Dayvid Simplicio 29/05/2018
Marcos Bagno, natural de Cataguases, Minas Gerais, tradutor, é mestre em linguística pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), doutor em filologia e língua portuguesa pela Universidade de São Paulo (USP), atualmente professor do Instituto de Letras da Universidade de Brasília (UnB). Tem vários trabalhos publicados na área da Sociolinguística tais como: Preconceito linguístico - o que é, como se faz (1999) e seu trabalho mais recente: Gramática pedagógica do português brasileiro (2011), entre outros livros que lhe renderam vários prêmios.
“A Língua de Eulália: novela sociolinguística” traz como tema principal a variação linguística em vista da quebra do preconceito linguístico na escola e na sociedade. Estas variações, por ele chamadas “linguagem não padrão”, são a evidência da não existência de uma unidade linguística no Brasil, mito sobre o qual ele vai discorrer em seu livro Preconceito Linguístico – o que é, como se faz (1999).
De forma descontraída e dinâmica, o autor desenvolve uma narrativa ficcional que envolve o leitor na estória (novela). Suas ideias são baseadas na teoria sociolinguística do americano William Labov, que foi o pioneiro na análise de fenômenos linguísticos em relação a fatores sociais. A novela narra a história de três jovens estudantes (Emília, Silvia e Vera) que vão passar suas férias na casa de D. Irene, tia de uma delas. D. Irene é professora aposentada de linguística e língua portuguesa e tem se dedicado à análise do modo de falar não padrão; para isso, tem como inspiração a personagem Eulália. A narrativa se dá com diálogos estabelecidos entre D. Irene e as três jovens, nos quais a professora expõe suas teorias em forma de “aulas”.
O autor divide a obra em capítulos, em cada qual mostra um fenômeno que ocorre na linguagem popular; fenômeno este que à primeira vista parece ser errado, fruto da ignorância dos falantes, porque se desvia das normas gramaticais aprendidas na escola. E busca explicar, de modo objetivo, simples, compreensível à qualquer leitor, mesmo aos leigos na área, as razões históricas, socioculturais, fonético-fonológicas, sintático-pragmáticas, que determinam a ocorrência dessas alterações no modo de falar prescrito pelas regras tradicionais da Gramática.
O autor em sua obra pretende chamar a atenção para a existência do preconceito linguístico e conscientizar o leitor desta forma de exclusão social. Esta conscientização depende primeiramente da derrubada da noção de erro. E o autor reconhece muito bem essa dependência quando, logo nos primeiros capítulos, diz que não existe o falar errado, mas um falar diferente. Esta noção de diferença faz-se essencial para a compreensão da ideia geral da obra, porque retira a carga pesada que a ideia de erro põe sobre a língua e dá oportunidade para que as variantes linguísticas sejam observadas com mais atenção e livres de pré-julgamentos.
Bagno se vale de métodos comparativos entre línguas atuais, quando analisa a semelhança estrutural entre o português e outras, como o inglês, o espanhol e o francês, e evidencia claramente que as construções consideradas erradas na linguagem não padrão do português têm sua base estrutural de formação aceitas normalmente nas regras gramaticais dessas outras línguas. A partir disso podemos perceber a resistência em preservar a tradição gramatical da língua. Também se vale do método histórico, quando busca explicar os fenômenos das variantes através da evolução do latim clássico e vulgar para as línguas neolatinas. Um argumento de que se utiliza é que os ditos “erros” cometidos pelos falantes do português não padrão ocorreram em textos clássicos de autores famosos da nossa literatura; isso reflete a mudança natural nas línguas, que é resultado das necessidades de uso dos falantes.
A obra é relevante para o campo da educação e dos estudos linguísticos de modo geral, pois oferece uma nova visão de língua, que vem quebrar concepções tradicionalistas e preconceituosas sustentadas pelos gramáticos e pela sociedade, que não observam a língua como elemento vivo, mas como um modelo estático, fixo. Permite ainda que a escola possa transmitir a língua tal como ela é, tal como ocorre naturalmente em sua essência, ou seja, na fala dos usuários.
É recomendada e de fundamental importância para pesquisadores na área de Linguagens e para professores e estudantes do curso de Letras e de Pedagogia.