luiza 06/02/2024
Nem os deuses são perfeitos
Mesmo depois da minha decepção com A Canção de Aquiles, decidi dar outra chance para Madeline Miller com Circe, e não me arrependo nem um pouco. Ela tem uma grande habilidade para escrever personagens imperfeitos, com pensamentos e escolhas que muitas vezes nos deixam incomodados ou irritados, mas sempre curiosos com o que está por vir.
Circe é uma deusa, imortal e poderosa, e mesmo assim não está isenta dos defeitos e desesperos mais humanos. Ela passa seus séculos e milênios procurando, talvez sem perceber, uma forma de dar fim a carência que carrega. Ao longo da história ela passa de uma menina desesperada por afeto para uma mulher madura, com novos valores e cicatrizes emocionais para suportar. Nem ela nem seus parentes divinos são perfeitos, e talvez essa seja a grande ironia das divindades: como se veem tão acima de nós, mas no fim acabam sendo nossos reflexos.
Acho justo apontar os defeitos de um livro mesmo que eu tenha gostado muito, mas não encontrei nenhum neste. A escrita de Madeline Miller é maravilhosa, sofisticada mas não impossível de compreender, e sabe medir quando ir direto ao ponto e quando poetizar e filosofar sobre sua história. Suas frases de efeito não são fora do lugar, não são colocadas de propósito só para dizermos como a autora escreve bem; são orgânicas e se encaixam na narração, pois acredito que é assim que uma deusa com milênios de vida falaria.
Fico feliz de ter dado outra chance para a autora, e espero que ela continue escrevendo releituras e interpretações de mitos gregos, ou quem sabe de outras mitologias, porque eu com certeza leria todos!