gleicepcouto 05/12/2012Um ótimo retrato da (boa) literatura contemporânea norte-americanahttp://murmuriospessoais.com/?p=5123
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É completamente compreensível o interesse de Oliver Stone em dirigir um filme baseado na obra de Dan Winslow, Selvagens (Intrínseca). Desde a página um, o livro exala as características dos filmes que o diretor costuma dirigir: originalidade e dinamismo. Me arrisco a dizer que, se tivesse um pouco mais de sangue, Tarantino entraria na dança.
Mas falemos sobre a trama. Ben (ambientalista e filantropo), Chon (ex-mercenário e militar) e Ophelia (uma “alienada”, mais conhecida como O.) formam um trio diferente de amigos. Misturam amor, negócios e… Drogas. Juntos, ganharam rios de dinheiro na Califórnia vendendo um tipo especial de maconha, mega-hiper-sofistica, somente para os fortes e aqueles que aguentam o tranco da Viúva Branca Ultra (nome carinhoso como chamam a dita cuja). Droga esta, que o Cartel de Baja, no México, quer controle sobre.
A questão é que Ben e Chon estão felizes com o rumo de suas vidas. Não querem se misturar com essa gentalha barra pesada. Apenas querem continuar vendendo sua meconha megapower, mas sem complicações com a lei ou violência. Por isso, eles dizem não à oferta e afirmam não estarem dispostos a cederem à pressão dos traficantes mexicanos. Como represália, o Cartel sequestra O. A partir daí, a história se desenvolve em um nível alucinante, com os dois amigos tentando resgatar O. e, de quebra, solucionando o problema com o Cartel de Baja.
Eu não conhecia Don Winslow, mas depois de ler Selvagens, fui pesquisar sobre. Esse norte-americano, ex-detetive particular, já escreveu 16 romances de mistério e policiais. Bem, não sei quanto aos outros livros, mas em Selvagens, ele arrebenta.
A premissa é muito interessante, mas o que salta aos olhos é como ele conta a história. Sua narrativa é ágil, entrecortada, direta, contemporânea. Claramente, ele não tem medo de ousar com o uso de linguagem coloquial, onomatopeias, repetições, recortes no tempo e construções de frases/parágrafos/capítulos que fogem do comum – incluindo aí até estrutura de roteiro cinematográfico.
Os personagens acompanham essa originalidade e ambiguidade da narrativa. Apesar de surreais, de alguma forma, o leitor consegue criar vínculos com eles. Seja no caso da problemática O., ou no contraditório Ben, ou no esquentadinho Chon. Em todos eles há pontos de convergência com a realidade, e esse é o barato. A dinâmica entre eles é o caso clássico de três pessoas completamente diferentes, mas que se completam e respeitam o limite do outro acima de tudo. Os personagens secundários também são muito bem desenvolvidos, com histórias de background interessantíssimas, destacando a líder do Cartel.
A ação é vertiginosa. Dan não deixa o leitor respirar um segundo sequer. Tem sempre algo importante e louco acontecendo. Nem por isso, o autor deixa de lado o humor (com muita ironia e sarcasmo) para balancear a correria da história. O romance aqui é bem comedido e mais carnal, não espere sentimentos puros ou algo romântico. O foco mesmo é a aventura desses amigos, lutando contra o narcotráfico mexicano, de modo pouco convencional.
Dan ainda encontra espaço para criticar a sociedade. Basta ler com um pouco mais de atenção, que lá está nas entrelinhas: consumo exagerado, indústria da beleza, armamento norte-americano, guerras inúteis, polícia ineficiente, corrupção, e por aí vai…
Enfim, Selvagens é um ótimo retrato da (boa) literatura contemporânea norte-americana. Livros como esse é que me incentivam a continuar com o blog, sabe? É uma luz no final de um túnel repleto de enlatados produzidos em larga escala na atual indústria editorial.