Gramatura Alta 20/07/2015
Emocionante
Na Teoria do Caos, “o bater de asas de uma simples borboleta pode influenciar o curso natural das coisas e, talvez, provocar um tufão do outro lado do mundo”. Essa premissa é usada na maioria das histórias de viagens no tempo, ao passado. Não é diferente na obra de Cecília Mouta.
Nicola, o personagem principal, está hospedado em uma casa de repouso para acompanhamento médico e psicológico a pedido de sua mãe. Algo aconteceu com ele, mas ele perdeu a memória e, de início, não sabemos exatamente o quê. A única pista que temos é sua fixação com borboletas. Nicola é tratado pela Dra. Liz, uma médica que se mostra mais interessada no paciente do que o normal. Aos poucos, através de ataques dolorosos de dor de cabeça, descobrimos que ele tem a habilidade de voltar no tempo, a qualquer ponto que se lembre, e modificar os eventos.
No filme A Máquina do Tempo, de 2002, baseado na obra de mesmo nome de H.G. Wells, o personagem principal volta ao passado para salvar a vida de sua noiva. Aos poucos, descobre que por mais que faça, ela acaba morrendo de forma diferente. Do mesmo jeito, Nicola usa sua habilidade para salvar o amor de sua vida, Joana. Os momentos em que ela corre perigo são marcados pela presença de uma borboleta verde, e nesses momentos, ela sempre morre.
Nicola precisa decidir então se persiste nas suas tentativas ou se preserva sua sanidade, uma vez que a cada alteração no passado, as pessoas ao redor são afetadas de forma diferente e, nem sempre, de uma maneira boa.
A narrativa de Mouta é intimista e opressiva. Ela consegue transmitir o desespero sentido por Nicola, e o leitor sente uma carga emocional pesada por conta disso. Por várias vezes, senti-me abatido pelo fracasso das tentativas vãs de salvar Joana. E triste por acompanhar a queda do ânimo de Nicola por não conseguir descobrir uma forma de escapar da borboleta verde.
"Minha cabeça começou a doer. O zumbido aumentou. Ia acontecer de novo, eu não queria, mas não sabia como evitar. Podia sentir mais uma lembrança chegando. Coloquei a caixinha na escrivaninha, me agachei no chão, com as mãos nos ouvidos. Então tudo começou a ficar preto..."
Não sei se concordo com a teoria de que o destino de uma pessoa está tão definido desde o início que é impossível modificá-lo. Acho que nosso futuro é a soma de nossas ações passadas, de nosso caráter, de nossas aspirações e decisões. O fato de salvar uma vida, não significa, obrigatoriamente, que ela será perdida mais à frente, porque é assim que está escrito. O futuro não está escrito. Ele se modifica a cada segundo. Se fosse diferente, de que adiantaria o livre arbítrio? Seríamos apenas fantoches na mão de uma entidade maquiavélica. Pessoalmente, recuso-me a acreditar em tal fato.
Nicola pensa da mesma forma que eu e sua recusa em aceitar o inevitável, conquista o leitor e faz com que torçamos por ele. A presença constante de Liz, e seu carinho por Nicola, deixa a dúvida se Joana realmente é a garota certa para o rapaz. Com o avanço da história, não sabia mais com quem deseja que ele ficasse.
"Eu só não entendia por que o destino quis que Joana fizesse parte da minha vida. O problema não era eu. Qual o objetivo de amar alguém que está destinado a morrer?"
O fim do livro é coerente e consegue ser bom o suficiente para o leitor se conformar e ficar satisfeito com o destino dos personagens principais. Isso não quer dizer que seu coração ficará livre daquele sentimento de que gostaria que as coisas fossem mais perfeitas, menos dolorosas. Mas a vida é assim. Nem sempre um final feliz pode ser totalmente feliz.
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