Grazie A. 12/06/2022
Um exercício constante
Para princípio de conversa, é necessário elogiar a escrita do livro, pois é excepcional. Quando foi escrito, fazia cerca de 16 anos que o massacre havia acontecido, mas o texto é tão bem feito que parece que o luto e a tristeza de quem viveu o trauma é recente. A partir daí já começam os exercícios de empatia, resiliência e etc. Mesmo tentando se pôr no lugar de Sue Klebold como mãe -> mãe que perde um filho para o suicídio -> que descobre que antes de morrer ele matou friamente 13 pessoas, mas tinha desejo e planejamento para matar muito mais -> mãe e pessoa que precisa lidar com todas as questões sociais e burocráticas desse fato -> pessoa que, assim como qualquer outra precisa viver o luto e todas as dores do momento, a gente já falha. É inimaginável.
É muito interessante como ela seguiu a linha da pesquisa da saúde cerebral, violência e afins após conseguir enfrentar minimamente todos os problemas judiciais. Mas, independente de todas as pesquisas e situações que vivenciou, acho que ela falha um pouco (ou só deixa o coração de mãe agir) ao “tentar” explicar Dylan e o tiroteio em massa no Colégio de Ensino Médio Columbine.
Ela detalha a infância e adolescência de Dylan Klebold, identifica e lamenta não ter enxergado as ‘red flags’ do garoto, mas o resume como um seguidor passivo de Eric Harris. Há provas e testemunhas que confirmaram que Eric era sim mais agressivo que seu filho, mas ignorar que seu caçula nunca soubera lidar com derrotas e situações embaraçosas é um pouco errado, ao meu ver. Há um trecho em que ela diz que no domingo, após a festa de formatura do terceiro ano, Dylan lhe dissera que tinha tido uma das melhores noites da vida. Mostrou a ela que havia bebido só um pouquinho e pedira que ela continuasse confiando nele. Literalmente 2 dias depois, junto com o amigo, ele humilha e mata diversos estudantes e depois cometem suicídio. Pra mim, soa como sádico esse pedido de confiança, não como o comportamento de alguém que só seguia a mente criminosa de Eric, não como “alguém com o espírito de filho mais novo, que só seguia ordens sem reclamar”, em suas palavras. Em breve pesquisa após o livro, é fácil encontrar infos de que Dylan disparou mais vezes que Eric, e que foi ele também quem gritou ofensas racistas ao único afro-americano morto nessa carnificina.
Isso não significa que ela compreende os atos do filho e nem joga pro leitor a ideia de ‘se você estivesse vivendo na mesma panela de pressão que Dylan dificilmente você não faria o mesmo’. Ao contrário. Após ler o diário apreendido pela polícia, ela entende que o filho muito provavelmente tinha problemas de personalidade, sofria bullying e tinha depressão em estágio avançado ao ponto de se autoflagelar. Assume, mesmo assim, que nunca conseguirá entender as escolhas de Dylan e o fim de sua vida, e dedica o livro e sua luta a favor da saúde mental/cerebral às vítimas e seus familiares, com quem teve pouquíssimo contato, fosse por autodefesa ou por conta do limite que os advogados lhe imprimiam.
Particularmente gostaria que tivessem descrições sobre o julgamento, mas não dá para questionar o silêncio de 20 anos que a justiça impôs no caso. Se Sue lançasse (ou autorizasse alguém a lançar) um livro descrevendo depoimentos e os autos do processo, leria tranquilamente.