spoiler visualizarAlessandro232 12/04/2013
O lado sinistro de Hollywood
"Bizarro". Assim, pode ser definido "O Desfiladeiro do Medo", de Clive Barker. Na verdade, o título traduzido força um pouco sua inclusão no gênero horror/ terror. No original, o livro se chama em uma tradução aproximada "O Desfiladeiro de Coração de Gelo", e só mesmo lendo para saber. Inicialmente, o livro é uma sátira que faz severas críticas aos bastidos de Hollywood, onde os atores são vistos como produtos com prazo de validade. O protagonista é um astro em decadência chamado Todd Prikket, provavelmente,inspirado no galã Tom Cruise. Com medo dos concorrentes mais jovens, inseguro de seu talento dramático e,pior, demonstrando visíveis sinas de envelhecimento, Prikket aconselhado por sua agente e um produtor de cinema se submete a uma cirurgia plástica. O problema é que o procedimento cirúrgico não dá certo e ele é obrigado a sumir por algum tempo. Não resta outra alternativa para Prikket senão passar um tempo em Coldheart Canyon (o título original do livro), uma velha mansão com um misterioso passado. É com a entrada em cena da principal e mais interessante personagem, a vamp Katya Luppi que os elementos de terror e horror são inseridos na trama, isso depois de cem páginas. O problema é o tratamento dado a Barker a esses elementos. Quem conhece o autor já sabe mais ou menos o que vai encontrar. Barker que também é artista plástico (não dos melhores) trabalha a estética do horror de forma gráfica, ou seja, o horror na concepção dele é, acima de tudo, puramente estético. No livro o horror se manifesta, principalmente, na descrição em detalhes de criaturas híbridas,que parecem ter saído de uma tela Francis Bacon. Na exploração do terror, Barker também se revela limitado. Ele não consegue criar uma boa atmosfera de terror no que se refere ao principal cenário de seu romance: a propriedade de Coldheart Canyon. Além disso, Barker somente repete antigos clichês da literatura gótica: a vilã é má até os ossos, a mocinha é boa de coração e faz de tudo para salvar o herói meio babaca e o lugar é povoado por fantasmas e monstruosas criaturas. Contudo, essas limitações poderiam até passar batido se não fosse a escrita chula de Barker,cheia de palavrões, que dá ênfase a descrição de longas e desnecessárias cenas de orgias sexuais que nada acrescentam a história. Em determinados momentos, o leitor terá a impressão que o sobrenatural é apenas um pretexto para que o autor destaque um erotismo vulgar beirando a pornografia, que procura reproduzir as velhas estripulias que revelam o lado safado de Hollywood. É o conteúdo picante,mas sem nenhuma sutileza, o que torna seu livro bastante irregular. Além disso, do meio para o final "O Desfiladeiro do Medo" envereda para o terreno da fantasia, embora não abandone o horror bizarro, o que também pode desagradar alguns leitores. Neste trecho, que foca uma subtramas do livro, envolvendo um artefato maligno, "O Desfiladeiro do Medo" se assemelha um roteiro de filme B de Horror, tão inverossímil e bizarro como outras produções baratas estreladas no passado por Katya Luppi. Apesar de alguns momentos serem engraçados, o que predomina na escrita de Barker é a bizarrice e tudo vai ficando cada vez mais absurdo e estranho. Por fim, também atrapalha a longa extensão do romance (700 páginas), sendo que pelo menos cem delas poderiam ter sido cortadas, sem prejuízo para o desenvolvimento de sua narrativa. Apesar de seus defeitos, que não são poucos, "O Desfiladeiro do Medo" em alguns momentos diverte e demonstra a criatividade de um autor "cult" que não é para todos os gostos. É um livro que transita em vários gêneros (sátira, horror/terror, pornografia, fantasia), sem se aprofundar em nenhum deles. Apesar de não aborrecer, nota-se que Barker tinha um ponto de partida muito interessante e perdeu a oportunidade de criar uma obra significativa sobre os horrores e terrores que assolam os astros e estrelas de Hollywood, cujos fantasmas e demônios são muito mais assustadores que aqueles encenados por Katy Luppi e sua excêntrica trupe. É uma pena.