Maria - Blog Pétalas de Liberdade 02/10/2019Resenha para o blog Pétalas de LiberdadeA obra reúne quatro histórias, uma de cada autor, interligadas pelos textos do Tiago Toy.
"Os mortos não perdoam" é a primeira história, escrita por Marcos DeBrito e se passa em 1948. Através da narração em terceira pessoa, conheceremos Pablo, um rapaz que não se dava bem com a mãe e as irmãs. Elas, entre outras coisas, não apoiavam o seu namoro com Isaura. Pablo achou que seria uma boa ideia matar as três e jogá-las num poço que cavou no quintal, tornando-se livre para ficar com Isaura e com a casa só para ele.
Mas nem tudo sairia como Pablo planejara, as pessoas começariam a desconfiar, além das coisas que ele passaria a ver: talvez fossem alucinações causadas pelas sustâncias que consumia, talvez fossem as assombrações da mãe e das irmãs querendo vingança...
É interessante acompanhar todo o planejamento do personagem e como ele vai se enredando nas mentiras contadas para tentar esconder seu crime. Outro ponto positivo é a ambientação nos anos quarenta, o autor nos faz voltar no tempo e encontrar uma sociedade com algumas convenções um pouco diferentes. A mãe e uma das irmãs do Pablo eram realmente detestáveis, mas tudo poderia ter sido resolvido com ele mudando de casa ou expulsando elas de lá...
Rodrigo de Oliveira escreveu a segunda história, "Nos deixem queimar", que se passa nos anos setenta. No mesmo local onde era a casa de Pablo, foi construído o Edifício Joelma. Talvez vocês saibam que esse edifício pegou fogo em 1974, deixando centenas de vítimas. Na história de Rodrigo, tudo foi desencadeado por uma atitude de Samara. Ela denunciou um dos colegas de trabalho, e ele iria revidar!
O conto me parece ter algumas referências, como os nomes de alguns personagens (o da protagonista é idêntico a do filme O chamado), mortos-vivos e um elevador (do autor eu já li "Elevador 16", um dos livros de sua série de apocalipse zumbi). Ficamos presos na história tentando entender como Samara poderia ter sido a causadora do incêndio, e o desfecho guarda algumas revelações bem inesperadas, é uma daquelas tramas onde a gente não pode ter certeza se aquilo aconteceu mesmo ou não.
"Os treze" foi escrito pelo Marcus Barcelos e é narrado por Amilton, um rapaz que trabalhava como faz tudo e cuidava da mãe, não tinha amigos nem namorada, cresceu marcado pela violência do pai que abandonou a família anos atrás. Quando a mãe morreu, Amilton precisou trabalhar no cemitério para pagar pelo enterro dela. E foi para esse cemitério que foram levados alguns dos corpos dos mortos no incêndio no Joelma. Pessoas que tiveram uma morte tão terrível estariam prontas para o descanso eterno? A julgar pelas coisas estranhas que os funcionário estavam vendo e ouvindo no cemitério, a resposta seria não!
Talvez pelo fato de esse conto ser narrado em primeira pessoa, eu tenha gostado e me envolvido mais com ele do que com os dois anteriores. O autor conseguiu me surpreender, ao trazer uma história com um desfecho relativamente mais feliz do que nos outros contos, além de provar que "às vezes, os mortos não continuavam mortos".
A última história é a de Victor Bonini. "O homem na escada" é narrado por Solange, uma senhora que mora num prédio ocupado. Solange não aguenta mais ver a filha grávida nas mãos de homem abusivo e violento. Desesperada, numa madrugada, ela acabará recebendo ajuda de um estranho homem que encontrará pelas escadas escuras, resultando num corpo em seu apartamento.
Sem ver outra opção, Solange jogará esse corpo no poço do elevador, onde os moradores jogam o lixo. Mas o corpo em decomposição vai exalar um cheiro desagradável, atraindo a curiosidade dos outros moradores. Solange fará qualquer coisa para que as pessoas não liguem esse cheiro ao morador desaparecido, mas ela também tem uma dívida a ser paga com o homem da escada...
Gostei muito da forma como o Bonini narrou a história, nos fazendo mergulhar na mente de Solange e visualizar cada cena e cada sentimento dela, meu conto favorito!
Entre um conto e outro, temos Tiago Toy dando voz a um ser que pode ter tido influência direta em cada uma das histórias, com suas chaves capazes de abrir as portas do mal em cada pessoa. Com um linguajar um pouco mais rebuscado, ele consegue nos provocar alguns calafrios.
Eu já havia lido contos e livros dos quatro autores, só não conhecia o Tiago, e achei muito interessante como a identidade, a assinatura, de cada um deles está presente nos contos. Preferi não me aprofundar muito na descrição das histórias para não estragar as surpresas para quem ainda for ler, mas todas elas, inspiradas em lendas ou tragédias reais, são bem escritas e têm bons personagens. Eu não senti medo durante a leitura (mas raramente sinto medo ao ler livros de terror, o que não se aplica a filmes onde só o trailer já me apavora, rsrs), mas há cenas que podem embrulhar o estômago dos leitores.
Não sei que nota dar para o livro por uma questão muito pessoal: há cenas onde não sabemos se o personagem teve uma alucinação, se foi um pesadelo ou se um fantasma (ou um demônio) realmente apareceu para ele. Essa dúvida acaba fazendo meu lado cético desacreditar da história e tira parte do impacto da trama para mim (não sei se vocês me entendem, mas se uma pessoa vê um fantasma na história e depois dizem que ela estava sonhando quando isso aconteceu, vou achar que foi só sonho e aí acabou o susto da aparição do fantasma). Então não seria justo dar 3 estrelas para um livro que com certeza ganharia 5 pela criatividade, enredos, escritas e personagens, se não fosse esse meu "problema".
A edição traz uma capa um pouco difícil de fotografar, com a reprodução do incêndio e efeitos que parecem fogo de um jeito que eu não tinha visto em nenhuma outra capa até então. Sério, o livro é muito bonito! Há imagens no interior da capa e algumas fotos nas divisórias dos contos. A maioria das páginas é amarelada, mas há algumas pretas com letras brancas, como nas partes escritas pelo Tiago Toy. A diagramação tem bom tamanho de letras, margens e espaçamento, e há alguns erros de revisão.
Fica a minha recomendação para que leiam "Vozes do Joelma", especialmente se curtirem histórias baseadas em fatos reais ou em lendas, se gostarem de livros de terror ou quiserem ter um primeiro contato com o gênero.
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