Zé - #lerateondepuder 20/06/2020
Androides Sonham com Ovelhas Elétricas
Androides Sonham com Ovelhas Elétricas é um daqueles livros inusitados e de leitura extremamente válida, diferente da maioria das histórias que lemos, um verdadeiro clássico que inspirou a adaptação para o cinema, com o filme Blade Runner, de Ridley Scott em 1982, este um dos melhores filmes de ficção científica de todos os tempos. Basicamente, é uma história que fala sobre a valorização da vida e de quem pode ser considerado digno de vivê-la.
O livro, um tanto quanto diferente do filme, conta a história de Rick Deckard, um policial que vive o pós-Guerra Mundial Términus, em um cenário entrópico e de terra arrasada. Como consequência de uma guerra nuclear, a Terra se transformou em um planeta inóspito, cheio de poeira nuclear. Apenas os melhores foram os escolhidos para habitar colônias exploradas em outros mundos, como em Marte. Para estes, foram desenvolvidos servos para executar todo o tipo de trabalho, androides, verdadeiros entes biológicos, mais inteligentes, mais fortes que os humanos, mas que vivem apenas quatro anos, uma vez que seus projetos ainda não conseguem renovar suas células.
Neste cenário distópico, Deckard sobrevive caçando os andros, recebendo prêmios em dólares, o que permite adquirir um animal de estimação verdadeiro, um produto extremamente caro, já que a maioria dos animais morreram com a guerra e a radiação. Entretanto, ter um bicho de estimação tem o significado de demonstrar empatia, uma qualidade muito bem reconhecida pela sociedade, uma das poucas que os androides não possam ter. Na verdade, o livro tem esse título, talvez porque o protagonista inicia a história, cuidando de sua ovelha elétrica e descontente por ela não ser um animal real. Fica implícita a dúvida se Rick é, também, um androide que caça outros de sua espécie, sem que tenha consciência disto.
A trama envolve oito androides que fugiram de Marte, depois de uma rebelião encabeçada pelo mais espertos destes, Roy Batty. Eles matam alguns humanos e emigram para a Terra. Alguns vivem o curto tempo de suas vidas, confundidos totalmente como humanos, sendo cantoras de ópera, policiais e outras profissões. Outros personagens significantes são Iran, a esposa depressiva de Deckard, o Chefe de Polícia Bryant e John Isidore, um debiloide mental, um cabeça de galinha vítima da radiação e a androide Rachel, com quem Rick tem um relacionamento no enredo que se passa em um dia apenas.
Os assuntos tratados na obra são atemporais, como preocupações com meio ambiente, animais e temas religiosos. Os aspectos filosóficos são o grande pano de fundo, deixando a reflexão do que se pode definir como humano. A questão da exclusão social é bem trabalhada, uma vez que retrata aqueles que não tiveram a oportunidade de ir para as colônias, conhecidos por especiais ou excluídos, uma espécie de gentalha de segunda categoria. Da mesma forma, a religiosidade tem um espaço reservado, na medida em que todos procuram acreditar e se fundir com um líder messiânico, que prega o compartilhamento de sentimentos, principalmente, por meio de um aparelho mais parecido com uma televisão, conhecido como caixa de empatia.
Quem o lê, entende bem a mente do seu psicodélico e autointitulado visionário, o maravilhoso Philip Kindred Dick ou Philip K. Dick, um dos maiores escritores de ficção científica americano e, por que não dizer, do mundo? Nascido nos anos 1930 nos Estados Unidos, teve uma irmã gêmea que faleceu com pouco mais de um mês. Escritor desde criança, Philip relata nesta obra a expectativa de um desastre nuclear, resultante das bombas atômicas da Segunda Guerra e da corrida armamentista nuclear, bem como dos regimes burocráticos e controladores, que buscavam desenvolver a ciência a todo custo, como forma de competição.
A crítica do autor é que há uma falta de credibilidade de todo esse desenvolvimento científico, desde a idade moderna, e se todo o processo gerou, realmente, alternativas melhores para raça humana. As obras de Dick retratam o futuro do capitalismo global, viagens interplanetárias, colonização de outros planetas e fusão entre homem e máquina. O estilo cyberpunk criado do capitalismo e da guerra fria, com colapso social, com o medo do Armagedom nuclear, das tecnologias militares e das tensões políticas que fujam ao controle, bem como o medo do domínio dos humanos pelas máquinas são temas recorrentes de suas obras.
Vale dizer que K. Dick, em certa oportunidade, teve uma inspiração, vendo um pingente de colar de uma adolescente, depois escrevendo 8000 páginas por oito anos, em um trabalho conhecido por Exegesis. Morreu com 53 anos de um AVC, tendo produzido 44 novelas, 121 contos e muitos textos dispersos, a base de ingestão de anfetaminas. Uma verdadeira sumidade, uma de suas obras mais reconhecidas foi O Homem do Castelo Alto, mas outras tornaram-se memoráveis adaptações para Hollywood, como os filmes Minority Report, O Vingador do Futuro, Screamers: Assassinos Cibernéticos e Os Agentes do Destino, dentre outros, todos baseados em novelas ou contos de Dick.
A fantástica edição que se baseou esta resenha foi uma especial da Editora Aleph, de 2017, traduzida por Ronaldo Bressane que, além de ter capa especial, páginas com gravuras, vem com valorosas anotações, reportagens e análises da vida e obra de P. K. Dick. Também há, pelo menos, mais seis edições desse título, inclusive uma digital que pode ser baixada no site http://lelivros.love/.
Veja a vídeo resenha, em: https://youtu.be/7F_939CB9sI. Acesso em: 20 jun. 2020.
Paz e Bem!
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