Stella F.. 30/08/2021
Lima Barreto e sua crítica social
Clara dos Anjos ? Lima Barreto
Clara pertence a uma família simples do subúrbio do Rio de Janeiro. Seu pai é carteiro e sua mãe dona de casa. O casal protege a filha adolescente deixando-a reclusa em casa, ajudando nas tarefas domésticas e somente saindo para comprar tecidos ou para ir ao cinema com uma vizinha de confiança. Os pais são receosos por a menina ser mulata e pobre. Apesar da pouca instrução são cientes do seu lugar no mundo.
Joaquim dos Anjos, pai de Clara, é apaixonado por música e até faz algumas composições, que Clara ajuda a passar a limpo.
Sempre aos domingos se reúne com amigos para jogar cartas no seu quintal e Clara os vê comentando sobre Cassi, um jovem que toca e que um dos amigos gosta e o outro só tem ressalvas a fazer. Mas, Clara fica curiosa.
Após um longo embate, resolvem chamá-lo para tocar no aniversário da menina.
Clara fica completamente derretida, apesar de ouvir falar de todas as atrocidades que o garoto cometeu com outra meninas e mulheres casadas. Deflorou várias que ficaram grávidas e ?faladas? e mesmo assim ela não acreditou, apesar do padrinho dela afirmar que eram fatos verdadeiros.
Apesar de toda a torcida contra, e vários obstáculos vencidos, como convencer um dos amigos do pai de Clara, Meneses, a ajudar nos encontros se utilizando da fraqueza dele para a bebida e mesmo assassinar o padrinho de Clara, Marramaque, os encontros se realizam às escondidas e não deu outra, Clara sofreu o mesmo que as meninas anteriores.
Cassi era acobertado por policiais, juízes, amigos da mãe que tinha irmão influente, e além de serem de um subúrbio ?melhor?.
?Todas essas proezas eram quase sempre seguidas de escândalo, nos jornais, nas delegacias, nas pretorias; mas ele, pela boca dos seus advogados, injuriando as suas vítimas, empregando os mais ignóbeis meios da prova de sai inocência, no ato incriminado, conseguia livrar-se do casamento forçado ou de alguns anos de correção?.
Vemos vários personagens que circulam ao redor dessa trama como um dentista não profissional, um que faz às vezes de advogado, a vizinha Margarida, guerreira que faz de tudo, o poeta duro e alcoólatra, Flores. Apesar de secundários são muitos importantes no desenrolar dela.
Vemos um Lima Barreto falando do crescimento do subúrbio beirando a Linha da Central do Brasil, denunciando a ausência do Estado na pavimentação das ruas, no saneamento básico, nos trens lotados, em ruas asfaltadas porque alguém importante mora ali, falando do preconceito de alguns instrumentos, e nos falando principalmente do preconceito racial, principalmente em relação às mulheres.
?Por esse intrincado labirinto de ruas e bibocas é que vive uma grande parte da população da cidade, a cuja existência o governo fecha os olhos, embora lhe cobre atrozes impostos?.
Ora, uma mulatinha, filha de um carteiro! O que era preciso, tanto a ela como às suas iguais, era educar o caráter, revestir-se de vontade, como possuía essa varonil Dona Margarida, para se defender de Cassis e semelhantes, e bater-se contra todos os que se opusessem, por este ou aquele modo, contra a elevação dela, social e moralmente. Nada a fazia inferior às outras, senão o conceito geral e a covardia com que elas o admitiam..?
Tão atual!
Uma história simples mas muito gostosa de ler. Recomendo.