MR.Santi 19/01/2015
Por mares nunca de antes navegados
“Este receberá, plácido e brando,
No seu regaço o Canto que molhado
Vem do naufrágio triste e miserando,
Dos procelosos baxos escapado,
Das fomes, dos perigos grandes, quando
Será o injusto mando executado
Naquele cuja Lira sonorosa
Será mais afamada que ditosa.”
Os versos acima compõem a estrofe de número 128 do canto X de Os Lusíadas, de Luís de Camões. Narram um naufrágio enfrentado pelo poeta no rio Mekong, no sudeste asiático. Nesta ocasião, Camões se salva em uma tábua, levando consigo apenas o manuscrito já iniciado de sua maior epopeia.
Não se sabe ao certo quando ou onde nasceu o poeta português Luís de Camões. As especulações variam entre Lisboa, Coimbra, Santarém, Alenquer, 1517, 1524, 1525...Sabe-se, entretanto, e mais importante, que Camões foi o maior representante português do espírito renascentista, bem como um dos maiores poetas da história. Passou sua vida entre Portugal, África e Ásia. Finalizou Os Lusíadas em Lisboa e publicou-o em 1572, mesma cidade de sua morte, oito anos depois, em 1580.
A obra foi iniciada quando o poeta estava fora de Portugal. Reflete todo o saber e os ideais da Renascença. Composto por dez cantos (que variam entre cem estrofes cada), é regular, harmonioso, coeso; metáfora perfeita do mundo na visão do renascentista. Cada estrofe é composta de oito versos decassílabos, seguindo o esquema fixo A-B-A-B-A-B-C-C.
A estória mistura-se à história. Os Lusíadas (como o próprio nome sugere) conta a viagem da frota de Vasco da Gama à Índia. Tendo como modelo Homero e Virgílio, traz um herói coletivo, um certo tom de ufanismo, cantando “o peito ilustre Lusitano, / A quem Netuno e Marte obedeceram”. É, em resumo, uma longa narrativa das conquistas portuguesas, contando a viagem de Gama e a história de Portugal.
Nota-se ainda, bem como ao grego e romano supracitados, forte semelhança com a Divina Comédia de Dante. Talvez o ponto de convergência mais perceptível entre as obras seja justamente o louvor à fé cristã. Mesmo com a presença de deuses e seres mitológicos, ao final, os homens levados pela fé em Cristo sobrepujarão os velhos deuses. A partir desta fé e mantando-se fieis a ela e a seu rei (outra característica muito presente nos personagens), os portugueses conseguem passar por qualquer dificuldade.
Mas nem mesmo essas semelhanças diminuem o grau de genialidade de Camões (talvez, façam até o contrário). Os Lusíadas definitivamente é uma obra única; já uma epopeia apenas em seu fazer. Com um projeto de tamanho fôlego, em uma das línguas mais difíceis do mundo, não se pode negar que Camões navegou “por mares nunca de antes navegados” e, mesmo que apenas depois de sua morte, recebeu a fama e aceitação merecidas.
“Para servir-vos, braço às armas feito;
Para cantar-vos, mente às Musas dada;
Só me falece ser a vós aceito,
De quem virtude deve ser prezada.”
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