Limonov

Limonov Emmanuel Carrère
Emmanuel Carrère




Resenhas - Limonov


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andrealog 03/02/2023

Parece o passado, mas é sobre o presente
A vida de Eduardo Limonov parece uma história de ficção, mas é verdadeira! Para quem quer entender um pouco da alma russa ao final da URSS, com os respingos até hoje no país e nas ações atuais do governo russo, esse livro é fundamental. Instigante e esclarecedor!
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Paulo Sousa 23/09/2021

Leitura 22/2021

Limonov [2011]
Orig. Limonov
Emmanuel Carrère (Paris, 1957-)
Alfaguara, Selo TAG 2017, 371p
Trad. André Telles
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?É na Ásia central, continua Eduard, que ele se sente melhor no mundo. Em cidades como Samarcanda ou Barnaul. Velhas cidades esmagadas pelo sol, empoeiradas, vagarosas, violentas. Lá, à sombra das mesquitas, sob as altas muralhas, há mendigos. Cachos inteiros de mendigos. São velhos esquálidos, calejados, desdentados, não raro cegos. Vestem uma túnica e um turbante encardidos, têm à sua frente um pedaço de veludo sobre o qual esperam que lancemos moedinhas e, quando lançamos, não dizem obrigado. Não sabemos o que foram suas vidas, sabemos que terminarão na vala comum. Não têm mais idade nem bens, supondo que um dia os tiveram, mal lhes resta um nome. Soltaram todas as amarras. São destroços. São reis? (pag. 371)
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Até ler este livro, eu nada sabia sobre Edward Veniaminovich Limonov, um ativista do comunismo fascista russo que também foi escritor, poeta e jornalista. Inclusive, até mais ou menos na página 100 achei se tratar de um personagem criado por Carrère, num romance que mistura fatos e ficção, cujo estilo foi classificado como jornalismo literário.
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Ledo engano.
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Isso porque, de fato, Limonov existiu (faleceu em 2020, aos 77 anos) e, conforme contado no livro do escritor francês, uma espécie de biografia jornalística, teve uma vida bem movimentada tanto artística quanto politicamente.
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Limonov nasceu dois anos antes do fim da Segunda Grande Guerra, numa cidade industrial distante três horas de trem de Moscou. Teve uma infância e adolescência parcialmente comuns, não fosse sua iniciação em pequenos crimes - roubo em sua maioria, e o encontro com a poesia, quando iniciou sua vida literária. Saindo da cidade Natal, Limonov esteve de 1966 a 1974 em Moscou onde passou um tempo vivendo da confecção de calças jeans, muitas delas vendidas ao intelectuais e literatos. Nesse tempo, começa sua militância política, levando-o a ser forçado a deixar a União Soviética. Limonov muda-se para Nova Iorque, nos Estados Unidos, onde vive até 1980. Sua estada na América é conturbada, Edward passa dificuldades financeiras, já que não consegue espaço no mundo literário local já que o autor sempre se apresentou como árduo defensor do regime comunista, o que não era bem visto pelas editoras americanas. Nessa época, vive com moradores de rua (no livro, Carrère descreve cruamente as experiências homossexuais entre Limonov e negros em situação de rua, que ele ia encontrando pelas ruas nova-iorquinas).
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Após a frustrante passagem pela nação à qual Limonov se referiu como ?maldita casinha desprovida de espírito ou propósito na periferia da civilização?, se muda para Paris, onde vive até 1991. Na capital parisiense sua sorte muda e logo Edward se torna um ativo frequentador dos círculos literários franceses. Com algum prestígio ganhos pelos livros que conseguira enfim publicar, todos com teor ?underground?, Limonov volta para a Rússia em 1991, quando de fato seu ativismo toma corpo. Apoia vivamente a guerra que assolou a Sérvia, colapsou a então Iugoslávia e participou diretamente numa patrulha de atiradores na Guerra da Bósnia. Todas essas atuações dissidentes acabaram chamando a atenção do governo russo, que o classificou como terrorista. Limonov acabaria preso em 2001, sendo acusado, entre outras coisas, de reunir um exército para invadir o Cazaquistão. Cumpriu pena reduzida de 4 anos, tendo vivenciado a realidade de um campo de trabalhos forçados, até ser solto. Enquanto esteve preso, Limonov escreveu oito livros, entre ensaios e poesia. Ao sair, retoma sua atividade política se filiando ao Partido Bolchevique Nacional, o qual acabaria tendo seu funcionamento proibido pelo governo russo em 2007. Teve frustrada também sua tentativa de criar um novo partido político, sucessor ao NBP, e chamado ?Outra Rússia? (este só oficialmente registrado em 2019) e acabaria se candidatando como opositor do então primeiro colocado nas pesquisas, Vladimir Putin, em 2012?
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Carrère lega um livro tempestuoso, cru, uma narrativa sem preocupações com os altos e baixos de seu ?biografado?. Ao ler, não pude deixar de notar, nas várias passagens da vida de Edward Limonov, certa semelhança com outro ativista político ferrenho, descrito nas páginas de Jorge Castañeda: ?Che Guevara: a vida em vermelho?, livro que li em 2009 e que sugiro vivamente sua leitura. Nele, Castañeda, um jornalista impecável, narra a trajetória de vida de Ernesto Guevara de la Serna, o Che, um homem intransigente, inflexível, nada parecido com o ideário construído em volta de sua imagem, a cuja postura inclemente muitas vezes usou da própria pistola para tirar a vida de companheiros de campanha em julgamentos sumários no meio da mata. Como todos sabemos, Che não se acostumou com os frutos da vitória obtida pelo campanha de Fidel Castro em Playa Girón, na ilha de Cuna onde acabou sendo nomeado ministro. Buscou contribuir em outros confrontos, primeiro na África (onde fugiu acossado pelas tropas governistas do Congo), e depois na Bolívia, a cujas selvas se embrenhou e onde, numa emboscada, acabou sendo morto.
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As duas histórias tem diversas semelhanças entre si, sobretudo no fecho, quando ambos os heróis falham em seus intentos de mudar regimes, de apoiar regimes, de se filiarem e atuarem em guerrilhas e, no final, acabam desaparecendo, ou por emboscada - como foi o destino de Che, ou por abandonar a causa, como Limonov. Assim como Che, que teve uma vida bem agitada, sempre em busca de uma nova luta, Limonov também soube fazer de sua existência um mar de problemas, e daí extrair matéria viva para seus escritos. Ambos tiveram seu momento de brilho; mas, como escrito na citação que separei e que abre este singelo review, perderam todas as amarras, são destroço.
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Apreciará este livro quem tenha prévio e bom conhecimento de política e de história, principalmente da Rússia, sendo este o motivo por eu ter demorado tanto em concluir a leitura. Nada que desabone a obra, é claro.
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Rafael 27/05/2021

O livro das contradições
Talvez o título dessa resenha fosse um bom título para esse livro. Não que a obra em si seja contraditória, mas, tanto Limonov, como a própria Rússia, são, intrinsecamente, controversos e, por isso, pode-se atribuir tal predicado(?) ao livro. Limonov é uma figura indefinível e, a despeito do autor considerá-lo um "heroi", o que para mim é um exagero, só se pode conhecê-lo e, quem sabe, entendê-lo, por meio dessa biografia às avessas. Limonov é tão único e, ao mesmo tempo, múltiplo, que ele mais se parece com uma "contradição" ambulante. E, para mim, é justamente isso que o torna tão interessante e que motiva a leitura de sua tresloucada biografia não autorizada. Inobstante, conhecer as entranhas da Rússia por conta da vida e dos feitos de Limonov é, igualmente, um convite à leitura. Isso porque, pelo menos para nós ocidentais, aquele país é, no mínimo, uma contradição em si mesmo. Você seria capaz de imaginar jovens que viveram sob um regime ditatorial socialista e que se destacavam socialmente, à época, por conta de disputas de poéticas, ou seja, ao invés de competirem musicalmente, por exemplo, sua ascensão social se dava por sua capacidade de criar poesias? Você já imaginou um país tomado por neuras e eternas conspirações à cargo da antiga KGB? Já pensou que pode existir um lugar que sustenta, ao mesmo tempo, uma ditadura "democrática"? Essas são apenas algumas das contradições da Rússia que o livro nos revela ao contar a vida de Limonov.
A despeito da visão, por vezes, enviesada do autor, a obra representa uma viagem ao desconhecido. Não só por retratar um escritor, ativista, aventureiro, preso, político, fracassado e bissexual como Limonov, mas, também, por desnudar um país em que socialismo e totalitarismo, bem como democracia e ditadura, conseguem a proeza de andar juntos ?. Enfim, seria uma contradições de nossa parte deixar de conhecer essas duas figuras tão controvertidas, por isso a leitura vale a pena.
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Gisele @li_trelando 29/08/2017

Bomnpra traçar uma linha histórica do período de transição russa.
Como personagem, considero Limonov um cara que viveu de uma forma bem particular, pra não dizer em seu mundo particular, ele criou diretrizes, leis ou um código de vida e o seguiu até o fim. A primeira parte do livro demorei pra me conectar, mas o final que narra esse período histórico mais frenético do desmonte da URSS foi muito interessante e serve pra retratar aquele período sob uma ótica diferente da que estamos acostumados dos livros de história, documentários ou mesmo notícias jornalísticas com viés ocidental.
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Drika 14/07/2017

Um retrato do século XX
Adorei o livro. Me fez lembrar de uma pergunta que um aluno me fez uma vez, enquanto eu comentava sobre a produção cultural dos tempos da Guerra Fria e sobre como ela contribuiu para difundir o sentimento anticomunista no Ocidente. Enquanto eu dava exemplos da produção hollywoodiana, filmes de 007 entre outros, o aluno me perguntou: "e na União Soviética, como é que isso funcionava?". Infelizmente, por não ser uma especialista no assunto, na ocasião eu só pude dar uma explicação vaga...
Esse livro, para além das peripécias do personagem pitoresco que o protagoniza, ofereceu várias referências mais concretas do que as que eu até então possuía sobre o cotidiano dos trabalhadores e dos intelectuais soviéticos dos anos 50 e 60, antes mesmo da crise definitiva do bloco socialista, nos anos 80. E, de quebra, ainda ilustra superbem o caos político-ideológico que substituiu a URSS nos anos 90 e que foi responsável por catapultar ao centro do palco político russo figuras de difícil compreensão fora daquele contexto, tais como Vladimir Putin e o próprio Limonov.
Enfim, pra quem curte literatura e história, o livro de Emmanuel Carrère é um prato cheio e refinado. :)
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Italo.Teixeira 14/07/2017

Esse livro prova que Limonov é tudo o que mais odiou: medíocre, insignificante e esquecível. Viveu dizendo seguir os seus ideais e objetivos, mas nunca teve ideais nem objetivos. Na busca por ser diferente, embarcava na modinha underground do momento, consequentemente, tornando-se mais um. Viveu querendo aparecer, agora vive sendo esquecido.
Sobre o autor, é quase vergonhoso pensar o que leva alguém a escrever esse livro. Talvez seja a esperança das cenas fortes venderem muito, ou simplesmente porque o autor tem algum tipo de paixão enrustida pelo seu personagem.
Ladyce 21/07/2019minha estante
Na mosca. Concordo.




Fabio Henrique 08/07/2017

Mergulho em fatos marcantes do século XX
Narrativa inteligente. Talvez cause desconforto entre os leitores que não sejam íntimos de História Contemporânea.

Prende a atenção até o fim, em grande parte devido a seu protagonista - um sujeito repleto de ideais e contradições.
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Pandora 18/09/2021

2021 foi o ano das biografias. Já perdi a conta dos livros biograficos lidos ao longo dos últimos meses, Limonov do Emmanuel Carrère foi mais um desses textos.

Ganhei Limonov de presente de um amigos Alexandre e botei ele erroneamente na pilha dos livros russos, mas o autor é francês, só o Eduardo Savenko, nome de nascença do Limonov, é russo. Perdão pela lerdeza meus livros.

Sobre a biografia, é um mergulho no mundo russo pós-Segunda Guerra mundial, Limonov se move pela União das Repúblicas Socialistas Soviéticas e nós nos movemos com ele, vai para os Estados Unidos, volta para uma URSS em colapso, luta em guerras nos Balcãs, faz coisas discutíveis na Ucrânia, escreve poemas e livros e enquanto o Emmanuel Carrère vai contando essa verdadeira Odisseia de um Russo do século XX a gente vai com ele. É uma viagem cheia de reviravoltas.

O livro é muito interessante, ampliou bastante minha visão do mundo russo na segunda métade do século XX. Nem sempre concordo com as opiniões políticas e históricas do Emmanuel Carrère e o Limonov não é um personagem que dá para amar, ele é realmente um homem de seu tempo e se a masculinidade é tóxica hoje, imagina como era 70/60/50 anos atrás.

De toda forma, esse é um excelente livro reportagem de conteúdo rico e instigante. Acompanha a trajetória de uma pessoa que nasceu filho de um oficial do exército da URSS, foi deliquente, operário, poeta, mendigo em Nova York, mordomo de bilionário, soldado nos Balcãs, político e tantas coisas mais. Um livro assim com um personagem desses é um achado, uma viagem. Muito massa, mesmo quando achamos o protagonista um mala sem alça e o biógrafo um francês privilegiado com opiniões das quais divergimos.
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Cássio F B 22/02/2022

Limonov
Eu juro que a cena na qual o protagonista enfia uma vela de cera no ânus é extremamente significativa para a sua história e representa muito bem o abandono que o personagem sente.
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Aline 24/01/2018

Ruim
O pior livro que li hoje, e o pior livro recebido pela TAG. Chatíssimo e muito cansativo.
Nani 24/01/2018minha estante
Nossa, quando li também detestei... Até que peguei na biblioteca esses dias um livro que chama Trópico de câncer do Henry Miller, aí achei pior ainda (coisa que sempre achei impossível de acontecer) kkkkkk


Bruna 25/01/2018minha estante
Já leu o Zorbas de Janeiro de 2017? Vi algumas críticas devido ao ódio presente na obra contra as mulheres. Virei assinante depois... Ainda bem


Aline 25/01/2018minha estante
Nao Bruna. Vou ler hoje.


Mayara Tavares 27/01/2018minha estante
Disparado o pior dos piores.


Aline 27/01/2018minha estante
Tbm achei.


Bruna 28/01/2018minha estante
Boa Leitura




Luiz Pereira Júnior 29/06/2017

Moderno, sim! Modernoso? Você decide...
Um excelente exemplo da melhor literatura contemporânea produzida na França (ao lado de Houellebecq). Contando linearmente uma história plausível (tente separar, por exemplo, a realidade do que é ficção neste romance), sem voos linguísticos estratosféricos, o livro consegue ser profundo sem ser monótono, sarcástico sem ser grosseiro, belo sem ser sublime.. Um resumo da história? Não, não vou encher sua paciência com isso, em qualquer site de livrarias (e aqui mesmo, por que não?) você encontrará o resumo recheado de uma montanha de elogios. Bem, pode acreditar na maior parte dessa montanha e boa leitura!
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Vanessa Ferreira 14/11/2018

Uma experiência surrealista
surrealismo.
Exatamente por isso acredito em cada palavra.
Um personagem realmente extraordinario, que não poderia de forma alguma ser inventado. Apenas a realidade é capaz de criar as circunstâncias, os sentimentos e as experiências as quais Limonov se submeteu. Apenas uma pessoa real pode carregar tantos sentimentos conflituosos e tanta vontade de viver! A imaginação humana não seria capaz de tantas contradições para criar um personagem assim, mas a vivencia humana sim, criando um caráter como o de Limonov.
Limonov era sim uma péssima pessoa, indefensável. Mas era real. Era transparente. Era decente.
Carrère tem uma escrita fabulosa, envolvente, profunda e leve. Acredito que uma biografia de alguém tão no sense não poderia ser feita de outra maneira. Adorei tudo, necessito de mais leituras como esta!
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Ladyce 22/07/2019

"Limonov", de Emmanuel Carrère, foi best-seller na França e recipiente do Prêmio Renaudot da Língua Francesa e do Prix des Prix, em 2011. Traduzido por André Telles e publicado pela Alfaguara em 2013, não fez marolas por aqui, até ser indicado por Marcelo Rubens Paiva para uma editora que publica livros por assinatura em 2017. Não é leitura fácil, em parte porque o biografado, Eduard Limonov, é uma pessoa desprezível, canalha, ordinário e sem-vergonha. Mas que descrito pelo autor parece uma pessoa fascinante. "Limonov não é um personagem de ficção. Ele existe. Eu o conheço. Ele foi delinquente na Ucrânia, ídolo do underground soviético; mendigo, depois mordomo de um bilionário em Manhattan; escritor da moda em Paris, soldado perdido nas guerras dos Balcãs e agora no imenso caos do pós comunismo na Rússia, velho chefe carismático de um partido de jovens desesperados..." Com essa introdução por Carrère é natural que se espere mais de Eduard Limonov do que o repelente marginal, personalidade secundária, um ser asqueroso, cuja vida seguimos em grande detalhe.

"Limonov" é descrito como biografia. Mas premiado como romance. Como? Por que? Em parte porque Carrère só entrevistou Eduard Limonov uma vez por duas semanas e a esta altura com o livro quase pronto. Por outro lado, porque a vida do biografado e a do biógrafo se intercalam e aos poucos descobrimos a paixão, ou até mesmo a inveja de Carrère, não pelo homem Limonov, (Carrère para de escrever o livro por mais ou menos um ano, duvidando da própria razão deste trabalho) mas pela sedução que a vida de aventuras de seu biografado parece ter acendido. Passei, então, a ver o livro não como uma biografia, mas como um interlóquio entre o escritor e Limonov.

São dois homens que pararam emocionalmente na adolescência. Basta dizer que para ambos os livros que mais marcaram suas vidas foram os de aventuras de Alexandre Dumas e obras do americano Jack London. Eduard Limonov (né Eduard Savenko) nasceu na Ucrânia (portanto cidadão de segunda classe na hierarquia soviética) e passou a vida como rebelde. Pobre, sem respeito por mãe ou pai, Limonov se rebela contra o status quo de qualquer situação. Seu verdadeiro objetivo é ser do contra. Mesmo quando o que advoga, por anos, acontece, ele rapidamente muda de posição e torna-se um insurgente, um do contra, já que o que defendia tornou-se norma. Revolta, seu nome é Limonov. E sua maneira de revoltar-se não passa de grandes gestos juvenis, sem esteio ou fundamento. Tanto que no frigir dos ovos Limonov não consegue nada, não passa de um energúmeno, machista, inepto e idiota.

Emmanuel Carrère, por outro lado, desfrutou de uma família bem estruturada: pai executivo, mãe historiadora e professora universitária. Cresceu e continuou como adulto a se beneficiar das benesses da vida burguesa parisiense. Não se revoltou contra o estabelecimento. É o verdadeiro oposto de Limonov. E, ainda que pudesse ter interesse intelectual sobre os revolucionários russos, a mim, escapa a fascinação do autor por um membro tão desnorteado da cosmografia russa. Não posso deixar de pensar numa pequena revolta contra sua própria mãe, especialista em história russa. Será que Carrère, deveria ter dedicado tanto de seu tempo e indústria construindo um altar ao anti-herói? Talvez sua mãe, se assim quisesse, pudesse nos dar valor mais acertado do verdadeiro papel de Limonov na resistência, se relevante, contra a abertura do sistema soviético do final do século XX. E ainda, a fascinação com o "revolucionário" lembra-me defensores do comunismo severo, do stalinismo ou seguidores de Trotsky, que, aqui no ocidente, dormindo em camas macias com lençóis de seda, dirigindo carros do ano, comendo e bebendo á vontade, abrigando-se em belas e espaçosas casas, continuam achando que uma revolução ou um sistema semelhante ao que se estabeleceu na antiga URSS seria a solução para as desigualdades no mundo. É uma visão idealista, sem qualquer pé na realidade e primária. E, nós mesmos, leitores de "Limonov" testemunhamos a falácia do sistema através da própria narrativa de Carrère.

Há duas grandes qualidades nesta obra. A primeira é a habilidade de Carrère de nos manter atentos ao texto, de tal modo que mesmo execrando as ações de Eduard Limonov, o que nos é contado, de maneira muitas vezes rude ou crua, nos faz continuar página após página a seguir o fanático e imbecil personagem que o autor nos impôs. A segunda qualidade é o retrato da Rússia sob o governo comunista e sob a abertura iniciada por Gorbachev e da Rússia que conhecemos hoje, a Rússia de Putin, que mais do que nunca aparece como cidadão bastante perigoso. Poucas vezes temos a oportunidade de ler uma obra que nos traz ações tão contemporâneas, referências a momentos históricos que vimos na televisão ou lemos nos jornais. Essa parte política, tenho certeza, foi de grande valia para que o livro se tornasse best seller na França. Para os franceses o que acontece em Moscou é de grande importância. Eles estão muito próximos, apesar dos diversos países que os separam: Bélgica, Alemanha, Polônia, Bielorrússia. A título de curiosidade procurei a distância entre Paris e Moscou. É um pouco mais de 2.800 km. Colocando em nossos termos é menor do que a distância entre Porto Alegre e Palmas, esta é superior a 2.900 km. Assim, tudo que acontece na Rússia é de muito maior interesse para os franceses do que para nós, aqui em outro continente separados por mar e terra imensos.

Não sei para quem devo recomendar este livro. Li. Não gostei. Mas apreciei as informações que me foram dadas. E apreciei a habilidade de Carrère. Mas de cinco estrelas, três estão de bom tamanho.
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