Babi 26/06/2015Um livro que todos deveriam lerEsse é o tipo de livro que acho que todo mundo deveria ler. Seria até bom se as escolas abordassem sua temática (e outras relacionadas) em sala de aula. Breno Melo em A Garota que tinha medo vai nos contar a história de Marina, uma adolescente que desenvolve a Síndrome do Pânico. O livro em si é quase como se fosse um diário da personagem que, após sofrer com os sintomas e ter que conviver com eles, resolve fazer um relato da sua vida. Talvez até para que pessoas como ela não se sintam sozinhas e mal compreendidas e para pessoas que nada sabem da doença possam ter mais compaixão com aqueles que a desenvolvem.
Marina começa nos contando o drama por qual todos nós passamos: a preparação para o vestibular. E como muitos jovens, além da pressão de sentir que está decidindo o resto do seu futuro, Marina ainda tinha que encarar a sufocante pressão da mãe autoritária, Dona Carmem. Durante esses dias de estudos intensivos, a vida da menina se resumia em livros, cigarros - um mecanismo de escape para o estresse - e a internet.
Foi durante seus poucos momentos na internet, no meio da madrugada, que Marina conhece Julio. De mensagens virtuais para telefonemas e posteriormente encontros no shopping, os dois começam um relacionamento sério. Mas quando finalmente a jovem passa a ser uma estudante de jornalismo da Universidade Católica e relaxa, sua mente e seu corpo acabam cobrando o preço por terem sido tão sobrecarregados. O preço acaba sendo os primeiros sintomas do Pânico.
"E esse esforço, hoje eu sei, me degastava. Fui dando o que não tinha, porque eu me preocupava demais, até que um dia arrebentei por dentro e precisei de conserto." (p. 9)
Em um dia, quando Marina estava trancada em seu quarto se preparando para encontrar Julio, de repente sentiu o coração acelerar, o pulmão clamando por ar e uma certeza de que iria morrer exatamente naquele momento. Não demorou para os gritos começarem e para sua família e Julio entrarem em desespero tentando abrir a porta trancada e entender o que estava acontecendo. Após o ataque e diante das expressões cheias de espanto e ansiedade, a garota se vê envergonhada por não ter uma explicação racional para o que passou e acaba inventando que ficou apovorada por ter visto um rato.
Depois de ter presenciado alguns ataques de pânico, Julio acaba se tornando um namorado esquivo e cheios de desculpas para não ter que falar com Marina e presenciar outros momentos vergonhosos. E nessas horas me deu muita vontade de puxar os cabelos dourados da garota e falar "Caralho, para de ser otária! Larga esse moleque!". Não que o relacionamento dos dois fosse perfeito. Antes da Síndrome aparecer, na verdade, Marina parecia buscar em Julio o carinho e atenção que não estava recebendo de sua família. Tanto, que em muitos momentos ela comenta que apenas tentava amar Julio. Mas o que me irritava era que, mesmo apenas tentando amar o garoto, ela ainda corria atrás de quem obviamente não estava dando a ela o seu devido valor.
"O que estava havendo? Meu coração batia cada vez mais rapidamente e minha respiração acelerava. Minhas mãos e pés passaram a formigar e então experimentei a pior sensação de minha vida! Meu peito agora inflava, senti dificuldade em respirar e minha visão escureceu. Acreditei que morreria e tive medo. Um medo inexplicável da morte enquanto esperava desmaiar a qualquer momento. Tinha certeza de que eu morreria assim que fechasse os olhos. Minha reação foi gritar." (p. 42)
Durante os relatos da garota que tinha medo, muitas vezes me peguei pensando que alguns poderiam ser cortados do livro que não fariam muita diferença para a história. O incrível é que sempre que pensava isso, nas próximas linhas, encontrava alguns comentários da Marina mais ou menos assim "Pode ser que eu esteja me estendendo em fatos não muito importantes, mas essas memórias são minhas e eu escrevo aqui o que eu quiser". Na milésima vez que isso aconteceu, cheguei a falar raivosa para o livro "PARA DE LER A MINHA MENTE!".
Mas continuo achando que algumas partes poderiam mesmo ter sido cortadas e ter dado lugar, por exemplo, a mais cenas com a melhor amiga de Marina - que apesar de ser melhor amiga só ganha um maior destaque no final do livro. Em contrapartida, adorei o fato da história se passar na cidade de Assumpção, no Paraguai, e dar um cenário diferente do norte-americano e do nosso sertão. Cenários estes muito retratados na literatura.
"Você não sabe nada sobre a síndrome do pânico? À parte todo o seu desconhecimento, tenha ao menos um bom coração. Esse já é metade do conhecimento de que você precisa. A bem dizer, sem amor, todo o seu conhecimento sobre a síndrome se torna inútil" (p. 224)
Também deu para perceber que o autor teve que pesquisar e adquirir muito conhecimento sobre a Síndrome do Pânico - sem falar que apresentou um grande conhecimento de línguas estrangeiras - o que só ajudou para retratar a doença de forma tão realística e tornar Marina uma personagem memóravel. Tenho esperaças que com livros assim os preconceitos em torno de doenças, síndromes, transtornos psicológicos diminuam na nossa sociedade.
Porém, também tenho que dizer que apesar de ter me apaixonado pela personagem eu não curti muito o final. A sensação que eu fiquei é que o final tenta passar uma mensagem boa e acaba passando uma errada, como se para que todo mundo possa se sentir realizado fosse preciso encontrar um namorado, um marido, um amante. Uma visão que para mim é um pouco machista, já que as mulheres sofreram lavagem cerebral durante os séculos para achar que só seriam alguém se encontrassem um par. Na minha visão de mundo, o "se sentir" realizado vem em um conjunto de fatores podendo ou não conter algum tipo de relacionamento amoroso. Mas não acredito que tenha sido a inteção do autor passar esse tipo de mensagem.
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