spoiler visualizarKenyafdn 01/01/2023
Historicamente, há três tipos de bruxo: o feiticeiro, que pratica a magia simples, encontrado no mundo inteiro; o herege, de quem se afirmava praticar diabolismo e que foi perseguido durante as caças às bruxas; e o neopagão. Os três grupos têm pouco em comum, salvo o designativo de "bruxo".
Dentre os três tipos, aquele das caças às bruxas surtiu o maior efeito histórico. A bruxaria europeia histórica era um satanismo (adoração do Diabo) formado por elementos retirados da antiga feitiçaria, do paganismo, do folclore, da heresia, da teologia escolástica e dos julgamentos em tribunais locais, estatais e eclesiásticos. Se alguém de fato praticou esse tipo de bruxaria, é uma questão em aberto. Alguns indivíduos ou grupos podem ter realizado rituais diabólicos, mas foram raros. A principal importância da bruxaria herética é o conceito em si mesmo: o que podem realmente ter feito esses bruxos é eclipsado por aquilo que se acreditava que eles faziam. As pessoas agem com base naquilo que acreditam ser verdadeiro, e aquelas que acreditaram na real existência de uma conspiração diabólica da bruxaria provocaram a morte de cerca de 60 mil pessoas, aterrorizaram outras milhares, distorceram as mentes educadas durante séculos e deixaram uma mancha indelével nos registros históricos da cristandade.
Muitas razões foram apontadas para a origem, difusão e declínio final das caças às bruxas. Mas a importância fundamental dessas caçadas não se encontra em sua gênese particular e intelectual. Essencialmente, as caças às bruxas atestam a presença de uma horrenda falha na natureza humana: o desejo de projetar o mal sobre os outros, de defini-los como excluídos e de então puni-los cruelmente. As condenações à fogueira em Bamberg e os enforcamentos de Salem são funcionalmente comparáveis aos fornos de Dachau, às brutalidades do Gulag e aos genocídios no Camboja e em Ruanda. A ideologia determina a forma a ser assumida pelo mal, mas o mal que se esconde por trás da forma é uma característica embutida na própria humanidade.
Os bruxos neopagãos estão tentando resgatar os aspectos positivos da religião pagã e trançá-los dentro de uma síntese nova e moderna. Os valores positivos inerentes a essa tentativa incluem uma ênfase na criatividade individual e na autoexpressão em moldar novos ritos e crenças. A bruxaria neopagã e seus rituais abrem um imenso espaço para a poesia, a dança, a música, o riso e para seja lá o que o momento e a tradição inspirarem. A bruxaria encoraja a abertura para a veneração do mundo natural e para a reverência e amor pelo cosmos. Também oferece uma oportunidade de compreensão da importância do inconsciente na integração completa da psique. Proporciona um senso de importância do princípio feminino, que tem sido frequentemente obscurecido pelo simbolismo masculino das grandes religiões monoteístas. Sua validade vem sendo debatida tanto na área da teologia como no campo das leis.
Seja qual for o futuro da bruxaria como força religiosa independente, seus valores devem ser introduzidos de uma forma tão renovada e tão profunda quanto possível. Devem ser igualmente expostos o mais honestamente possível. A asserção persistente de alguns neopagãos, de que eles dão continuidade a uma tradição ininterrupta de antigas religiões, é falsa. Não existiam covens da Wicca antes que Gardner os estabelecesse pela primeira vez, em 1939. É o frescor da criatividade de muitas formas de bruxaria que deve ser admirado, e não uma antiga tradição inexistente. É dessa forma que o neopaganismo e a bruxaria podem oferecer ao mundo alguma coisa nova e vital.
Temos enfatizado a vasta diversidade de crenças e práticas dos bruxos modernos, mas encontramos certas linhas comuns na maioria delas: panteísmo, feminismo, rejeição do conceito de pecado e "reciprocidade espiritual". Tais pontos de vista são parcial ou totalmente contraditórios a outras visões do mundo. Todavia, nenhuma religião (nem qualquer outro tipo de conhecimento) pode, em pleno juízo, proclamar que conhece tudo, e todas as religiões podem aprender e tirar proveito do que é bom nas demais. A feitiçaria ainda persiste; a bruxaria diabólica encontra-se essencialmente morta; os bruxos modernos criaram uma nova religião. A bruxaria não é um conceito coerente, mas um termo que abrange grande variedade de fenômenos frouxamente interligados. Mas a magia conserva seu apelo, e a bruxaria não desaparecerá tão cedo desta Terra.