Gabriel 31/03/2020
Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência
Basicamente, Anthony Burgess constrói a narrativa de uma sociedade inglesa distópica que é dominada pela violência cometida por gangues de jovens vândalos.
Alex, o personagem principal, é um jovem vândalo que tem prazer em assaltar lojas, bater em idosos, violentar e agredir mulheres, bem como outras formas de violências. Tudo isso é feito quando chega a noite, acompanhado de sua gangue (Tosko, Pete e George).
Certa noite, Alex é capturado pela polícia, e a partir desse momento a sua vida irá mudar completamente.
Ele é usado como cobaia, para um experimento que tem a pretensão de fazer com que ele tenha aversão a qualquer tipo de violência. Ou seja, sempre que ele estiver diante de uma cena violenta, vai sentir fortes sensações de mal-estar físico. Além disso, mudará o comportamento para uma atitude oposta, no sentido de que se ele estiver sentindo ódio, sentirá amor.
Entretanto, Alex sente muito prazer na violência, porém depois de passar por esse experimento é obrigado a ter atitudes não condizentes com a sua personalidade. Por essa razão "ser bom pode ser ruim" p.97
O condicionamento a princípio deu certo, porém a gente vai percebendo que ele perdeu o controle de suas próprias ações.
"Eles transformaram você em alguma coisa que não um ser humano. Você não tem mais o poder de decisão. Você está comprometido com atos socialmente aceitáveis, uma maquininha capaz de fazer somente o bem" p.158
É nesse sentido que a gente vai entendendo a razão de ser do título Laranja Mecânica: um ser humano que faz algo, porque é direcionado automaticamente a fazê-lo. Sem nenhum tipo de escolha moral ou ética.
Nesse sentido, Burgess vai tocar na questão dos limites da relação entre o Estado e o indivíduo. Dessa forma, seria correto condicionar as atitudes de criminosos, para que assim a violência seja diminuída? Que questão complexa...
A princípio, fiquei um tanto chocado com algumas cenas de ultraviolencia que são narradas. Porém, não foi um empecilho para a continuidade da leitura. Talvez, uma dificuldade para a leitura seja o nadsat, uma linguagem que é utilizada pelos jovens no livro. Porém, na edição que li tinha um glossário no final com os significados de cada palavra.
Também tem a questão de que não consegui sentir qualquer tipo de empatia pelo Alex. E não acho que ele seja uma "vítima da sociedade", muito pelo contrário. Porém a gente até vai achando ele engraçado, pois o Alex é o narrador, o que achei uma sacada genial do Burgess.
Tem um trecho do livro que merece ser destacado. Taí uma boa problematização:
"Será que um homem que escolhe o mal é talvez melhor do que um homem que teve o bem imposto a si?" p.97
O final do livro foi eletrizante. O condicionamento de Alex foi um sucesso! Ele vai pensar em arrumar um emprego, se casar e ter filhos. Uma laranja perfeitamente mecânica! Assim como todas as outras.
Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência.