MiCandeloro 20/10/2014
Adrenado e reflexivo!
Sherry não se lembrava mais da sensação do sol esquentando a sua pele, ou do barulho da chuva. Fazia muito tempo que tinha tomado um banho decente e lavado os cabelos pela última vez. Três anos já haviam sem passado desde quando o mundo fora assolado por um vírus mutante da raiva, em que todos foram obrigados a se esconder em abrigos. O governo prometeu que seria passageiro, que a população seria salva, mas eles mentiram.
Agora, Sherry e sua família lutavam para sobreviver, principalmente depois que sua mãe anunciou que a comida acabara. E agora, o que fariam? Edgard, seu avô, já havia morrido há meses, mas a impossibilidade de enterrá-lo fez com que o guardassem no freezer, ao lado dos alimentos já consumidos. Sua avó, Erna, desde então, mergulhara num profundo torpor e ocupava seus dias tricotando infinitas roupas e dormindo sentada no sofá.
Os caçulas, Bobby e Mia, não tinham nada para fazer a não ser ver televisão, que se mantinha ligada graças a um sistema de gerador de energia que funcionava enquanto alguém pedalava uma bicicleta. Ao passo que os pais de Sherry discutiam, ansiando por colocar a culpa da morte iminente em alguém, transformando o pequeno abrigo num palco incessante de batalhas, gritos e choros. Sherry não aguentava mais ser a única "adulta" do recinto, tentando pôr ordem na situação, e sofria ao ver aqueles que amava definhando dia após dia. Algo precisava ser feito.
Foi assim que o pai de Sherry decidiu sair do abrigo à procura de comida, em companhia da filha, apesar da relutância da mãe, que tremia de medo de pensar em perder os dois. O combinado é que se não voltassem até a manhã do dia seguinte, a família de Sherry deveria fugir e procurar um novo lugar seguro. Assim que colocaram os pés do lado de fora pela primeira vez, depois de muito tempo, Sherry e seu pai ficaram chocados com a destruição que vislumbraram ao redor. Los Angeles nitidamente havia sido atacada por bombas, e as ruas jaziam vazias e empoeiradas. Onde estavam os sobreviventes? Será que eles eram os últimos vivos do planeta Terra?
Ao chegarem num supermercado próximo, em busca de mantimentos, foram atacados por monstros peludos, famintos e sedentos por sangue. O pai de Sherry foi capturado, enquanto a jovem foi salva por Joshua. Levada ao Refúgio para se recuperar do ataque, Sherry descobriu uma realidade até então desconhecida. A "outra vida" não existia mais. O vírus havia se espalhado e transformado as pessoas infectadas em Chorões, enquanto o restante morreu. Poucos ainda sobreviviam ou tornaram-se imunes ao vírus mutante.
Agora, Sherry precisava correr contra o tempo, resgatando sua família no abrigo e indo em busca do seu pai, torcendo para que ainda tivesse vivo em algum ninho de Chorões. Mas esses não eram os únicos desafios a ser enfrentados pela garota. Num mundo inóspito, em que manter-se vivo custa muito, Sherry terá que encontrar forças para ter esperanças de que dias melhores virão.
Querem saber o que vai acontecer? Então leiam.
***
Fazia muitoooo tempo em que A Outra vida estava na minha lista de leituras e finalmente consegui dar uma atenção a esse livro. Aproveitei que estava no clima para ler histórias sobre "zumbis" e imediatamente fui fisgada pela narrativa fofa, em primeira pessoa, de Suzanne.
Vocês podem estar se perguntando: "Mas Mirelle, como pode uma história pós-apocalíptica com monstros ter uma narrativa fofa?". Pois é, nem Laplace entendeu quando comentei. A questão é que a protagonista, Sherry, tem apenas quinze anos, e o fato de enxergarmos a história sob a perspectiva dela, uma menina doce, romântica, inocente, mas que tenta de todo modo ser durona e adulta, faz com que a gente perceba outras nuances da trama, sem que ela fique extremamente pesada ou assustadora como nos livros similares, que geralmente são.
É claro que o enredo possui pitadas de suspense, ação e terror, como qualquer história que se preste do mesmo gênero, mas ao mesmo tempo, somos convidados a embarcar em reflexões pessoais de Sherry, conhecendo-a melhor a cada capítulo e tendo acesso a pequenas lembranças de sua "outra vida", em que ela não passava de uma adolescente comum que enfrentava problemas no colégio e estava apaixonada pela primeira vez.
A escrita de Winnacker é muito simples e de fácil compreensão. Os capítulos curtos dão fluidez à história e as cenas descritivas foram muito bem elaboradas. Consegui criar na minha mente os monstros grotescos chamados de Chorões e gente, foram imagens tão repugnantes, que a cada vez que eles apareciam na obra sentia nojo.. kkkk
Adorei a forma com a qual a trama se iniciou, com a família de Sherry presa no abrigo por três anos. Foi muito legal ver por tudo o que eles passaram e a crise que se criou pela falta de comida e o medo de se sair do local para procurar mantimentos. Porém, no momento em que Sherry conheceu Joshua, meio que me desinteressei pela história. Não sei, não achei que o romance entre eles foi bem trabalhado, ficou algo meio raso e superficial. Preferia que não tivesse tido e a autora tivesse mantido o tom anterior do livro. Enfim, é questão de gosto pessoal.
O interessante é que, por mais que A Outra vida tenha se focado na caça aos Chorões e na busca pelo pai de Sherry, Suzanne nos convida a pensar nas possibilidades de enfrentarmos uma situação parecida, já que muitos vírus estão sendo constantemente manipulados nas mãos de cientistas e militares, e nem sempre com bons objetivos. Esta história nunca esteve tão atual, basta olharmos para o vírus do Ebola, que já tem assolado a África. As últimas notícias que vi são que o vírus poderia sofrer uma mutação e se espalhar pelo ar. Pelo visto, ninguém está preparado para lidar com algo do tipo, e isso me faz pensar, não deveríamos começar a nos prevenir de algum modo?
A Outra vida é composta de dois livros, pelo que pesquisei, e o segundo, chamado The Life Beyond, ainda não foi lançado no Brasil e nem sei se será. Entretanto, por mais que a autora tenha dado uma brecha para continuação, fiquei satisfeita com o desfecho, sendo assim, leiam sem medo, vocês não ficarão no vácuo eterno em que a história necessariamente precisa de uma sequência para fazer sentido.
Este não é um livro que mudará as suas vidas, mas para quem curte uma ficção que pode ser tranquilamente lida numa tarde, certamente irão gostar de A Outra vida.
Resenha originalmente postada em: http://www.recantodami.com/2014/10/resenha-a-outra-vida.html