Dudu Menezes 25/01/2023
Humor ácido sobre as histórias bíblicas
Caim é o quinto livro que leio de José Saramago. Como já havia comentado, em 2023 pretendo que este autor me acompanhe durante todo o ano e, pelo visto, não poderia ter encontrado um amigo melhor.
Este livro têm muitos elementos que me conquistam em uma leitura. A narrativa é bem humorada, carregada de crítica social (neste caso, das histórias bíblicas), sendo os diálogos profundos e permeados por um humor ácido, com o qual eu me identifico bastante.
Em 2009, quando este livro chegou às livrarias, gerou críticas por parte da Igreja Católica, causando uma certa polêmica em relação ao seu conteúdo. Na oportunidade, Saramago havia afirmado que "a Bíblia é um manual de maus costumes, um catálogo de crueldade e do pior da natureza humana".
Eu não sou ligado à nenhuma religião, mas, como muitas crianças, tive uma formação dentro da Igreja Católica, como era o desejo dos meus pais. Acredito que todas as religiões merecem respeito - TODAS! Mas, ao meu ver, não há, nesta obra, nada que um cristão, que não seja um "fanático religioso", não possa ler, refletir e aprender, por meio das provocações, aqui, suscitadas.
Eu, como jornalista, fico abismado com posições que dizem que só devemos nos informar pelas "fontes" com as quais concordamos e "ouvir apenas" aqueles que pensam como nós. Acho isso um desserviço à nossa inteligência e à democracia.
Saramago foi genial com esta obra! Os diálogos "com O Senhor", são das coisas mais incríveis que a literatura portuguesa já produziu.
Acompanhamos não só a história de Caim, filho de Adão e Eva, que mata seu irmão, Abel, após ter sua oferta ao Senhor recusada; ao contrário do irmão que foi acolhido em sua oferta.
Podemos "reler", de forma crítica, os acontecimentos na Terra de Us, no Monte Sinai, em Jericó, na Torre de Babel e nas Terras de Nod; além do sacrifício de Isaac e do massacre sobre Sodoma e Gomorra. Ao final, ainda temos o episódio da Arca de Noé, recontado de forma magistral, em um último debate entre Caim e o Senhor.
O Caim, "peregrino", que encontramos, aqui, nos leva a reflexões urgentes, sobretudo, nos dias de hoje, em que a intolerância religiosa tem andado de mãos dadas com o extremismo político!