EGBraga 09/04/2024
"A Pintora de Henna": Cruel e Sensível
Não tenho local de fala quanto à realidade indiana, mas acredito que "A Pintora de Henna" é uma representação crítica desse microcosmo social. A maneira como a autora atravessa temáticas sensíveis na personagem de Lakshmi é assustadoramente real, ainda mais quando muito do que é abordado pode ser extrapolado para vivências diversas.
Quantas mulheres são como Lakshmi? Mulheres cujos futuros a sociedade projeta antes mesmo de seus nascimentos. Mulheres cujas escolhas escapam entre os dedos, que vivem com medo, às margens do desenvolvimento, da família, do próprio eu. Mulheres que, apesar de tudo, batalham dia após dia, cultivando o presente com cuidadoso esmero para colher algum fruto após anos de ávida dedicação. E pior, quantas meninas são como Radha? Meninas obrigadas a se tornarem mulheres antes do tempo, somente para vivenciar a vida em sua mais brutal essência.
E abordar temas como esses não a tornam uma obra chata. Todos os contrapontos, o enredo e os personagens corroboram de forma orgânica, causando sentimentos genuínos durante a leitura, como o desconforto gerado pela incompreensão de Radha acerca da situação e a felicidade de Lakshmi em seus muitos começos e recomeços. Dito isso, apesar de, pessoalmente, Radha ter me consternado em várias ocasiões, entendo sua função e sua mensagem para a obra.
É um livro com várias camadas, capaz de gerar distintas interpretações a cada leitura, mesmo que realizadas pela mesma pessoa. Exatamente por isso uma experiência recomendável a qualquer leitor que deseja aprimorar um olhar crítico e refletir sobre a vida. Afinal, nem tudo é apenas aquilo que vemos.