Livrissimu 13/02/2020
O Pássaro que Morreu em Mim
‘’QUANDO UM BEBÊ NASCE UMA FLOR BROTA NO PEITO E SAI PELO LEITE DA MÃE. É ASSIM QUE OS BEBÊS CRESCEM SE ALIMENTANDO DESSA FLOR INVISÍVEL, ALGUMAS PESSOAS CHAMAM ELA DE AMOR.’’
O peso desse pássaro, que cabe morto na palma da mão, pesa em mim como se eu mesmo o segurasse e como se, ao invés dos pequeninos órgãos mortos do canário, fossem na verdade pequenas âncoras cheias de um peso condensado dentro de seu corpinho mole.
Pois essa leitura foi brutal, eu não tinha sido avisado do quão doloroso poderia ser esse livro. Surpreso, pois não imaginava que a obra de estreia de @alinebei pudesse ser tão emocionalmente madura e ja tão própria em si, estilisticamente elaborando sua prosa simples e certeira na estrutura poética dos versos, o que permite brincadeiras com os aspectos gráficos do texto e uma cadência que, por vezes, multiplica a emoção de certas palavras.
Temos, então, um romance de formação que se atém aos principais eventos da vida de uma mulher no período dos 8 e 52 anos, através de ‘’pulos’’ no cronologia da história. A cada pulo avante, um tombo a espera. Cada evento é um abismo que chama outro abismo e as perdas acumulam-se umas sobre as outras. Mas não ficamos presos a essas quedas, e sim às tentativas cotidianas, às vezes penosas e malsucedidas, da personagem de levantar-se e escalar-se de volta à superfície da vida.
Com uma prosa toda melancólica, sentimos as marcas dos traumas que ainda gritam e permeiam todos os relacionamentos da vida da personagem, como as pessoas que foram embora e aquelas que abandonou inconscientemente. sobre todos os telefonemas ignorados e não feitos. sobre as transferências de culpa e fardos, que por não aguentar sozinha, jogou sobre o ''vizinho'' sem pedir permissão. sobre os abusos que penetram a inocência. sobre a morte que espreita na esquina e que, apesar de universal, parece ter uma rixa individual com a protagonista.
A narrativa da Autora é delicada como a Mão de quem vacina-nos e nem sentimos a agulhada que entrou, mas que depois de algumas horas dói cada vez mais o braço picado. Aline aprendeu a destilar sentido de colocações simples, elevando-as à contemplações que permanecem.
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