Henrique Fendrich 10/09/2019
Vinicius, para os que ainda vão se amar
Vinicius de Moraes é um homem que nada sabe senão amar a mulher. E durante toda a vida não fez outra que não cantar a ela, a Bem-Amada. Nem sempre a mesma, afinal, é um milagre encontrar, nesse infinito labirinto de desenganos amorosos, o ser verdadeiramente amado. Fez isso em versos, fez isso em música, mas também em prosa. “Para viver um grande amor” (Companhia das Letras) representa a primeira incursão do poetinha nas águas bem conhecidas do seu amigo Rubem Braga. É verdade que não se trata de um livro exclusivamente de crônicas – seus textos no gênero são intercalados pelos seus poemas, onde, é claro, ele se sai melhor.
Mas a crônica, esse gênero tão brasileiro, tão carioca, também exercia seu poder de sedução sobre o poeta. O texto de abertura do livro é, inclusive, uma análise descompromissada sobre o exercício da crônica, que se firmava entre o público “como o cafezinho quente seguido de um bom cigarro, que tanto prazer dão depois que se come”. Naquela época, começo dos anos 60, o gênero já tinha mais ou menos os contornos que o velho Braga, sem querer, definiu. Isso incluía o lirismo, pra não dizer a pura prosa poética, coisa que o aproxima do nosso poetinha.
A crônica-título é o melhor exemplo de como Vinicius incorporava à crônica a sua capacidade de criação poética: é toda composta por frases ritmadas, cadenciadas por rimas internas. Otto Lara Resende foi bastante preciso ao dizer que, neste livro, o cronista dá notícias do universo do poeta. Porque Vinicius sabia que a mesma poesia que foi para ele como uma mulher cruel, em cujos braços se abandonou sem remissão, também podia salvar o mundo de amanhã. E por isso era preciso escrever, poemas e crônicas para todos aqueles que ainda vão se amar.
Ali estão relacionamentos, reminiscências, amigos, ali está o tempo, a velhice, os ventos, as comidas, a lua, Montevidéu – ali estão as impressões de um cronista sob o seu olhar de poeta. E essas belezas farão mais sentido a quem souber achar a bem-amada com quem dividi-las.
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