Zeka.Sixx 04/05/2023
Um estilo único, que funciona na maior parte do tempo
Demorou, mas encontrei um tempo (convenhamos, não precisa muito, a novela tem menos de 100 páginas) para ler esse clássico da literatura nacional, escrito em 1970 (no auge da ditadura militar) e publicado em 1978.
A história é conhecida: após uma intensa noite/madrugada de amor, um casal (um homem de meia-idade e uma jornalista bem mais nova, cujos nomes não são revelados) se vê envolvido, na manhã seguinte, em uma explosiva discussão, na qual todas as suas diferenças vêm à tona.
Ele é um niilista desiludido que escolheu viver em uma bolha, isolado do mundo, em sua casa de campo. Ela, por sua vez, é politizada e critica abertamente a situação do país governado pelos militares. Quando os ataques verbais se iniciam, essas diferenças de visão de mundo, e também as diferenças geracionais, são usadas como munição pelo casal. Para mim, essa foi a parte mais interessante do livro, porque às vezes fiquei impressionado como a discussão poderia estar se passando não em 1970, mas sim no nosso maltratado Brasil atual - inclusive a manjada palavra "fascista" pipoca por algumas vezes nas falas dos personagens.
Escrito em fluxo, praticamente sem pontos finais, a novela traz diversas passagens dignas de serem sublinhadas, seja pelo lirismo, seja por serem certeiras. É notável que o autor sabe escrever como poucos. Achei, contudo, alguns diálogos um pouco forçados e inverossímeis. E, confesso, esperava mais das cenas picantes dos capítulos iniciais: achei pudicas e, em alguns momentos, um pouco cafonas. Nada, contudo, que apague os inúmeros méritos da obra.