Erika.Dias 01/02/2019
Durante meus dez anos de leitora assídua, transitei por diversos gêneros literários, autores, títulos e temas. Cada leitura concluída, é uma experiência nova vivida. Sempre um turbilhão de sensações novas, como se as angustias de cada personagem fossem minhas também. Dentre essas experiências literárias, uma das melhores da minha vida: O Deserto dos tártaros, de Dino Buzzati.
Giovanni Drogo , personagem principal, recém formado na academia militar, está prestes a dar inicio à sua carreira como tenente. A caminho do forte Bastiane, o qual fora designado para servir, Drogo já é tomado pelo sentimento de insegurança, já que estava saindo do conforto da casa de sua mãe, para um futuro incerto. Já na primeira noite, sente intensamente a solidão que paira pelo forte, e não demora para se dar conta da ilusão de uma suposta ameaça por parte dos tártaros que nunca chegam. A princípio, ele ficaria só por alguns meses, pela desculpa que deu para si mesmo de ser bom para sua carreira. Mas os anos foram passando, e Drogo permaneceu à espera de uma invasão que, no fundo, sabia que não aconteceria, embora se agarresse nesta ideia como uma forma de sobrevivência.
Durante a leitura fui tomada, por vezes, por uma ansiedade que me fazia devorar o livro, em outras, a ansiedade dava lugar ao ócio, pela trama parecer monótona em alguns momentos. E talvez seja essa a armadilha que Dino Buzzati preparou para os leitores, porque senti em pleno a angustiante espera, a do personagem e, consequentemente, a minha própria. Foi então que percebi que o personagem principal não é Giovanni Drogo, mas sim o tempo. Parafraseando Caio Fernando Abreu, o tempo existe e devora, o tempo devorou Drogo, como devora a todos nós. E o mais incrível da obra é que a história é também a de tanta gente. Quantas vezes permanecemos em lugares ou situações por comodismo? Seja no trabalho ou em relações, permanecemos a espera de algo que não chega, e o tempo vai passando, até que ficamos para trás. Este livro me fez abraça- lo ao final da leitura, enquanto olhava para o teto escutando Oração ao tempo, de Caetano Veloso. "E quando eu tiver saído para fora do teu círculo, tempo, tempo, tempo, tempo, não serei nem terás sido, tempo, tempo, tempo tempo..."