Matheus 14/05/2024
A despedida da Estrela
?Ora, pois o último inimigo a ser aniquilado é a morte?. Seria então a morte o nosso adversário final ou aquela plateia que nos ovaciona, nos prestigia e nos premeia na linha de chegada? Seria a morte a recompensa final de uma longa e tortuosa corrida ou apenas o último obstáculo a ser alcançado? Para muitos o percurso da vida é singular, único e abarrotado de desafios; para alguns há uma vivacidade feroz em se participar da corrida e cada obstáculo é vencido com fervor; para outros há a incapacidade de se perceber a maratona na qual ela percorre; e para vários o campeonato é sem sentido algum.
E para Clarisse Lispector em seu livro A hora da Estrela a corrida da vida é a soma de cada uma das partes. Ao retratar sobre a vida de Macabeia no desfecho da obra, a autora nos apresenta uma moça na qual deixa sua vida amarga no Sertão do Recife e se muda para o Rio de Janeiro em busca de novas oportunidades, um novo trabalho e até novas aventuras. Em sua nova cidade, agora empregada como datilógrafa, Macabeia experimenta uma vida totalmente inédita com amizades, romances e até a previsão de seu futuro!
Entretanto, a caminhada da personagem não é tão vivaz assim. Marcada por muita solidão, miséria e rejeição em sua terra natal a personagem é nos apresentada como digna de pena na qual sua história não merecia nem ser contata. Os adjetivos usados pela autora para descrevê-la são pesados, amargos e nenhum pouco amistosos. O intuito, além de nos causar comoção e pena, é transcrever aos aspectos característicos da figura principal todas as marcações presentes em sua trajetória.
Contudo, é possível associar que algumas dessas marcas foram presentes na vida da própria autora. Diante disso, em seu último livro, Clarisse expressa por meio de sua linguagem rebuscada, sua pontuação gráfica singular e sua adjetivação única, a sua insatisfação com o sentido da vida. Em todos os aspectos da narrativa, desde a descrição de Macabeia até o final inesperado que a cerca, Clarisse nos prova de maneira sútil como a vida é bela, amarga e ilógica.
E nesta sua última obra é possível perceber, de forma intrínseca, o sussurrar da despedida da escritora em forma de versos: ?vivi o que pude viver, senti o que pude sentir, amei o que tinha de amar e sofri muito mais do que tinha a sofrer?.