em que a linguagem poética cede lugar ao discurso político, mas que são compreensíveis num período em que a luta pela independência se dava pela via armada e também pela palavra (Os escritores e poetas tiveram um papel fundamental nesta busca de países como Moçambique, Angola, Cabo Verde, entre outros, por liberdade, Honwana inclusive), tratou-se então de uma escolha coerente. “Nós Matamos o Cão-Tinhoso” retrata a estória de Ginho um garoto nativo assimilado (que convive e frequenta a escola dos brancos) que se sensibiliza e fica penalizado com figura do Cão-Tinhoso, um cachorro cheio de sarnas e feridas que incomoda a todos no vilarejo e é escorraçado até mesmo por outros cães. Até que o Senhor Duarte da Veterinária chama um grupo de crianças, a malta, para matar o cachorro e Ginho, por fazer parte do grupo e precisar também ganhar o respeito dos colegas, é incumbido de dar o primeiro tiro no animal. Houve quem interpretasse esta estória sob o viés de que o cão-tinhoso representasse o colonizador que precisa ser eliminado para ceder lugar ao colonizado e pôr fim a anos de opressão e houve quem considerasse o cão-tinhoso como o próprio nativo que incomoda e precisa ser eliminado pela metrópole não só através da violência mas pela aculturação e o apagamento de sua história e tradição. Ambas visões válidas para uma obra que ainda faz-se contemporânea e urgente, relevante até em terras tupiniquins que vivem intensamente as injustiças que, desde os tempos da escravidão, desde depois do fatídico 22 de abril, pesam nas suas questões sociais e raciais.

site: https://escritoswesleymoreira.blogspot.com.br/2014/02/na-estante-13-nos-matamos-o-cao-tinhoso.html
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skdv 29/04/2024

Surpreendente
Eu tenho muitas opiniões sobre este livro, muitos sentimentos que precisam serem digeridos. É uma leitura intensa, mostrando uma realidade difícil, e o mais surpreendente, é extremamente recente.

Contos que abordam racismo, abuso, estrutura social e muito mais. É mostrado o período de colonização de Moçambique, com pontos de vistas diferentes, e os que mais me afetaram, foram as histórias narradas por crianças, por que elas realmente viveram aquilo, e é preocupante.

Apesar de ter sido uma leitura "obrigatória", eu me sinto completamente grato por ter lido, eu acho que eu e muitas pessoas, precisava ou precisam dessa leitura, é intenso e forte, mas extremamente necessária, porquê apesar de tudo, as pessoas retiradas não deixam de ter esperança, e isso, é inspirador.
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Maria - Blog Pétalas de Liberdade 17/01/2018

Resenha para o blog Pétalas de Liberdade
A obra é composta por oito contos, sete já publicados em edições anteriores e um publicado pela primeira vez nessa edição. Um pouco sobre cada conto:

"O Cão Tinhoso olhava-me com força. Os seus olhos azuis não tinham brilho nenhum, mas eram enormes e estavam cheios de lágrimas que lhe escorriam pelo focinho. Metiam medo aqueles olhos, assim tão grandes, a olhar como uma pessoa a pedir qualquer coisa sem querer dizer." (página 36)

O primeiro conto é o que dá título ao livro. Com cerca de quarenta páginas e narrado pelos olhos de um menino, "Nós matamos o cão tinhoso" nos apresenta um grupo de estudantes que mora numa vila onde há um cão cheio de marcas e feridas (prefiro não revelar aqui o que causou essas marcas), e que por seu aspecto repulsivo e seus olhos muito expressivos, causa medo e repulsa nas crianças e nos outros cães. Somente uma das garotas da escola não o temia, e por mais esse motivo era considerada "ruim da cabeça". O título do conto já deve lhes dar uma ideia do que acontece, não é mesmo?! Mas não pensem que foi algo fácil, algo que não trouxe uma reflexão para os garotos, que não mexeu com eles de alguma forma.

"Eu sabia que ele já sabia de muitas coisas para só querer o que qualquer cão podia ter. O Cão tinhoso devia estar à espera de qualquer coisa diferente do que os outros cães costumam ter" (página 44)

"Inventário de imóveis e jacentes" é apenas a descrição de uma casa, com seus cômodos e móveis. E mesmo sendo apenas uma descrição de poucas páginas pelos olhos de um dos filhos do dono da casa, foi um dos contos que mais gostei. É uma casa pequena para o número de pessoas que abriga, uma casa simples, mas onde há livros. Em "Dina" somos apresentados ao árduo trabalho numa plantação de milho. Trabalho que fica ainda pior quando o capataz branco demora a chamar os trabalhadores para a hora do almoço. Mas o que os pobres trabalhadores poderiam fazer?

"A velhota" é sobre um rapaz que depois de ser agredido, decide ir até a casa da mãe e dos irmãos mais novos. Lá, ele se sente dividido entre contar aos irmãos pequenos sobre a brutalidade que enfrenta e um fiapo de esperança de que o futuro seja diferente para os irmãos, que talvez eles não se revoltem como ele ao ser humilhado ou que talvez os mais novos vivam numa época melhor, sem sem tantas humilhações.

"E precisava ir para casa para encher os ouvidos de berros, os olhos de miséria e a consciência de arroz com carril de amendoim." (página 81)

"- Conta, conta! - e os miúdos rodeavam-nos na esteira.
Não, eu não contaria. Não fora para isso que viera para casa. Além disso, não seria eu a destruir neles fosse o que fosse. A seu tempo alguém se encarregaria de os pôr na raiva. Não, eu não contaria." (página 84)

"Por que não acreditar em qualquer coisa de giro? Como por exemplo que a formação dos miúdos fosse diferente da minha e que lhes conferisse uma condescendência para com aquelas coisas, uma condescendência que as minhas coordenadas emocionais não comportavam... E que talvez, eu sei lá, que talvez para com eles o tempo obrigasse a mais compreensão, mais carinho, sim, a mais humanidade... Porque talvez a velhota tivesse razão, há o tempo, o tempo..." (página 85, "giro" significa interessante, bonito)

"Papá, cobra e eu" volta a ser narrado por um garoto, em cuja propriedade há uma cobra que está causando problemas para a família. E veremos a aproximação do menino com o pai, que lhe dará sábios conselhos que talvez ele só compreenderá quando for maior.

"- Meu filho, tem de haver uma esperança! Quando um dia acaba e sabemos que amanhã será tudo igualzinho, temos de ir arranjar forças para continuar a sorrir e continuar a dizer ‘isso não tem importância’. Ainda hoje viste o Sr. Castro a enxovalhar-me! Isso foi só um bocadinho da ração de hoje... Não, meu filho, mesmo que isto tudo só O negue, Ele tem de existir!...
O Papá parou de repente e sorriu num esforço. Depois acrescentou:
- Mesmo um pobre tem de ter qualquer coisa... Mesmo que seja só uma esperança!... Mesmo que ela seja falta!..." (página 103)

"- Sabes, meu filho, - o Papá falava pausadamente e gesticulava muito antes de cada palavra - sofre-se muito... Muito, muito, muito!... A gente cresce com muita coisa cá dentro mas depois é difícil gritar, tu sabes...
[...] Quando um cavalo endoidece dá-se-lhe um tiro e tudo acaba, mas aos cavalos mansos mata-se todos os dias. Todos os dias, ouviste? Todos , todos, todos enquanto eles se aguentarem de pé!..." (página 104)

"As mãos dos pretos" traz a curiosidade de um garoto em entender o motivo de as palmas das mãos dos negros serem mais claras que o restante do corpo. Curiosidade que gera muitas histórias com visões diferentes, algumas bem racistas, mas é a explicação da mãe que mais vai tocar o garoto.

"Pois olha: foi para mostrar que o que os homens fazem, é apenas obra de homens... Que o que os homens fazem é feito por mãos iguais, mãos de pessoas que se tiverem juízo sabem que antes de serem qualquer outra coisa são homens." (página 109)

"Nhinguitimo" começa falando sobre pássaros, depois nos mostra como os sonhos de prosperar através do trabalho duro poderia ser destruído pela ganância dos que já tinham dinheiro.

"- Matchumbutana... - Vírgula Oito falava lentamente, titubeante - Matchumbutana... Eu nasci naquela terra... O meu pai também nasceu lá. Toda a minha família é do Goana... Os meus avós todos estão lá enterrados... Maguiguana, o Lodrica tem lojas, tem tratores, tem machambas grandes... Por que é que ele quer o nosso sítio? Por quê?" (página 128)

"Rosita, até morrer" é o último conto do livro, um extra publicado na edição da Kapulana, e é uma carta de Rosa para Manuel, o pai de sua filha. Rosa não escreve usando a grafia correta das palavras, mas faz o possível para mostrar para Manuel que se lembra dele e que ficaria contente se pudesse vê-lo novamente, já que faz tempo que ele a abandonou. É um conto tocante.

"Quando tu quer tu vem escançar, só escançar, conhecer tua filha comer os ovo com galinha, com cabrito quando vocé guenta, beber ucanhi nas família da terra, tomar banho no rio, dançar xingombela no casa de N’Dlamini, mais nada. Quer? Vocé vai pruguntar as pessoa que anda aqui a falar assim: O! Manuel tem esta nossa pele mas agora é branco, comprou ser branco nos papel, esquenceu os vovô dele que morreu, esquenceu filha dele que nasceu, esquenceu terra, esquenceu tudo. Eu diz é mentira, Manuel não pode esquencer. As pessoa ri, as pessoa diz eu não sabe, as pessoa diz cada vez eu é polícia também. Vocé é? O, vem dizer mesmo! Depois vocé vai tembora quando não gosta ficar aqui fazer machamba, ensinar as pessoa no escole de noite que voces tinha na casa de Mussá. Vocé vai, eu não vai agarar vocé, só vai chorar mesmo." (páginas 140 e 141)

Considerações gerais: O livro "Nós matamos o cão tinhoso" foi publicado pela primeira vez em 1964, e no mesmo ano o autor Luís Bernardo Honwana foi preso pela sua militância em prol da independência de Moçambique, até então uma colônia Portuguesa. A obra é considerada uma das mais importantes da literatura moçambicana e africana, e talvez vocês saibam que Moçambique é um dos países onde se fala o Português (além de outras línguas nativas).

Foi interessante notar a diferença entre o Português falado e escrito lá em Moçambique nos anos sessenta e a forma como o falamos nos dias atuais. Percebi que inúmeras palavras que vejo conhecidos com mais idade usando e que eu até achava que eram "erradas", são apenas palavras que foram sendo menos usadas com o tempo. Além de algumas notas de rodapé para ajudar o leitor a entender certos termos, pesquisar no dicionário outras palavras que aparecem no texto pode auxiliar o leitor a compreender melhor as histórias.

Por ser uma obra com um certo contexto histórico e pelo fato de eu amar contos, estava com expectativas elevadíssimas, e confesso que a leitura não alcançou minhas expectativas, talvez pelo choque entre a cultura em que vivo e a encontrada nos contos. Ainda assim, é um livro que vale a pena ler para conhecer mais da realidade de Moçambique de décadas atrás, e entender melhor as relações de poder entre colonizadores e colonizados. No final do livro há um artigo contextualizando um pouco a obra, e foi interessante para mim encontrar interpretações diferentes das minhas para alguns contos. Falando em interpretações, se vocês pesquisarem no Google pelos títulos ou trechos dos contos presentes na resenha, encontrarão várias análises deles (bem mais estendidas que meus pequenos comentários), o que mostra a relevância da obra.

Enfim, entre traquinagens de crianças, trabalho árduo em plantações, conflitos entre brancos e negros, entre colonizadores e nativos, e sonhos desfeitos frente à dureza da realidade, "Nós matamos o cão tinhoso" é um livro válido para entendermos um pouco mais da cultura africana, uma cultura que também chegou até o Brasil, ainda que para mim, mulher, jovem, mineira e branca, seja uma realidade muito distinta da minha.

A edição da Kapulana tem uma capa condizente com a obra, páginas amareladas, boa revisão e diagramação com margens, espaçamento e letras de bom tamanho.

site: http://petalasdeliberdade.blogspot.com.br/2018/01/resenha-livro-nos-matamos-o-cao-tinhoso.html
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Maria Ferreira / @impressoesdemaria 07/05/2018

Contos tocantes
Este é um livro de contos do autor moçambicano Luís Bernardo Honwana. Publicado pela primeira vez em 1964, com sete contos: “Nós Matamos o Cão Tinhoso”, “Inventário de Imóveis e Jacentes”, “Dina”, “A Velhota”, “Papá, Cobra e Eu”, “As Mãos dos Pretos” e “Nhinguitimo”. Esta edição da editora Kapulana, lançada em 2017 no Brasil, depois de 37 anos desde a primeira publicação, traz um conto inédito: “Rosita, até morrer”. Esta edição também conta com um posfácio de Vima Lia de R. Martin, professora de Letras da USP.

O conto que dá título ao livro é de uma potência muito grande. Narrado em primeira pessoa por um garoto chamado Ginho, que nos apresenta um cachorro chamado por todos de Cão Tinhoso e estava muito doente, de modo que causava nojo e desconforto nas pessoas, apesar de não ter ânimo nem para correr atrás das galinhas: “As galinhas nem fugiam, porque ele não se metia com elas” (p.11) O cão costumava ficar nas redondezas da escola em que Ginho estudava e inspirava histórias que justificavam seus machucados. “O Cão Tinhoso tinha a pele velha, cheia de pelos brancos, cicatrizes e muitas feridas, e em muitos sítios não tinha pelos nenhuns, nem brancos nem pretos e a pele era preta e cheia de rugas como a pele de um gala-gala” (p.14-15). A única pessoa que gostava do cão, a ponto de querê-lo perto e dividir seu lanche com ele, era uma menina chamada Isaura.

Um dia mandam o veterinário matar o cão e ele passa essa responsabilidade para as mãos de um grupo de garotos de gostam de brincar de tiros. Ginho faz parte desse grupo, porém não gosta nada dessa ideia de matar o Cão Tinhoso, mas não pode fazer muita coisa para impedir, além de que também não queria ser mal visto pelos garotos de sua turma. São 12 garotos contra um cão e a descrição da morte faz pensar no quanto o ser humano pode ser mau e despropositado em suas ações.

No conto “As mãos dos pretos”, que também é narrado em primeira pessoa por um garoto que ouve do professor “que as mãos dos pretos são mais claras do que o resto do corpo porque ainda há poucos séculos os avós deles andavam com elas apoiadas ao chão, como os bichos do mato, sem as exporem ao sol, que lhes ia escurecendo o resto do corpo” (p.107) e fica encucado com essa justificava, então resolve sair colhendo opiniões de diferentes pessoas sobre o assunto, até que sua mãe lhe dá a resposta mais linda que poderia ser dada.

Não por acaso estes dois contos referidos acima são os que mais gostei. Eles são dois dos quatro que são narrados por crianças e isso faz com que a narrativa ganhe um tom especial porque as crianças veem o mundo de uma forma inocente e ingênua.
O conto inédito em livro “Rosita, até morrer”, apresenta uma escrita totalmente diferente dos demais porque com muito sentimento vamos lendo a carta que Rosita escreve para seu ex-namorado que a abandonou grávida e o que é mais tocante é que ela não teve oportunidade de estudar muito, então a carta está escrita cheia de “erros” e discordâncias gramaticais, mas apesar disso, passa a mensagem que ela quer transmitir. É muito triste a história dela.

O livro foi publicado em 1964, em um contexto histórico no qual Moçambique passava por uma guerra pela independência de Portugal, daí pode-se surgir algumas possíveis interpretações dos contos que vão para o lado da crítica política e social, como também da distinção de classe e do racismo.
Tudo nesta edição está impecável, desde a capa às notas de rodapé que podem ajudar o leitor brasileiro, pouco familiarizado com o português de Moçambique, a entender algumas palavras e expressões.
Recomendo fortemente a leitura, principalmente para quem gosta de narrativas feitas por crianças e de contos profundamente tocantes.

site: https://www.impressoesdemaria.com.br/2018/05/nos-matamos-o-cao-tinhoso-luis-bernardo.html
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Manuel Gimo 09/08/2019

Nós Matámos o Cão-Tinhoso, uma obra à frente de seu tempo!
AUTOR: Luís Bernardo Honwana
TÍTULO: Nós Matámos o Cão-Tinhoso
LOCAL DA PUBLICAÇÃO: Maputo
EDITORA: Alcance Editores
EDIÇÃO: 2ª ed.
ANO: 2014
PÁGINAS: 121
FORMATO DO LIVRO: eBook (PDF)




SINOPSE:


Escritor moçambicano, Luís Bernardo Honwana nasceu em 1942, vivendo parte da sua vida ainda durante a época colonial. Em 1964 publicou “Nós Matamos o Cão-Tinhoso”, uma narrativa que compila sete contos, onde o visual domina a escrita, e a hierarquia colonial, nas suas marcas do dia-a-dia, domina as temáticas.


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ANÁLISE:

“Nós Matámos o Cão-Tinhoso” é uma colectânea de sete contos da autoria de Luís Bernardo Honwana, publicado originalmente em 1964 pela Editora Afrontamento. A segunda edição sai sob a chancela da Alcance Editores meio século depois.
“Nós Matámos o Cão-Tinhoso” foi escrita durante o tempo que Honwana passou na prisão, quando foi preso pela Polícia Internacional e de Defesa do Estado (PIDE), a secreta do regime colonial português, por simpatizar com os ideias nacionalistas.


A obra é um clássico da Literatura Moçambicana. É considerada uma das melhores obras literárias africanas do século XX, junto com “Ualalapi” (1987) de Ungulani Ba Ka Khosa e “Terra Sonâmbula” (1992) de Mia Couto. É igualmente considerada o inaugurador da Literatura Moderna Moçambicana, trazendo inovações no campo estético-estilístico e linguístico. Projectou o seu autor ao pódio de melhores escritores moçambicanos, e, desde a sua publicação, a obra tem vindo a exercer uma grande influência na geração pós-colonial de escritores moçambicanos.




NÓS MATÁMOS O CÃO-TINHOSO

«- Sabes?... A Isaura foi dizer ao pai que nós...
- O quê?
- Ela pediu ao pai para nos bater...
- Bater?... Porquê?
- Porque NÓS MATÁMOS O CÃO-TINHOSO!... - E ria-se com força, todo torcido.
- Não é tramada? E esta, heim?... BATER-NOS PORQUE NÓS MATÁMOS O CÃO-TINHOSO!...
Depois calou-se. E aí falou a Senhora Professora:
- Meninos, para a aula!» (p. 52)



O primeiro conto é o que dá nome à obra. É também o conto mais longo da colectânea. Ginho, o menino protagonista, narra, em primeira pessoa, como ocorreu a horrenda morte do Cão-Tinhoso, um cão vadio e repulsivo que tinha “a pele velha, cheia de pelos brancos, cicatrizes e muitas feridas, e em muitos sítios não tinha pelos nenhuns, nem brancos nem pretos e a pele era preta e cheia de rugas como a pele de um gala-gala. Ninguém gostava de lhe passar a mão pelas costas como aos outros cães.” (p. 25). Odiado por todos (menos o Ginho e a menina Isaura), o destino do canino é traçado pela poderosa mão do Senhor Administrador da vila. E os algozes? Os miúdos da vila, grupo do qual o nosso protagonista mirim faz parte.

Repleto de simbolismos e metáforas sociais, “Nós Matámos o Cão-Tinhoso” é arrebatador, portentoso, e macabramente angustiante.
Com uma linguagem coloquial, ordinária e assente na inocência e emoções de uma criança em tenra idade, “Nós Matámos o Cão-Tinhoso” é um conto genial que espelha a realidade deprimente da sua época, colocando em locus horribilis, de uma forma primorosa, a hierarquia colonial, isto é, a colónia, o colonizador e o colonizado.




INVENTÁRIO DE IMÓVEIS E JACENTES

«Além do quarto em que estamos e do outro em que está a Mamã, a nossa casa tem mais duas divisões: a sala de visitas e a sala de jantar. Esta última tem as paredes enegrecidas pelo fumo, porque dantes a Mamã tinha ali o fogão a um canto. E ocupada por uma mesa já despolida e sem estilo, rodeada por 7 cadeiras, uma de cada espécie, um armário em que alguém escreveu «Elvis», e vários sacos no canto, atrás da porta.
(…)
A sala de visitas tem uma parede comum ao quarto em que estamos e a outra ao quarto em que está a Mamã. Além da porta que dá para a varanda, tem outra que dá para um quartito a que chamamos corredor, para onde também dão as portas deste quarto, da sala de jantar, do quarto da Mamã e da casa de banho. Acho que a Mamã tirou o fogão da sala de jantar por causa do fogo, embora as paredes já estejam todas negras. Talvez fosse porque as paredes do corredor e dos quartos começassem a enegrecer também. Agora a Mamã cozinha numa palhota que se construiu a um canto do quintal. Apesar de se ter mudado para lá há bem pouco tempo, a palhota está quase negra, tanto por dentro, como por fora. Agora deve lá estar a dormir o Madunana. A palhota não tem nada a vedar a entrada.
O Totó deve lá estar a dormir também. Não o ouço a ladrar.» (pp. 55 – 56)



No segundo conto, “Inventário de Imóveis e Jacentes”, a casa do nosso narrador (um menino, de novo! Lá pela frente descobriremos que o personagem já nos é familiar) é um verdadeiro arrolamento de compartimentos, imóveis e gente.

Curto e sublime, “Inventário de Imóveis e Jacentes” é um verdadeiro espetáculo de descrição físico-geográfica.




DINA

«O Capataz descansou as mãos nas ancas e soprou uma breve gargalhada: - Mas o que é que tens, rapariga? Não queres o dinheiro? Tens medo de o receber? - Calou-se, aguardando a resposta da Maria. Mas continuou: Tens medo que os rapazes descubram que és uma puta?
Maria abraçou-se mais apertadamente e, cravando as unhas nas costas, choramingou:
- Madala viu nós... Madala viu...
- E o que é que isso tem? - O Capataz abriu os braços, reforçando a admiração, e depois cruzou-os sobre o peito.
- Madala é minha pai!... - Maria cuspiu as palavras com raiva.
Os homens do acampamento, direitos como estacas, perscrutavam a cara do Capataz.
Esquartejaram-no silenciosamente.
- O quê?! - articulou por fim o Capataz. A cara amarela tingia-se-lhe rapidamente de sangue.
- Eu não sabia que eras filha do Madala... - gesticulou asfixiado. Eu não sabia... palavra de honra, Madala, palavra que não sabia... eu não sabia que tinhas uma filha... tão bonita... eu... sou amigo dela...
O silêncio dos homens do acampamento latejava de tensão.» (p. 74)



O protagonista da vez é Madala, assim chamado provavelmente pela sua já avançada idade. Trabalhador em uma plantação de milho, o homem se vê tirado a sua dignidade como pai pelo sistema opressor. Aliás, não só a dignidade dele, mas a da sua filha Maria, a do Capataz e a de todos os homens da machamba.

Uma história melancólica, revoltante e revelador de um terrível mal que era a colonização.




A VELHOTA

«Sentada na esteira a velhota estava quieta, a ver os miúdos a comer. De vez em quando levantava-se um e vinha trazer-lhe o prato de alumínio para ela servir-lhe mais. Foi de uma dessas vezes que a velhota deu comigo. Estava com a colher de pau erguida, cheia de arroz, e ia despejá-la no prato, quando parecendo lembrar-se de qualquer coisa, se virou para a porta. Logo que me viu espreitou para o fundo da panela e perguntou-me se queria comer.
- Ainda não sei se quero comer ou não - respondi.
Virou-se para o lume, demorou-se um bocado a olhar para as chamas com a concha ainda no ar e depois perguntou:
- Estás zangado? Estás tão zangado que não podes comer e nem sabes se queres ou não?...
- Não, não estou zangado.
A velhota pensou ainda um bom pedaço e resmungou:
- Então está bem, se não estás zangado...» (p. 80)



A tal velhota do conto é a mãe do narrador. É uma mãe que nutre muito amor pela sua prole.

"A Velhota" é um conto deleitoso, com personagens carismáticos e um enredo excelso. Enfim, uma linda história de uma família que, apesar do momento conturbado em que vive, não deixa der ser feliz.




PAPÁ, COBRA E EU

«Comecei a tirar os blocos um por um. Quando tirei o último bloco de uma rima, vi a cobra. Era uma mamba de cor muito escura. Quando se sentiu descoberta enroscou-se um pouco mais apertadamente e levantou a cabecita triangular. Os olhitos brilhavam apreensivos e a língua negra e bífida palpitou ameaçadora. Recuei até sentir nas costas a rede do cercado e depois sentei-me no chão.
(…)
Encurralada ao fundo do vão da rima de blocos, a mamba alargou o seu corpo de maneira a apoiar-se o mais solidamente possível. A cabeça, assente sobre o pescoço esguio, manteve-se fixa no ar, alheia ao movimento do resto do corpo. Os olhitos luziam como brasas.» (pp. 93 – 94)



O protagonista-narrador do segundo conto (como dito antes, um personagem que já nos era familiar) volta neste “Papá, Cobra e Eu” para nos contar da mamba negra que assolava a capoeira na calada da noite.

Cativante e envolvente, “Papá, Cobra e Eu” é um dos contos mais interessantes da colectânea. Coeso e, acima de tudo, com uma trama bem-acabada.




AS MÃOS DOS PRETOS

««Deus fez pretos porque tinha de os haver. Tinha de os haver, meu filho, Ele pensou que realmente tinha de os haver... Depois arrependeu-se de os ter feito porque os outros homens se riam deles e levavam-nos para as casas deles para os pôr a servir como escravos ou pouco mais. Mas como Ele já os não pudesse fazer ficar todos brancos porque os que já se tinham habituado a vê-los pretos reclamariam, fez com que as palmas das mãos deles ficassem exactamente como as palmas das mãos dos outros homens. E sabes porque é que foi? Claro que não sabes e não admira porque muitos e muitos não sabem. Pois olha: foi para mostrar que o que os homens fazem, é apenas obra de homens... Que o que os homens fazem, é feito por mãos iguais, mãos de pessoas que se tiverem juizo sabem que antes de serem qualquer outra coisa são homens. Deve ter sido a pensar assim que Ele fez com que as mãos dos pretos fossem iguais às mãos dos homens que dão graças a Deus por não serem pretos».
Depois de dizer isso tudo, a minha mãe beijou-me as mãos.
Quando fugi para o quintal , para jogar à bola, ia a pensar que nunca tinha visto uma pessoa a chorar tanto sem que ninguém lhe tivesse batido.» (p. 102)



No sexto e penúltimo conto, o narrador (um menino, de novo!) questiona o facto de "as mãos de um preto serem mais claras do que o resto do corpo" (p. 102). E assim ele vai ouvindo as mais variadas e diferentes opiniões acerca do assunto.

O conto é comovente, lindo e, à semelhança do quarto conto, tocante. Honwana trabalha com descriminação e preconceitos raciais de uma forma estupendamente interessante.




NHINGUITIMO

«(…) Então chega o «nhinguitimo».
Nuvens apressadas escapam-se dos montes Libombos, e, descendo a encosta, atravessam o vale. O vento da poeira cessa e recolhe à profundidade das matas do outro lado do rio. O ar pára; os bichos buscam as tocas e as micaias nuas retalham firmemente o céu cinzento.
De repente, o «nhinguitimo» irrompe pelo vale e varre instantâneamente a poeira que enche o ar. Célere, vasculha as matas, derruba os pés de milho e dobra as micaias, que gemem de aflição.» (p. 106)



À semelhança do que acontece em “Inventário de Imóveis e Jacentes”, a narração descritiva ganha uma acentuação mais significativa neste último conto.
“Nhinguitimo” é denunciador de injustiças sociais perpretados pelo sistema colonial. Este "nhinguitimo" natural, uma depressão tropical, é acompanhado por outro "nhinguitimo", que tem mãos brancas por detrás, que avassala a pacata vida do batalhador Vírgula Oito.



Por último, “Nós Matámos o Cão-Tinhoso” é uma obra à frente de seu tempo, daí a sua intemporalidade. Para uma obra de estreia, Luís Bernardo Honwana revelou-se um escritor excepcional.
Honwana, através de figuras de diferentes status sociais, retrata o sarnento, repelente e cruel quotidiano de Moçambique sob a dominação e exploração do colonialismo português, portanto, dando-nos uma visão geral de como se (sobre)vivia naquela época.
No campo narrativo, afigura-se-nos que as estórias de “Nós Matámos o Cão-Tinhoso” têm um denominador comum: o narrador. Ora autodiegético, ora heterodiegético. Mas que, na maioria dos casos, é a mesma entidade em diferentes fases da sua vida. Isto vai-nos sendo revelado à medida que vamos subtilmente descortinando os contos. O efeito, no fim, é catártico.




AVALIAÇÃO: 10/10




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Review by: Manuel Gimo

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Julio.Gurgel 15/05/2020

O cão tinhoso da opressão
Trata-se de um conjunto de contos escritos no início da década de 1960, quando Moçambique ainda era uma colônia portuguesa. Na época, o autor, Luís Bernardo Honwana, tinha apenas 22 anos.

São sete histórias potentes, contadas numa linguagem tão simples e tão local que imediatamente captura o leitor.

Mas não se engane: cada história é uma pancada! O livro fala de estupro, fome, opressão branca, colonialismo, assimilação, apropriação, armas, perdas e extrema pobreza. O racismo estrutural permeia todos os contos. ?Dina? e ?As Mãos dos Pretos? são de arrepiar.

?Eles fizeram me pequenino e conseguem que eu me sinta pequenino?.
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Camilla Protetor 10/08/2020

Nem só de animalidades vive o homem
Livro necessário! A junção dos contos presentes no livro transporta o leitor a diversos cenários, desde uma "brincadeira" entre crianças até o questionamento da hierarquia social, a abuso sexual. O autor evidencia diferentes formas de percepção e exploração de um Moçambique tomado pelo colonialismo.
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@falavaleria | Valéria Martins 15/01/2021

Faces do colonialismo português
O belíssimo conto "as mãos dos pretos" não me era estranho. Tinha uma vaga lembrança de já ter ouvido essa história em algum lugar, como exemplo de alguma discussão étnico-racial.

Este conto compõe o livro "Nós matamos o cão tinhoso", do Luís Bernardo Honwana, que com oito contos vai apresentando as faces do colonialismo português em Moçambique no mesmo momento em que o país iniciava a luta pela independência, uma guerra que durou dez anos, liderada pela FRELIMO (Frente de libertação de Moçambique), organização na qual o Honwana foi militante (o que acarretou na sua prisão).

"preste muita atenção em quem é o cão tinhoso" foi a recomendação de uma amiga quando ela me deu esse livro . E com o peso dessa responsabilidade fui eu fazer a leitura atenta a todos os pormenores.

Que ótimo aviso! Numa leitura despretensiosa, desavisada, os contos podem passar despercebidos do contexto de luta anticolonial . É que não é inteiramente explícito, o autor vai construindo a narrativa e dando os detalhes, meio que alertando "olha, esteja atento, é assim que a gnt vive hj em dia" e não é em vão, o livro nos conta a realidade moçambicana, a perda da esperança, a normalização da violência colonial, a defesa que as mentes colonizadas ainda fazem e os processos de insurgência, de resistência.

Talvez por isso vários contos sejam narrados por crianças que aos poucos vão reconhecendo essa realidade de diferenciação racista e entendo que o caminho nos leva à insurgência.
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