snuneshonorato 31/01/2024
Hibisco roxo
Este romance costura diversos temas na sua construção de maneira bem fluída, temas relacionados a cultura, a história e a economia local.
É uma história que se passa na década de 90, e traz como principais pautas todas as consequências que o fanatismo religioso exercido pelo personagem Papa (ou Eugene) gera para os personagens envolvidos. Ele é um homem extremamente religioso, autoritário e violento, onde esses aspectos vão sendo revelados aos poucos pelo livro, principalmente a violência que, por mais que já presente desde o primeiro capítulo, foi mostrando sua intensidade e sua gravidade mais para o final, envolvendo Papa bater violentamente nos membros de sua família.
O livro é escrito em primeira pessoa, pela perspectiva da personagem Kambili, filha de Papa e Mama e irmã de Jaja. Ela é uma garota muito comportada e retraída por influência do pai, e ela quer o agradar o tempo inteiro, o que acaba atrapalhando os seus relacionamentos, como não ter amigas na escola e também não ter proximidade com membros da sua família por proibição do pai - isso se torna evidente não apenas para Kambili, mas para seu irmão também.
Por mais que seu irmão também sofresse por toda essa pressão imposta pelo pai, Jaja acaba se revoltando mais após tomar consciência da vida que ele poderia ter se não fosse o autoritarismo de Papa, e acaba tentando mostrar isso para ele mais para o final do livro (e também no capítulo que se inicia).
Com as crianças passando boa parte da história na casa de Ifeoma, irmã de Eugene e tia deles, a história acaba tratando também das características da família deles, tia Ifeoma e seus três filhos. Tia Ifeoma é professora universitária, e são tratadas questões relacionadas a isso, como está precária a situação na universidade e isso acaba refletindo tanto para os estudantes quanto para os professores, e como ela está numa situação bem vulnerável nesse quesito. Também trata das ideias que ela tem, que Mama sempre julgava como ?papo de universitário?. O livro tratava das greves que aconteciam e da situação na universidade no geral, e como isso refletiu para que no final do livro ela tivesse que se mudar para os Estados Unidos.
Além de outros quesitos, a questão das línguas foi tratada de maneira muito importante, como Papa e pessoas que dividiam seus ideais como o padre branco que eram da igreja deles julgavam o inglês como o idioma digno, e o igbo só era usado quando se tratava de situações particulares com a família e geralmente só usado para momentos de aborrecimento. Eles forçavam mais o sotaque britânico e não o nigeriano no inglês, o que mostra mais um aspecto da força do imperialismo no país.
Ainda sobre a família de Eugene, por ele ter restringido muitas coisas, isso acabou trazendo consequências negativas, que foram tratadas pelo livro. O silêncio era tão presente em um família que não ri e nem canta, todos os membros eram muito controlados, a mãe era oprimida. Por mais que os filhos fossem obedientes, também tinham muita curiosidade. O livro trata muito disso principalmente no caso de Kambili, que por mais que ela pensasse o tempo todo sobre as coisas ?erradas? que estavam acontecendo e que seu pai a repreenderia por conta disso, ela ao mesmo aproveitava tudo inconscientemente, e sentia muita culpa por isso. Kambili também sempre buscava pensar o que ela faria que deixaria seu pai orgulhoso. Já Jaja, ele também foi um garoto muito exemplar mas ao se deparar com costumes diferentes e que lhe traziam mais liberdade, ele se desperta e quer mudar sua realidade, mesmo sabendo que aquilo é algo simples.
O final do livro é muito forte. Eugene morre, e logo Mama assume para os filhos que foi ela quem matara ele envenenado, que tinha começado o processo um tempo antes. Nisso, Jaja acaba assumindo a culpa para a polícia, e ele passa por quase três anos preso. Então o último capítulo trata justamente do ?presente? dos personagens, que fala sobre como Jaja está com a prisão, como está Mama, completamente debilitada e chamada de louca e até Kambili. Além deles, também é tratado da família de tia Eugene nos Estados Unidos, e como eles não eram mais aquela família alegre e unida que eles conheciam. Todos os personagens foram afetados demais, e isso trouxe muito peso para quem está lendo.
Os único dois aspectos que me incomodaram um pouco nesse livro (mas sei que é algo bem mais pessoal do que qualquer coisa, porque entendo a importância de estarem ali), foram as diversas descrições que diziam a respeito do golpe de Estado que teve e suas consequências para os negócios do personagem Papa, e os dialetos em igbo inclusos no enredo. Por esse ter sido meu segundo livro de origem africana, talvez eu tenha tido um estranhamento maior, e senti que talvez eu estivesse perdendo parte do entendimento do livro por não saber o idioma. Sobre o golpe de Estado, entendo que pode ser algo importante trazer para a história o contexto político pelo qual ela passa, mas não me gerou nenhum interesse em saber, e as partes que tratavam sobre política ou o que isso influenciava no trabalho de Papa eu li sem muita vontade. Isso fez com que não fosse um livro que tivesse tanta vontade de ler compulsivamente, e talvez por outros motivos também, não foi uma leitura cativante para mim por todo o desenvolver.
Em suma, Hibisco Roxo é um livro muito rico, que trata de diversas questões que não é comum vermos nos livros, principalmente na literatura americana. Com o contexto histórico do país, é um livro que acaba ficando muito e mais rico e muito bom para acabar conhecendo melhor e literatura e a realidade nigeriana, e acabar furando sua bolha de sempre a mesma história.
*como havia terminado esse livro antes de publicar no Skoob, não tem as atualizações dos capítulos:(*