Polly 17/02/2019
Estação Carandiru: um relato sobre a realidade mais dura da desigualdade social (#071)
A leitura de Estação Carandiru veio da minha necessidade (recente e urgente) de mudar as estruturas internas aqui dentro da cachola e da alma, sabe? Acho que as fatídicas eleições de 2018, apesar dos pesares, foram uma grande oportunidade de rever conceitos, que para mim eram absolutos e que, depois daquele turbilhão de emoções, talvez não sejam mais. Para ser sincera, é provável que eu jamais volte a pensar de forma absoluta sobre qualquer outra coisa. Dessa forma, posso até falar que, de alguma maneira, as eleições de 2018 até que me trouxeram algum saldo bom.
Estação Carandiru foi uma indicação da maravilhosa @carolburgo (sigam ela, sério!). Tenho que dizer que essa minha conterrânea porreta também foi uma das responsáveis por essa minha necessidade de mudança interna e de quebrar meus próprios preconceitos. Depois de uma sequência de stories que ela fez no ano passado (que estão salvos em seus destaques com o nome “Mudar é Bom”), eu finalmente me dei conta do quão privilegiada eu sempre fui (e sou), e por méritos que não são exatamente meus, como a cor da minha pele ou a sorte de ter nascido numa família estruturada, por exemplo (mesmo vindo de uma realidade de poucos recursos). Assim, resolvi usar a literatura para entender o ambiente no qual estou inserida e, sobretudo, entender realidades que não são a minha. Comecei esse processo pelas indicações da Carol, precisamente pelo livro que vos falo.
Em Estação Carandiru, Dráuzio Varella narra histórias de personagens reais com os quais conviveu durante o tempo em que trabalhou na Casa de Detenção do Carandiru, em São Paulo, onde aconteceu o massacre de 1992 (que, inclusive, é o clímax da obra). Dráuzio nos conta o dia a dia e o funcionamento da cadeia: os diversos grupos que lá existiam, as leis internas, as condições inóspitas, a impossibilidade de recuperação social que tais condições forneciam. O mais incrível da escrita do Varella é que não há romantismo em sua narrativa. Os personagens são reais, são o que são, mas em momento nenhum perdem sua humanidade, suas nuances de luz e trevas que todos temos.
Estação Carandiru escancara e põe por terra o “senso comum” de que as pessoas que se encontram em tal situação o estão por livre escolha. Ninguém, em sã consciência, escolheria tal vida para si. Não é questão de “passar a mão na cabeça de bandido”, mas de perceber que o cerne da violência é a desigualdade, e é sobre ela que se deve agir. É necessário perceber que a sociedade é violenta como um todo, a medida em que enquanto falta o básico a uns, a outros é dado até mais do que o supérfluo. Até por que não é todo mundo que consegue, por si só, transcender à violência e à miséria, não é?
O livro ainda nos desperta muitos outros pensamentos e nos faz chegar a muitas outras conclusões como, por exemplo, a incapacidade do sistema punitivo de fazer o que ele se propõe a fazer: recuperar pessoas; a realidade do racismo estrutural; e a marginalização das pessoas LGBT’s. Mas, discutir tudo o que Estação Carandiru provoca dá pano para mangas, e o espaço do Instagram não é suficiente para isso (tenho certeza que já estou usando o espaço dos comentários nessa parte hahaha). Além do mais, preciso de muito mais bagagem de leitura para discutir minimamente (e satisfatoriamente) sobre esses assuntos. No entanto, estamos trabalhando para mudar essa realidade. Vamos em frente!
Enfim, Estação Carandiru é um livro incrível, e uma leitura super necessária para despertar discussões que nos levem a uma real e efetiva solução do problema da violência. Ele possibilita o contato com experiências diferentes das nossas e, quem sabe, um maior entendimento sobre a realidade do outro. Sem contar que a escrita do Dráuzio é incrível, sem deixar de ser simples, o que faz com que a leitura flua facilmente. Eu, particularmente, já estou louca para ler os outros dois livros da trilogia (Carcereiros e Prisioneiras) e quando o fizer, venho aqui para a gente conversar mais!
site: https://madrugadaliterarialerevida.blogspot.com/2019/02/estacao-carandiru-um-relato-sobre.html#more