Dani do Book Galaxy 01/06/2020Mais distópico do que propriamente de terror, é um livro que melhora em cada releituraEm tempos de pandemia e cercados pelo medo de um vírus que não conseguimos desvendar e contra o qual buscamos desesperadamente nos proteger, foi muito oportuno fazer a releitura deste clássico do sci-fi em pleno 2020.
Considerado um dos primeiros a abordar a temática dos zumbis, "Eu sou a Lenda" é um livro que, em minha opinião, pousa muito mais no terreno da ficção científica do que do terror propriamente dito - mas não por trazer questões complexas de ciência ou tecnologia; e sim, por trazer aquele tempero especial que temos em todo sci-fi que se preze: questionamentos, questionamentos e mais questionamentos.
Escrito de uma forma extremamente fluida, é um dos sci-fis mais fáceis de ler que já conheci até então. Capítulo a capítulo, acompanhamos Neville se adaptando a uma realidade onde é o ÚLTIMO ser humano da Terra, e, apesar de tal premissa parecer maçante à primeira vista, na verdade o autor as coloca de forma que ficamos interessados em saber mais sobre aqueles mortos-vivos (que se assemelham muito a vampiros) rondado a casa de Neville ao anoitecer.
E, quando mal percebemos, já se passaram 100 páginas e estamos tão paranoicos como o próprio Neville.
Na rotina de acordar todos os dias para se deparar com um mundo devastado, tendo que simplesmente descobrir como sobreviver mais um dia, o protagonista nos guia então aos questionamentos que comentei acima.
Os mais óbvios são os que dão forma à história: o que é o tal vírus e por que as pessoas se tornam mortos-vivos? Mais importante do que isso: o que isso pode dizer sobre as lendas dos vampiros e como Neville pode sobreviver?
É até engraçado acompanhar o personagem buscar respostas em livros e enciclopédias (afinal, a história se passa nos anos 70), admitindo que não entende nada de microbiologia e que as únicas formas de combater algo que se não conhece é justamente se informar.
Além das cabeçadas que Neville dá contra os termos e conceitos biológicos, temos também as teorias mirabolantes da personagem sobre a lenda dos vampiros. Alho, espelhos, estacas de madeira - por que esses elementos da lenda realmente surtem efeito nos zumbis que foram afetados pelos vírus?
Em minha opinião, o mais interessante do livro é justamente acompanharmos a impotência da personagem perante algo que ele não sabe e nem pode controlar; vermos, página a página, como sua mente se transforma e se adapta a um mundo que nunca mais será o mesmo.
Onde nada, jamais, voltara a ser como antes; parafraseando uma música do R.E.M., it's the end of the world as we know it (alguma semelhança com a realidade até aqui?)
Dito isso, este é um livro que não deve ser lido com um olhar tão crítico e afiado sobre as questões científicas e biológicas, mas sim voltado para as questões sobre humanidade e tolerância; sobre sociedade e sanidade.
O final ainda me deixa arrepiada, e acho que as frases finais são umas das melhores que já li em livros de sci-fi.