spoiler visualizarmendesvictoraug 30/11/2014
Arquipélago Gulag (Resenha Victor Mendes)
O Arquipélago Gulag por Alexander Soljenitsin é uma obra que reúne uma grande compilação de memórias e relatos de diversas vítimas do sistema carcerário soviético caracterizado pela crueldade e objetividade totalitarista do regime liderado por Stálin, onde foi intensificado. Em parte também um relato pessoal das experiências vividas pelo autor que também foi preso e condenado.
A obra é divida em partes que exploram as diferentes perspectivas do sistema, do momento da detenção até os precários transportes rumo aos campos de trabalho. O prefácio do pesadelo, ministrado pela GPU (polícia secreta da União Soviética), as detenções eram caracterizadas pelo amplo poder de repressão social dado no âmbito psicológico. Os alvos, muitas vezes pessoas pouco familiarizadas com o meio intelectual e político não apresentavam resistência, e ironicamente acreditavam que aquele que abraçou o sistema do terror seria o seu salvador. A forma pela qual as detenções eram aplicadas era minuciosamente inteligente, a sua natureza amorfa e não específica contribuía com a falta de ação e o medo, não só na situação específica de cada preso, mas na reverberação causada no meio social por elas, o que harmoniza com as características do regime quasi totalitário no controle de todos os aspectos sociais; nada poderia ser dito ou feito se não fosse de acordo com o regime, toda e qualquer divergência de ação ou pensamento seria reprimida, até mesmo aqueles que não tinham filiação política estavam incluídos.
No âmbito das detenções, muitas acusações recaiam sobre a oposição, e assim desfaziam-se órgãos políticos e sociais por estarem supostamente conspirando e agindo contra o Estado. Desvaneciam por entre as ondas de detenções, as canalizações; desapareciam, todos estes supostos conspiradores e causadores dos problemas do Estado. Neste ritmo, pois, só um partido, só uma forma de pensar prevaleceria. Uma limpa social também se instalara, são detidos todos aqueles da antiga posição social, os “nobres”, religiosos, graduados, “a culpa era sempre destes!”, por conseguinte intensificou-se a luta de classes.
O apoio jurídico de muitas detenções se encontrava no artigo 58 do capítulo especial do Código Penal de 1926, de interpretação ampla e estrutura homogeneizadora com relação aos delinquentes políticos e criminosos comuns.
As detenções não só se davam necessariamente por questões políticas, mas também aconteciam por critério de sangue, origem ou contato estrangeiro, como com os alemães, tártaros, tchetchenos, russos que haviam tido algum tipo de relação com estrangeiros. Até mesmos militares que se encontravam atrás das linhas inimigas em certo ponto na guerra viriam a ser interrogados, e muitos deles presos ou fuzilados.
A parcela “não afetada” da população vivia uma utopia movida pelas engrenagens do país dos Gulags, um sistema alimentado majoritariamente por presos coagidos a legitimar e fabricar as próprias acusações, até o ponto em que em 1938 as torturas usadas para tal ganham um caráter formal apesar de discreto. Efetivamente, as torturas começam a partir do momento que se é detido, há uma ampla gama de técnicas para gradualmente enfraquecer e subjugar o preso até que este finalmente “confesse” seus “crimes e conspirações”.
Soljenitsin analisa também os instrutores como indivíduos; suas posições privilegiadas no sistema os colocavam acima até mesmo de militares de alta patente, pois até estes estariam sujeitos à instrução, e eles como aplicadores “são” a representação dos próprios “órgãos” que moviam os Gulags, descreviam assim uma posição política notável já que detinham tal poder de instruir, o que os colocaram em uma posição em que ninguém se atreveria a verificar o que fazem, mas qualquer um estaria sujeito a sua verificação. Homens que viviam para os órgãos, mas que gozavam de vantagens únicas dentro do sistema.
A vida nas celas, onde eram desprovidos de comunicação com o mundo externo ansiosamente recebiam os novatos pedindo notícias do que acontecia fora do país dos Gulags. Ao chegar, a humanidade partilhada entre os presos era proeminente já que todos compartilharam as mesmas experiências de horror até chegarem ali. Cada preso vivia e seu “mundo de acontecimentos” em meio à árdua rotina de trabalho, interrogações e alimentação precária. Além dos aprisionamentos e do isolamento nos Gulags havia os fuzilamentos, que primeiramente ocorriam à margem do aparelho judiciário logo após a revolução, denominados pelo termo “justiça extrajudicial”, e logo se propagaram como uma epidemia, substituindo também as deportações que ganharam uma posição secundária no plano das condenações.
A adoção do fuzilamento como pena máxima apresenta um desenvolvimento de muita oscilação, chegando a até ser atenuada tendo sua capacidade de condenação estreitada, em 1927, mas logo foi restituída em sua plenitude sob o pretexto de “ser uma importantíssima lei para o socialismo em marcha”, em 1932, o que podemos considerar uma medida extremista que foi também usada em propaganda para descarregar ainda mais os problemas da nação nos “traidores” condenados.
Socialmente, fruto das propagandas do regime, os fuzilamentos ganharam um certo status de “medida de segurança”, oposto ao de castigo, mas até mesmo para os ouvidos stalianianos, os fuzilamentos desdobravam o limite da segurança, pois apesar das dificuldades para extração de qualquer número as estimativas apontam para uma quantidade surreal de afetados.
Os Gulags afetaram profundamente toda a história da URSS, onde a prosperidade de poucos foi erguida à custa da miséria e decadência de muitos. A obra de Soljenitsin, nas circunstâncias de sua criação é talvez a compilação de fatos e ocorrências mais ampla em seu sujeito da qual a humanidade terá acesso apesar de ele mesmo deixa claro muitas vezes que sua obra é ínfima se comparada com a dimensão da totalidade dos eventos relacionado aos órgãos, às prisões, e a historia da administração geral do campo.