Lina DC 10/07/2020"As outras pessoas" é o novo livro da autora C. J. Tudor e traz um enredo que fala sobre perdas. Narrado em terceira pessoa, tudo começa em um trecho da Rodovia M1, quando Gabe se encontra preso em um engarrafamento e atrasado (mais uma vez) para chegar em casa.
Gabe é um editor, casado com Jenny e tem uma filhinha de cinco anos de idade chamada Izzy. Jenny ultimamente tem discutido com o marido sobre o fato de que ele está sempre trabalhando e de que tanto ela quanto a filha do casal querem que ele passe mais tempo em casa, desfrutando a vida familiar.
Enquanto Gabe está pensando nas palavras da esposa, ele percebe que no carro a sua frente tem uma garotinha muito parecida com a sua Izzy. Não, espera. Na verdade, é a sua Izzy. Mas o que ela está fazendo em um carro estranho que dispara enlouquecidamente quando ele tenta fazer contato? A partir desse momento, Gabe vive o seu pior pesadelo.
Três anos se passam e Gabe se torna um homem irreconhecível. Ele não saí mais da rodovia, dormindo em seu carro e parando em postos para se alimentar e limpar. Está apático, magro e completamente exausto, mas não consegue imaginar sair da rodovia em busca de respostas.
"Coisas terríveis acontecem, é claro, mas acontecem com as outras pessoas, sobre as quais você lê nos jornais. Não com você. Não com alguém que você conheça. Não com alguém que você ama." (p. 71)
Kate é garçonete no Posto Newton Green, na Rodovia M1. Ela sempre observa os seus clientes, principalmente os habituais e não tem como negar que o homem apático que aparece por lá de tempos em tempos chama a sua atenção graças a tristeza e desolação estampada em seu rosto. Ela não consegue explicar o que a motiva a prestar tanta atenção nele, talvez seja o fato de que sua própria vida seja uma bagunça. Divorciada, com dois filhos para criar e um emprego sem perspectivas, Kate nunca imaginou que sua vida teria esse destino, mas aprendeu há muito tempo que a vida é cheia de percalços e devemos fazer o melhor com o que temos em mãos.
"Kate torcia para que aquilo não fosse verdade. Ela torcia para que o homem magro um dia encontrasse a sua paz. Não só para o bem dele. Havia algo nele, no seu desespero silencioso, que lhe dava nos nervos. Mais que tudo, torcia para que, um dia, ela chegasse ao trabalho e ele não aparecesse, e ela não precisasse pensar nele nunca mais." (p. 17)
Temos também Fran e sua filha Alice, que estão constantemente fugindo. Fran sabe que as duas nunca estarão seguras, mas essa vida de foragida está cansando e Fran sabe que o perigo está chegando cada vez mais perto. Além disso, Alice é um pouco peculiar e fala sobre um certo "homem de areia".
E é claro, não podemos nos esquecer da menina pálida no quarto branco, uma constante no enredo. As narrativas dessas passagens são mais abstratas, simples e sem muitas explicações. O que inicialmente parece um núcleo sem pé nem cabeça, termina sendo aquele que guarda as chaves para desvendar o maior dos mistérios da obra.
Esse quatro núcleos tão diferenciados encontram um elo em meio aos segredos mais profundos de cada um. De forma bem estruturada e coesa, a autora trouxe um enredo enigmático e verossímil que é realmente assustador. Ela explora as profundezas da natureza humana e representa os piores sentimentos e atos em sua obra.
"Vivemos num estado permanente de negação. Uma crença cega de que somos diferentes, especiais. Protegidos por um campo de força místico que desvia tudo de ruim." (p. 71)
Apesar da história ter uma profundidade espetacular, existe alguns detalhes que poderiam ser considerados desnecessários, como por exemplo, o toque sobrenatural que foi representado na obra. Acredito que o impacto teria sido maior nos leitores se o livro focasse no suspense e em sua resolução, mas isso não diminui a excelência da obra, apenas a torna um pouco menos satisfatória.
"Estar desaparecido é diferente de estar morto. De certa forma, é pior. A morte oferece um fim. A morte dá permissão para o luto. Para fazer um funeral, acender velas e deixar flores num túmulo. Para seguir em frente." (p. 20)
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