Flávia M 31/03/2016
"Tenho medo. E não posso pedir socorro a ninguém."
Essa é a primeira obra que li de Simone De Beauvoir e fiquei desconcertada com a sensibilidade imensa que ela possui para descrever, com suas palavras e diante de seu ponto de vista (os acontecimentos sempre se passam em Paris e sempre com personagens que possuem uma boa situação financeira), a situação da mulher dentro das relações cotidianas.
Diria que a ordem dos contos se dá pelas suas respectivas forças, o primeiro conto é bem mais leve de se ler que o segundo e o segundo infinitamente mais leve que o terceiro. A questão do tempo está presente em todos.
Gostaria de falar mais sobre os dois primeiros contos, mas "A mulher desiludida" me desconcertou de uma forma que fica até difícil lembrar com precisão dos primeiros. Nessa novela, por meio de cartas, podemos acompanhar o dia-a-dia de uma mulher que vê seu casamento e em consequência disso, sua vida, se definhar sem poder fazer absolutamente nada para se defender. É injusto e revoltante e a culpa de tudo sempre é sua, sempre é ela que está sendo exageradamente cuidadosa ou não, sempre é ela que está oprimindo seu marido, sempre é ela que está diante de todas as acusações, sempre é ela que tem que ser exageradamente compreensiva. E mesmo depois de descobrir que vivia em mais de oito anos uma mentira, é ela que está sendo mesquinha e egoísta. É ela que não compreende a "psicologia masculina". O que estaria, verdadeiramente, por trás desse pensamento? É toda uma engrenagem que a faz viver naquela redoma, se dedicar inteiramente e só aos filhos, ao marido e quando perde tudo aquilo pelo que seu esforço de vida foi voltado, se vê vazia e perde-se de si mesma. E ela se vê sozinha. Afinal, quem iria compreender uma mulher que "se deixou levar" tão facilmente pela tristeza, que não faz nada para se cuidar? É repugnante aos olhos dos outros uma mulher em sua idade que não se cuida.
A gente vê essa situação ao nosso redor o tempo todo, em menor ou maior grau, mas a culpa sempre é daquela pessoa que não faz nada para sair daquela relação abusiva, que se corrói diante dela. Em suma, o que está por trás das palavras aqui é muito mais importante do que é dito, o que leva Monique a ter aqueles pensamentos diante de si mesma e a culpa que carrega nas costas por toda a situação é algo que ainda vai ficar por um tempo na minha cabeça.