Aline Marques 24/04/2019Estranho mesmo é o preconceito! [IG @ousejalivros]Temple Grandin era uma criança atípica.
Enquanto os demais buscavam o conforto do colo de seus cuidadores e formavam as primeiras palavras, Temple balbuciava sons inteligíveis e se distanciava das pessoas, voltando sua atenção para tudo o que fosse capaz de controlar ou para si mesma.
Diagnosticada com autismo e sentenciada por seu médico a uma vida de reclusão e deterioração, contou com o amor e determinação de sua mãe para transpor os obstáculos criados pela falta de informação e de empatia, além dos relacionados a sua condição neurológica, aprendendo a reconhecer e aceitar sua humanidade, mesmo quando as normas de conduta e convívio insistiam em rotulá-la como inadequada.
Escrito há mais de três décadas, a autobiografia conta com termos e conceitos desatualizados que podem prejudicar o entendimento do leitor quanto a definição do diagnóstico e a urgência da aplicação de intervenções terapêuticas capazes de proporcionar qualidade de vida para aqueles que fazem parte do Espectro Autista.
Também existe uma certa obsessão em afirmar a importância do apoio e do afeto, como se o investimento financeiro não fosse igualmente determinante para o desenvolvimento da criança e do adolescente autista, e da manutenção dos ganhos do adulto que pode nunca se tornar autônomo, independentemente de seus esforços individuais e dos de seus familiares.
A Sra. Grandin, em uma das cartas para o psiquiatra de sua filha, expressa sua preocupação quanto a evolução de Temple e afirma que "se houver algum meio, vamos usá-lo ? e não economizaremos nada e nem nos iludiremos. [...] Ela merece a melhor ajuda que pudermos dar a ela". Por isso a não romantização da "recuperação" de Temple é tão importante quanto sua história é inspiradora.
Uma leitura crítica é indispensável para aproveitamento desta obra curta e complexa sobre uma mulher que lutou para conquistar o seu lugar no mundo, enquanto os homens e os padrões excludentes tentaram garantir o contrário.
Recomendo também o filme homônimo protagonizado brilhantemente por Claire Danes e produzido pela HBO, os outros livros escritos pela Ph.D. Professora Temple Grandin e suas palestras on-line.