Sr.Matsui 03/03/2010Esse livro vai quebrar o seu coração"A Estrada" é de uma beleza selvagem, impressionante e desencantadora.
A história se passa no inferno de um eterno inverno pós-apocalipse. McCarthy fala sobre um homem sem nome e seu jovem filho, vagando através de um mundo enlouquecido, desolado, frio e escuro; um lugar onde neva cinzas. Eles se arrastam para o sul, na direção do mar, procurando um lugar, qualquer lugar, por vida e calor.
Nada mais cresce nesse mundo destruído. As pessoas se tornaram canibais na luta pela sobrevivência. Nós, os leitores, não sabemos se estamos acompanhando a ressaca de uma guerra nuclear ou algum evento de extinção em massa (como um asteróide ou um cometa). O autor deliberadamente não nos conta, e ao longo da narrativa percebemos que isso não tem a menor importância: seja uma obra do homem ou uma vingança da natureza, o mundo está simplesmente morto.
A mãe do garoto é uma suicida. Incapaz de enfrentar um mundo onde tudo ficou cinza e morto, "mantenha-se vivo o suficiente e logo você será violentada ou assassinada - como todo o resto". É o que ela diz antes de se matar.
O homem e seu filho são "cada um o mundo inteiro do outro". Eles têm apenas um ao outro, eles vivem um para o outro e o intenso amor um pelo outro os ajudará a sobreviver.
Pelo menos por enquanto.
Mas sobrevivência neste mundo morto é uma perspectiva duvidosa, na visão mais otimista. O garoto e o homem são obrigados a presenciar coisa que ninguém jamais deveria ver. Todo dia é uma caçada no lixo por alimento, abrigo e segurança contra "os caras maus" - as gangues errantes que escravizam os mais fracos e usam canibalismo na ausência de outro alimento.
Nós somos os "caras bons", o homem constantemente lembra o menino.
Porém nas raras ocasiões quando encontram outros seres humanos, o homem regride para seus instintos de sobrevivência mais primitivos, se recusando a ajudar uma criança supostamente perdida e um homem faminto; vivendo apenas para ele mesmo e para o menino - que tenta desesperadamente se agarrar ao que ainda resta de humano dentro de si.
São nesses encontros casuais com outras pessoas, mais do que a interação um com o outro, que nós os vemos como realmente são. O garoto é uma criança radiante e doce, preocupada, altruísta, que quer e precisa encontrar outras pessoas, mesmo nesse mundo devastado - que é o único que ela conhece. O pai, por outro lado, é mais cuidadoso, amargo. Deixou a devastação o abraçar, até tudo o que importa é cuidar da criança e dele mesmo. E para o inferno com o resto das pessoas.
A jornada deles em direção ao sul é um pesadelo sem fim para as profundezas do inferno, e a única coisa que os mantém vivos é o amor um pelo outro. Quando um está quase para desistir, o outro se recusa a permitir isso. "Eu não vou deixar você entrar na escuridão sozinho", o homem garante ao seu filho. Mas no final, como o garoto vem a descobrir, cada um está por si, e tudo o que você pode fazer é continuar em frente.
McCarthy prova novamente que é um mestre do minimalismo. Com um estilo tão seco e desolado quanto o mundo onde os personagens são obrigados a andar, cada sentença é polida como uma pedra preciosa, e ele nos leva para a realidade de um mundo morto. O passado não existe mais, o horizonte morto os cerca em qualquer lugar, e o presente é a única realidade.
Não existe mais tarde, conforme McCarthy nos conta. Dentro do homem não existe nenhuma esperança de que mais à frente na estrada exista coisa melhor. Mas ele continua a manter ambos motivados continuamente, apenas para manter seu filho vivo. E nós tentamos nos manter motivados junto com eles, torcendo para depois da próxima curva, ou a 5 quilômetros adiante, talvez tenha alguma coisa, qualquer coisa, para tornar esse tormento da sobrevivência valer a pena.
Viver é o inferno, para quê alguém iria querer sobreviver? A mãe tomou sua decisão. Ela foi embora a muito tempo. Chegamos no final desse livro completamente secos, cansados, devastados, mas curiosamente mais leves. Porque enquanto existir o amor, segundo McCarthy, talvez exista algo para qual valha a pena viver; e como o livro nos mostra no final, talvez exista até mesmo um pouco de esperança.