André Siqueira 02/11/2020
Clássico de fácil digestão e representativo de seu tempo. Uma obra que envelheceu muito bem, com temática ainda atual.
É curioso como os inimigos que enfrentamos refletem a época que vivemos. Em “O fim da infância” vemos o fim do mundo – mesmo que não acabasse em deserto nuclear teria fim graças ao descontrole das novas forças surgidas pela própria natureza da evolução – impedido por aliens, seres misteriosos oriundos do espaço sideral que apenas querem o nosso bem.
Nossos heróis não agem por altruísmo, são obrigados a tal por outra força superior, espécie de agentes imperialistas da maior de todas as mentes. O que eles querem é a pergunta que motiva toda a trama, a engrenagem por onde gira a história. O resultado final não é outro se não a extinção da raça humana, também pintada a partir de uma ótica favorável.
Arthur era pessimista, certamente. E o clima de seu tempo é facilmente digerível a partir de tal obra. Leitura obrigatória para qualquer fã de FA ou estudioso do período, retrata de forma admirável o medo da destruição iminente e inevitável – se o livro fosse escrito hoje seria a IA a nos salvar, sem sombras de dúvida.
Personagens rasos com reações absurdamente calmas e controladas. Talvez seja uma constante na ficção científica do período? Parece existir certa constante atravessada por Phillip K. Dick, Arthur C. Clarke, Lovecraft, Chesterton, Wells, Huxley, Frank Herbert onde o worldbuilding é peça central da obra, as personagens são meras atoras no mundo e fadadas ao esquecimento. Me lembro claramente de todos os mundos onde as histórias se passam, mas pouco me fica daqueles que atuam nestes mundos. Algo a se pensar.
Mas o worldbuilding é incrível, a lógica interna da obra é coerente e é possível, embora não seja fácil, antecipar várias das revelações a partir das pistas espalhadas pelo texto. Não existe um ponto fora da curva e a teia de causa e consequência é tecida com cuidado e coerência.
Gostei do final, não amei; mas entendo perfeitamente, de todas as saídas a unificação da mente mundial é, talvez, a mais elegante.
Arthur pode ser pessimista, mas se segura a um fio de esperança, e isso é facilmente perceptível através do futuro que ele traça para sua raça: fadados a própria destruição, a não ser que forças fora de nosso controle nos moldem para a sobrevivência, sejam elas alienígenas ou evolutivas.