Karamaru 27/04/2021
MARCAS PERMANENTES
Escavar o passado pode revelar segredos perturbadores. Em “Um amor incômodo”, romance de estreia da aclamada Elena Ferrante, a narradora empreende um mergulho em águas pretéritas e sombrias, à procura de respostas para um enigma do presente e de certa reconciliação consigo mesma.
Já de início, Delia se vê presa num labiríntico suspense após a morte de Amalia, sua mãe, cujo cadáver fora encontrado numa praia. A partir desse misterioso fato, ela procurará descobrir o que de fato ocorreu à progenitora. Para isso, percorrerá as desoladas ruas de Nápoles, encontrando-se com figuras inquietantes ligadas às duas.
A narrativa, nem um pouco confortável, possui forte traço psicológico. Delia vê-se envolta por interrogações e procura, ao longo da narrativa, trazer para si “todas as verdades guardadas pelas mentiras”, e não poupará nem mesmo um trauma de sua infância cujos reflexos nunca deixaram de incidir sobre ela, atrapalhando, inclusive, a sua vida sexual.
À semelhança de um jogo de espelhos, Delia e Amalia se confundirão por diversos momentos, e, é possível que se faça uma leitura junguiana da obra, a partir da perspectiva do Complexo de Electra, com as devidas ressalvas. É bom pontuar, porém, que o livro adota única e exclusivamente o ponto de vista da narradora.
“Um amor incômodo” representa uma ótima estreia de Elena Ferrante. Nesse livro, já se notam marcas próprias do estilo da autora, como a linguagem crua e objetiva e as implicações de relações conflituosas entre mãe e filhas. De fato, uma narrativa intensa e incômoda, como o próprio título sinaliza.
Leitura e microrresenha feitas em parceria com Carlos (IG: @o_alfarrabista).