Natália Tomazeli 08/02/2019Levei comigo"O que você sente é o que você sente, e, por mais que pense que devia sentir outras coisas, não pode mudar seus sentimentos. Tem coisas na vida que podemos mudar, outras não."
São tantas emoções que envolvem a leitura desse livro, que é difícil saber por onde começar. Mas na verdade, eu nunca tinha ouvido falar nele, até embarcar em uma leitura coletiva onde conheci de fato essa história. Faz muito pouco tempo que comecei a adquirir e ler os livros editados pela Darkside Books, então sempre via a editora de outra forma, como uma editora de terror e suspense. Justamente por isso, nunca tinha me dado conta dessa preciosidade em forma de livro. Mas o catálogo deles é super diverso, então tem muita coisa além do rótulo que a editora possa de um modo ou de outro, carregar. Fui para essa leitura meio que com a mente limpa, sem saber muito bem o que esperar (ou melhor, sem expectativa nenhuma) e saí dela com a alma lavada!
Aqui temos um tipo de livro que é difícil não gostar. Além de sua originalidade e relevância, o tipo de abordagem e narrativa completam a experiência de leitura de uma maneira que fazia tempo que eu não lia. No geral, os livros hoje se desenvolvem e/ou acabam com quase sempre o mesmo desfecho, que é aquela coisa dramática super triste que sempre tem alguma desgraceira acontecendo ou alguém morrendo, aquela coisa trágica. Aqui é diferente. Não que não aconteçam coisas tristes ou angustiantes, acontece. Mas o jeito que a autora vai desenvolvendo a trama, vai aquecendo o coração. Ela quer fisgar o leitor emocionalmente dessa maneira, além de ter o dom em abordar assuntos pesados como a morte, o luto, a perda, o caos familiar, a saudade e vícios de uma maneira suave e delicada, ao mesmo tempo que pertinente e firme. Ela não perde o fio da meada com tramas que pouco importam para o enredo ou deixando para trás pontas soltas. Você sente que ela sabe o que tá fazendo e onde quer chegar com a história, o que é incrível. Vou confessar que eu tava precisando de um livro assim, para variar um pouco, então essa leitura caiu como uma luva, bem no momento necessário. Além disso, a ambientação é perfeita, com esse formato "Road Trip" que dá toda a vida para o livro. Se você for curiosa que nem eu, com certeza vai querer sair por aí procurando fotos e informações extras sobre todos os lugares que os personagens vão passando ao longo da viagem. Na verdade, eu não sabia que os EUA poderiam ter paisagens e destinos de viagem tão bonitos! A gente que é brasileiro fica muito bitolado com os destinos mais triviais e esquece um pouco da rica natureza que esse país possui.
E tem os personagens... Ah, os personagens! Que completos e complexos são eles! Não existe um mocinho ou um vilão nesse livro, todos eles tem suas qualidades e seus defeitos.
"Todo mundo é bom e mau ao mesmo tempo. A única variação real é no equilíbrio, Quanto de bom e quanto de ruim. Quando uma pessoa tem o lado bom maior, dizemos que ela é boa. Mas isso nunca é absoluto."
Acho que minha parte preferida foi a maneira como a autora abordou o tema "alcoolismo", eu particularmente nunca tinha visto essa temática em outros livros dessa maneira, abordando o vício como algo conveniente a ser tratado, algo que prejudica de várias maneiras a vida de todo mundo que está na volta da pessoa viciada e ela mesma. Na maioria das vezes, é abordado nos outros livros (e filmes, séries, etc) de uma maneira até bem superficial, com o personagem viciado visto como um "reles bebum fracassado que perdeu tudo na vida", o que é na verdade um perfil bem estereotipado de viciado em álcool e que não reflete nos diversos recortes de perfis de alcoólatras que existem no mundo. Aqui, a autora foge bonito disso, mostrando para a gente diversas faces do vício e diversos modos de como ele influencia na vida do viciado e isso é de uma originalidade deslumbrante!
"E quantas vezes fazemos a mesma coisa todos os dias? Assumimos todos esses riscos calculados. O tempo todo. Novecentos e noventa e nove vezes de mil, nada de errado acontece. E de repente acontece. Uma vez. E culpamos a pessoa que assumiu o risco, dizemos que ela devia ter pensado melhor, que não devia ter feito aquilo. Não estou dizendo que é errado, mas sabemos que também assumimos riscos. Talvez culpemos tanto as outras pessoas porque queremos fingir que nunca teria acontecido conosco. Mas poderia acontecer, é claro. Tomamos decisões de vida e morte todos os dias."
Pra finalizar, minha dica para enriquecer essa experiência de leitura, caso você decida ler este livro é a pesquisa. Pesquisem sobre os lugares da Road Trip e sobre os termos de montanhismo que os personagens usam no livro, porque pode acreditar, isso torna a leitura muito mais viva! Depois que eu descobri o que era "Free Solo", fiquei desesperadíssima e abismada (tá dum tissss!) igual ao August ficou no livro quando descobriu também huehuehueh
"Se pudéssemos analisar as estatísticas, aposto que descobriríamos que muito mais gente morre na estrada a caminho de Joshua Tree do que lá, escalando pedras de dez ou doze metros de altura."