Gabs 19/11/2021
O mito por detrás da figura histórica
Eu sempre tive um questionável fascínio pela figura de Maria Antonieta. Eu não faço a mínima ideia de onde ele surgiu, eu só sei que ele sempre esteve aqui, e me fez sentir ligado à tudo referente à essa figura histórica confusa e instigante que foi a última rainha da França. Depois de 4 anos relutando se deveria ou não me arriscar numa biografia sobre ela, com medo de estragar está imagem que há anos conservo, mas também instigado à conhecer mais sobre quem foi aquela mulher, eu finalmente consegui ler esta biografia e saí com uma admiração ainda maior do que com a que eu possuía quando comecei. Apesar do símbolo opressor que ela ostentava, de rainha da França, eu queria conhecer a mulher por debaixo daquilo, e Stefan Zweig conseguiu expo-la com perfeição. É difícil explicar a admiração por uma figura que eu de fato não idealizo ou denfendo seu caráter ou o que ela representava, e por isso mesmo me atraio ainda mais por ela.
É interessante parar para analisar o quanto a própria corte de versalhes já vinha fabricando o golpe que derrubou Luís XVI e Maria Antonieta, mesmo 100 anos antes do ocorrido.
Quando criou a corte de Versalhes, Luís XIV também se viu pressionado à criar os cerimôniais para dar uma ocupação aquela nobreza francesa que não parava de se matar aos montes por estar apinhada em alguns m². Foi justamente todo este sufoco e toda esta rigidez teatral, feita para simular um mundo idílico por detrás daqueles portões dourados, que rasgou a ceda das janelas e expôs os problemas da monarquia ao mundo.
Zweig é extremamente preciso ao descrever as relações de Antonietta com aquela corte estranha à ela desde o início. A falta de um âmbito privado foi a principal responsável para moldar o caráter de M.A.. Humilhada à noite pelo seu marido, e humilhada de manhã perante a corte por não ter sucesso na consumassão de seu casamento, humilhada diariamente pela Europa por não conseguir gerar herdeiros à maior potência da época. Constantemente pressionada pela etiqueta da nobreza antiga, sentia necessidade da companhia despreocupada de jovens, onde, ainda assim, era humilhada por seus amigos jovens e sexualmente ativos, suas amigas jovens que já haviam conseguido ser mães, enquanto ela permanecia virgem involuntariamente com o distante sonho de filhos. Aí entram os vícios e os jogos para se distrair do mundo, às noites fora do leito para não fracassar novamente como esposa, as dividas em coisas caras para estar sempre chamando a atenção e sendo aprovada em algo, e isso se agravou cada vez mais.
É interessante como o biógrafo pontua o quanto a corte sufocou Antonieta, e como Versalhes não aprovava a busca dela por respiro. O Trianon nada mais é que uma bolha, um lugar para fugir de regras e etiquetas, aonde só entram pessoas jovens e felizes. E, aqueles nobres ociosos, cujas únicas funções eram orbitar a família real, se sentem extremente ofendidos pela privacidade da rainha. Sem funções no Palácio, a nobreza começa a esvaziar Versalhes e se voltar contra Maria, à difamando e tramando sua queda.
Talvez o que mais tenha me surpreendido foi o caso do colar e de como isto foi a gota d'água para a sociedade francesa. De fato, M.A. não teve culpa na trama, mas foi sua vida boêmia, nacionalmente conhecida, que tornou possível aquela série de desastres que ninguém acreditaria que não fosse golpe caso não estivessem sendo feitos no nome de Maria Antonietta.
Confesso que a parte mais surpreendente, para mim, foram os períodos de cárcere. A Maria Antonieta que eu conhecia era aquela dissimulada, despreocupada, boêmia e a personificação do que foi o rococó, a Maria completamente fútil que ainda circula no imaginário popular. Me surpreendeu bastante o quanto ela amadureceu nos anos finais, expandiu até os meus interesses sobre a figura dela. E o Zweig fala sobre uma aura encantadora que ela possuía, que fez até mesmo os carceireiros da Conciergerie quererem agrada-la, por verem que ela não era aquele monstro pintado. Me fez reflitir de como é fácil bradar ódio contra pessoas que não conhecemos, e o como isso muda quando temos a oportunidade de conviver com aquela pessoa completamente diferente do que nos foi falado. Acredito que, mesmo morta há mais de 200 anos, ela não perdeu essa aura encantadora que ela possuía, não uma aura de santa ou de pecadora, mas uma aura de uma mulher comum, com dores e sentimentos comuns à todos.
Stefan começa a livro falando sobre como a história gosta de pegar figuras medíocres e elava-las ao máximo só para despencarem do ponto mais alto. Se não fosse a Revolução Francesa, M.A. passaria pela história como só mais uma rainha entre muitas, talvez não a teríamos conhecido, talvez nem ela mesma tivesse tomado consciência de quem ela era se não fosse alçada ao olho do furacão se vendo complemente perdida e sem apoio da sua família, que tramava para ela morrer. A mulher que teve a capacidade de ser tão grande politicamente quanto sua mãe, Maria Teresa, ou quanto Catarina, A Grande, ainda assim conseguiu brilhar, mesmo sendo comum.