rizzoka 21/09/2023
"Muitas vezes os livros falam de outros livros"
Em tempos em que todos querem discutir temas profundos de forma sempre muito rasa, eis um livro essencial.
Muito mais que um "Sherlock Holmes medieval"! Nunca antes tinha lido algo tão rico. Desde a primeira página me deparei com uma mistura de cultura, arte, história, filosofia, teologia, tudo isso regado com o mistério de uma narrativa muito cativante.
Inicialmente, tive dificuldade para acompanhar a leitura mas tenha em mente que, com o decorrer do livro, você vai entendendo aos poucos todas as questões políticas e as facções dentro da abadia. Depois me adaptei muito, me vi preso do início ao fim e rezava para a chegada dos trechos em latim em que eu deveria "investigar" seu significado em nosso idioma. Inclusive, grande parte dos trechos em latim não tem muita relevância e servem mais pra você se sentir imerso no ambiente clerical.
A filosofia é inserida no livro de maneira brilhante e simples de entender. É discutida a importância da arte, do conhecimento, do que é ou não pecado e heresia, a corrupção e a hipocrisia dentro da igreja católica do século XIII (talvez... provavelmente, até os dias de hoje), amor, sexualidade e inúmeros outros temas debatidos de maneira profunda, sem ser cansativo ou difícil de ler.
A arte é descrita de forma que você fica admirado com a arquitetura, esculturas das figuras santas e outros diversos detalhes sem nem mesmo vê-los. O autor faz um trabalho descritivo genial onde você consegue se imaginar dentro do mosteiro.
Uma obra que te faz refletir sobre os perigos da limitação do conhecimento e de como a fé pode ser usada como combustível para o mal
[SPOILERS ABAIXO]
A destruição da abadia traz consigo muito simbolismo. Seu primeiro significado mostra o fogo, como símbolo de "purificação" pregado pelo Clero, queimando um lugar com um mal interior grotesco (ex: mistérios religiosos, intrigas políticas, escândalos sexuais) como se numa tentativa de "lavar" seus pecados.
Além disso, vi um paralelo muito grande do Finis Africae com a Biblioteca de Alexandria (que existiu de verdade, no século III A.C). A Biblioteca de Alexandria foi um dos maiores acervos de escritos do mundo antigo. Entretanto, apesar de uma riqueza intelectual imensurável, quase ninguém podia acessá-la. Ironicamente, quando o Império Romano invadiu a cidade, a biblioteca foi incendiada, causando uma perda irreversível ao conhecimento humano. Afinal, já que ninguém podia acessar a biblioteca, quem iria defendê-la num momento de crise?
Talvez, mesmo sendo uma ficção, se na abadia houvesse mais que apenas um bibliotecário e seu ajudante podendo acessar o labirinto, poderíamos ver a obra perdida de Aristóteles