Daniele 27/11/2021
Alheio a vida, aliás, qual o sentido dela?
O estrangeiro é um livro que poderia facilmente ser chamado de "o estranho". Meursault é um cara totalmente alienado aos fatos ao redor de si. É indiferente a morte da mãe, não derramando uma lágrima se quer, um dia após o enterro segue com sua vida normalmente e vai ao cinema assistir um filme cômico com sua namorada. É indiferente com as pessoas que convive; seu chefe o propõe uma premiação no trabalho, onde poderá morar em Paris e viajar, ele responde "tanto faz". Seu vizinho espanca a namorada, pede que que ele testemunhe a seu favor e ele prontamente diz "ok, tanto faz".
Sua namorada o pede em casamento, ele diz "tanto faz".
Assassina um homem sem nenhum motivo real, mesmo o vendo inerte, ainda lhe dirige mais quatro tiros, que logo dirá que "era como se batesse quatro breves pancadas à porta da desgraça."
Após o assassinato, é preso e fica a espera de seu julgamento, e o que vemos não é simplesmente uma discussão a cerca do homicídio, mas aos fatos precedentes, esses mesmos que descrevi, ao fato, por exemplo, de ter aceito um cafezinho no velório da mãe, e de ter dormido frente ao seu corpo inerte.
No seu julgamento, não só as testemunhas do fatídico crime, mas principalmente, as pessoas do asilo que sua mãe morava, seus vizinhos, sua namorada e o guarda que o ofereceu café testemunham, e a partir daí, a discussão se passa a questionar não só o que o levou ao tiros, mas como ele se comporta diante pra própria vida.
Posso dizer que foi um livro que me causou muito incômodo, mas acho que essa era justamente a intenção. Os monólogos nas últimas páginas são incríveis, e a última frase do livro me deixou quase sem ar, é com certeza um livro duro, mas excelente, que necessita ser lido com muita calma e apreço, para não ser confundido com um livro monótono ou chato.
Enfim, o absurdo de Camus me surpreendeu, e agora, pretendo ler "O mito de Sísifo", que conversa muito com "O Estrangeiro", além de claro, "A peste".
Apesar do estranhamento, e talvez justamente devido a ele, gostei demais desse livro, que inclusive pretendo reler futuramente.
Uma curiosidade que li aleatoriamente num comentário por aí, o nome do Meursault é um trocadilho. “Meur” e morre (meurre) em francês é pronunciado do mesmo jeito. “Sault” e “sot”, que significa idiota, imbecil, débil, também. Ou seja, o nome do Meursault é um trocadilho que quer dizer “morre idiota”, “morre imbecil”.