Garota, mulher, outras

Garota, mulher, outras Bernardine Evaristo




Resenhas - Garota, mulher e outras


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Ana Sá 04/01/2022

Aline Bei, Chimamanda e as outras de Bernardine Evaristo
?Nasce mais um clássico do século XXI escrito por uma mulher?, foi o que pensei ao fechar o livro! 

Se o cânone literário do passado é eurocêntrico, branco e heteronormativo, autoras como Bernardine Evaristo, ao lado de Chimamanda, Paulina Chiziane, e tantas outras, chegam com o pé na porta da literatura contemporânea para cravar suas unhas na historiografia literária mundial. No futuro, seus escritos serão, a meu ver, a melhor tradução daquilo que denominamos de ?início do século XXI?.

Eis minha aprendiz de resenha deste romance vencedor do Booker Prize 2019:

Em um dos meus históricos de leitura, eu afirmei: ?este livro é uma mistura de Aline Bei (na forma) e de Chimamanda (no conteúdo e nas ironias)?.

De fato, quem recentemente se aventurou pela escrita de Bei, sentirá uma imediata familiaridade com a ficção em versos de ?Garota, mulher, outras?, essa curiosa estratégia narrativa que reveste a prosa de uma cadência boa de ler. E se alguém mais, como eu, estiver com a leitura de "Americanah", de Chimamanda, fresca na cabeça, se lembrará dos risos que as caricaturas e ironias do nosso tempo, quando bem trabalhadas, podem provocar. Em comum, a escrita de Chimamanda e de Evaristo presta um testemunho poético do século XXI, sem recorrer a maniqueísmos nem simplificações, mas enfrentando todas as contradições identitárias e ideológicas que a contemporaneidade nos impõe. Raça, gênero, identidade (trans)nacional, tudo com um toque de maestria. Semelhante às ironias de Machado de Assis ao retratar a elite brasileira do passado, a literatura dessas mulheres ironiza nossos esforços de nos encaixarmos, de encenarmos, de nos encontrarmos e/ou de prestar reverência a certas condutas sociais, sem antes, ou depois, refletirmos sobre os significados das ideias que abraçamos.

Relacionamento abusivo lésbico. A mulher que deseja ser bela, recatada e do lar. O desejo sexual da mulher da terceira idade. O conservadorismo homossexual. Os grupos identitários que se confundem com seitas. O feminismo liberal. Os devaneios de uma bisavó que tem um@ net@ de gênero neutro. A representatividade na arte. A autoestima e o corpo racializado das mulheres. O não lugar das estrangeiras. Uma professora exausta? ?Garota, mulher, outras? abala as placas tectônicas do dito ?politicamente correto? sem deixar de lado a importância que essas questões (tão sensíveis) têm, sem tampouco se esquecer do respeito que esses temas merecem. Nesse livro, vemos a nós e às nossas, pessoas do século XXI, como uma caricatura de nós mesmas. 

As mulheres de Bernardine Evaristo me lembraram Grada Kilomba, quando esta diz que ?a mulher negra é sempre a mulher negra. a mulher branca é apenas mulher?. Lembrei-me disso justamente porque a obra consegue trazer mulheres racializadas em suas especificidades identitárias (tratando, por exemplo, do preconceito e da sexualização dirigidos ao corpo da mulher negra) ao mesmo tempo em que, naturalmente, e como deve ser, tais personagens se apresentam também a partir de seus traços universais, dado o complexo trabalho ético e estético desenvolvido em torno delas. Eu, você, todas nós podemos ver um pouco da mulher que somos em algumas dessas mulheres. Quando não, nos veremos desejando ter a oportunidade de nos tornamos amigas delas, nem que seja para dizer: ?amiga, socorro, você tá toda errada e cagada!?.

Difícil me despedir deste romance. Me apaguei. O livro, ambientado no Reino Unido, se organiza em 5 partes + Epílogo, cada parte trazendo a história de três mulheres que estabelecem, entre si, algum laço familiar, afetivo ou social. Mulheres de uma mesma geração, mulheres que frequentam a mesma escola ou ambiente de trabalho. A mesma narrativa contada sob prismas diferentes, desafiando nossa vontade de classificar o mundo entre ?certo? e ?errado?. E, sim, é uma narrativa com um final à altura!

Parafraseando a saudosa Marília Mendonça, este é daqueles livros que a gente fecha e pensa: ?você virou saudade aqui dentro de casa!?. Dominique, Shirley, Carole, Penelope e "outras" deixaram  mesmo saudades por aqui!

Obs. 1: este romance me fez lembrar também de "Insubmissas lágrimas de mulheres", da nossa Evaristo, a maravilhosa Conceição Evaristo!

Obs. 2: "Garota, mulher, outras" é o favorito de 2021 de muita gente que conheço; porém, aqui no Skoob, cheguei a cruzar com uma pessoa que acusava a escrita da autora de ser capacitista. Eu tentei dar atenção a essa questão durante a leitura, mas não percebi traços de capacitismo no romance, talvez por ignorância minha, talvez porque, de fato, não seja um aspecto que salte aos olhos ou que se faça presente de forma significativa. Não sei! Se você for a tal pessoa que fez essa crítica, comenta aqui para que a gente possa refletir junto! Eu, em particular, não notei nada nesse sentido.
Luciana 04/01/2022minha estante
Fiquei curiosíssima!!


Ana 05/01/2022minha estante
Sempre que eu olhava essa capa eu pensava que era teoria kkkkkk vou atras dele agora com essa resenha


Joao 05/01/2022minha estante
Ana, que resenha maravilhosa! Parabéns!


Julia Mendes 05/01/2022minha estante
Sigo adorando tudo que você escreve! ??


Paloma 05/01/2022minha estante
Que resenha incrível, Ana! Me deu ainda mais vontade de lê-lo


Dani 05/01/2022minha estante
Ana esse livro é tudo isso messssssmo!!! Maravilhoso
Acho q foi um dos meus preferidos de 2021 tbm


Ana Sá 05/01/2022minha estante
Eu me empolguei na resenha, então se vocês não gostarem do livro, podem voltar pra reclamar aqui no meu Procon!! ?


Ana Sá 05/01/2022minha estante
Ana, você mudou o olhar que eu tinha da capa!! ?

Dani, eu falo pra Kênia que vocês leem livros maravilhosos no clube de vocês!! Eu vou na esteira do skoob de vocês duas!!

Obrigada Paloma, Julia (que linda na foto) e João! Me animei pra escrever sobre o livro, fico feliz de vocês terem gostado!

Luciana e Paloma, voltem aqui pra me contar quando lerem!!!


Julia Mendes 06/01/2022minha estante
??


Pablo Paz 07/01/2022minha estante
Ana, tua resenha está à altura da obra. Feliz 2022!? ?


Ana Sá 07/01/2022minha estante
Pablo, feliz 2022!! ?


dani 08/01/2022minha estante
Amei a resenha! O título do livro me chamou a atenção e já coloquei na minha lista há um tempo. Agora fiquei com vontade de ler imediatamente.


MelQuezado 05/07/2022minha estante
Uau, que resenha.. tipo, uau


Ana Sá 05/07/2022minha estante
Obrigada, Melissa! ??




Pablo Paz 07/09/2021

Comprei pela capa e me surpreendi
Quando comprei esse livro, sabia nada dele, da autora, muito menos de que ganhou um prêmio importante na Grã-Bretanha. Quando uma capa me agrada, tenho esse hábito de não pesquisar sobre o livro para não desistir. E lê-lo foi uma surpresa! A história, caleidoscópica, gira em torno das questões afetivas e existenciais de um grupo de amigas londrinas, artistas de vanguarda e negras em sua maioria, e das pessoas que têm alguma importância em suas vidas. E a FORMA caleidoscópica como essa autora inglesa escreve é deliciosa. É prosa poética em forma de romance. Se você já leu o best-seller nacional chamado 'peso do pássaro morto' (esqueci o nome da autora) e gostou da FORMA, adorará este 'Garota, Mulher, Outras' ainda mais do que aquele.
Ana Sá 07/09/2021minha estante
Muita gente falando bem! Comprei há pouco... Estou curiosa!

Obs.: o livro é da Aline Bei rs


Pablo Paz 07/09/2021minha estante
Ah menina tu vais adorar. Aline Bei, isso mesmo ahahah.


Paloma 08/09/2021minha estante
Foi uma das melhores leituras de 2020. Perfeito!


Pablo Paz 08/09/2021minha estante
Pra mim também, Paloma ?




Montenegro 12/07/2021

Muito prazer, Bernardine Evaristo!
Estilo narrativo inovador. Garota, Mulher, Outras é hábil ao abordar o diálogo entre gerações. Doze personagens, imigrantes ou descendentes de imigrantes de países africanos e caribenhos, mostram a sociedade diversa, plural e cheia de contradições. Super recomendo!
Paloma 12/07/2021minha estante
Que bom que gostou! Favoritei, pois perfeito.
Tem uma entrevista dela aqui no YouTube quando ela participou da Flip ano passado.


Montenegro 12/07/2021minha estante
Adorei! Vou buscar a entrevista e outras publicações dela. Valeu!




Lauraa Machado 16/06/2021

Um tesouro em forma de livro
Esse livro é de longe um dos melhores que eu já li. Antes de chegar na metade, já saí recomendando para todo mundo que conheço, já pensei em algumas pessoas para quem quero dar de presente e já tinha entrado para os meus favoritos. Não é um livro, é um tesouro, e eu ainda estou tentando entender como é possível que uma única pessoa tenha escrito essa história! É por autores assim, com essa capacidade de criar e desenvolver personagens tão diversos, essa de absorver e entregar tanta humanidade em algumas frases, em poucas páginas, que eu amo ler. São livros como esse que me provam que nada no mundo é melhor do que ler.

Eu realmente poderia parar minha resenha aqui, mas acho válido explicar um pouco mais sobre o livro, porque já percebi a tendência que existe de generalizar a sinopse, o que eu acho que acaba afastando leitores e fazendo-os acreditarem que o livro é bom demais para eles, inteligente e superior demais. Talvez esse seja, mas também acho que todo mundo deveria ler, então quero ajudar.

O livro é separado em cinco capítulos. Durante os quatro primeiros, a autora separa eles entre três personagens (na maioria mulher e negra) diferentes e conta um pouco de sua história, da história de sua família em verso livre. As personagens têm quase todas uma conexão entre si, ainda que só fique clara mais para o final, e são todas tão diversificadas, de tantos lugares, países e orientações diferentes, que aí é que está a verdadeira riqueza do livro. São tantas opiniões, vozes e atitudes, cada uma tão complexa e única, nem sempre boa ou ruim, que eu achei bem difícil escolher a mais importante, a mais impactante, a que mais me agradou. Realmente me senti lendo partes da vida de pessoas reais e não consigo ainda entender como que foi uma única escritora que criou todas elas!

Eu queria poder falar mais, mas acho que descobrir a história de cada uma e como elas se conectam é mais interessante sem outras informações. Mas queria dizer também que esse livro faz uma conexão entre gerações que chegam até os dias de hoje e tem uma revelação logo no final que me deixou inconformada, feliz e ainda mais intrigada! Além de ter outras nem tão boas, nem sempre certas e agradáveis, bem humanas e complexas mesmo.

Já falei que esse livro é excelente? Cheguei ao final com vontade de reler, de fazer um TCC sobre ele, de estudar e analisar cada personagem e depois fazer uma apresentação sobre elas. É do tipo de livro que me dá orgulho e gosto e que todo mundo deveria ler!
Chris 16/06/2021minha estante
Só 5 capítulos??? ?


Lauraa Machado 16/06/2021minha estante
São mais de 400 páginas, tá? É que cada capítulo é separado em mais três partes e cada parte é separada também por números




Margô 31/05/2021

O inédito é TUDO!
Escolhi esta obra pra ler, pela bela capa, e um título nada comum. Às cegas.
Jamais tinha ouvido falar de Bernardine Evaristo, e antes de saber da sua origem, achei que fosse caribenha ou angolana. Ela é anglo-nigeriana.
Pois bem. A escrita é experimental, não tem pontos! ( Isso mesmo...ponto parágrafos e final estão fora do texto). Leia como estivesse falando e respirando, que tudo se estrutura naturalmente.

Cada capítulo é uma personagem e sua história. Quase todas personagens são mulheres e negras, (99%). As histórias se cruzam, como uma rede hipnótica. Quem um dia esteve no teatro vendo uma peça da protagonista Anna, é uma mulher que lê sobre Dominique que é ex-namorada de Anna, e as conhecem pela mídia...

E assim, cruzando histórias, a autora aborda assuntos poucos traduzidos pra o mundo literário, ( pelo menos de forma tão assertiva!), como o universo "trans", lésbicas, gays, racismo, adoção, órfãos, arte, moradia, família, velhice, etc...

Tudo isso é tão bem ilustrado, tão bem trabalhado, que você não lê o livro, você traça cada página com um Interesse revigorado!!!!
Cada caso te lembra uma história familiar. E com certeza você se encontra em uma das personagens, apesar de culturalmente estarmos bem distantes. O cenário do romance é Londres, ora EUA, ora Escócia, ora Nigéria...rss.

A migração está tão presente quanto a questão do gênero, ou a educação, até as linhas filosóficas dos envolvidos são apresentadas com ares de excelência, nas quase 500 folhas.
É um seriado... daqueles que você maratona, e fica extremamente aborrecida por quê não tem a segunda temporada.
É isso. (Sem spoiler.)

Surpreendente!!!
Livia.Sena 31/05/2021minha estante
Que resenha espetacular! Tem uns 3 meses que aguardo o momento de mergulhar nessa leitura, está perto!


Margô 01/06/2021minha estante
Obrigada Lívia...??? Foi mais uma ode à Bernardine Evaristo...rsss. Você vai se apaixonar!




JosAtomoedajp 28/03/2024

Isso é mais do que um livro, é uma experiência. Essa obra prima te prende desde o início com personagens e trama que são a pura realidade do século XXI de quem não está num mundo parado no século XVI. Bernardine Evaristo é mais do que uma gênia, é dona de uma capacidade brilhante de criação que encanta o leitor. Que obra prima.
Mano Beto 29/03/2024minha estante
Interessante. coloquei na lista




@wesleisalgado 26/09/2022

Quando vi que a escrita do livro era lírica por meio de frases soltas, confesso que fiquei com um pé atrás. Porém, minha preocupação se provou infundada, a forma só dá ainda mais identidade as histórias ali retratadas.

Através de seis partes, salvo engano, conhecemos a história de uma gama de mulheres negras do Reino Unido contemporâneo, talvez umas 12 personagens. As histórias se cruzam e complementam formando um caleidoscópio gigantesco, em cada narrativa a dona da história tomando o papel principal para si e narrando em primeira pessoa.

Paralelo aqui com o ótimo A MULHER REI, Viola Davi dizendo em entrevistas que esse filme é seu Magnum Opus , e a peça teatral de Amma, personagem de que dá início ao livro, sendo também sua obra de maior importância.

Os panos de fundo de cada história são os mais diversos, ancestralidade, pertencimento, religiosidade, sexualidade, racismo, redenção sendo covardia tentar resumir cada um aqui, porque tudo ali é absurdamente mais abrangente e tangível. Acredito que esse livro é/será o próprio Magnum Opus da Bernardine Evaristo.

Delírios de um pobre nerd: durante toda a leitura fiquei imaginando/desejando a adaptação do livro em uma série limitada de 10 episódios pela HBO, com Viola Davis como Amma, óbvio, com a Michaela Coel (Megan/Morgan por favor), Lupita Nyong'o, Keke Palmer e Zendaya facilmente sendo a Yazz. Seria pedir muito ao universo??
Mari Pereira 27/09/2022minha estante
Adorei os delírios!




Bookster Pedro Pacifico 10/03/2024

Garota, mulher, outras - de Bernardine Evaristo
Mulheres com diferentes histórias e que compartilham a raça. São mulheres negras que enfrentam as mais diferentes dificuldades. De jovens a senhoras. Problemas de relacionamento, sexualidade, medos, saudades e decepções. Mas, por outro lado, também tem emoção e felicidades.

Em um romance extremamente atual, Bernardine Evaristo constrói capítulos que levam o nome de suas protagonistas. E, muitas vezes, de forma inesperada, essas vidas se conectam. O cenário é Londres e temas atuais como Brexit, relacionamentos não monogâmicos e gênero neutro revelam uma cidade que está na liderança dos movimentos. Mas o contraste entre gerações também não passa despercebido.

A autora é muito talentosa em suas palavras e se vale até de um estilo mais experimental: não há pontos finais nos parágrafos. O ritmo acelera e a vontade é conhecer qual nova protagonista Evaristo poderá criar. Aos poucos, você se acostuma e até se pergunta se aquele ponto final teria alguma utilidade maior

A inventividade e potência da autora lhe garantiu o Booker Prize de 2019. Bernardino me fez rir, me emocionar, sentir raiva e até estranhamento pelo que me é novo. A gente aprende com essas mulheres e termina com a vontade de mergulhar mais em suas vidas. Agora é conhecer mais da autora em suas outras obras.

Uma leitura excelente e que nos mostra como a literatura nos coloca diante das diferenças e é com esse contato que a gente aprende tanto. Leiam e não tenham medo do novo.

Nota 10/10

Para mais resenhas, acesse o @book.ster no Instagram.

Post: https://www.instagram.com/p/C4RP58wRO0_/
Site: https://booksterpp.com.br/
Jamile157 11/03/2024minha estante
Estou com ele aqui para ler, agora a vontade só aumentou. Vou ler logooo.




Karoline67 10/02/2021

Um dos melhores livros da vida
Chega uma fase da vida de quem lê demais que fica difícil se impressionar, emocionar ou se deter com qualquer coisa. E eu vinha nessa dificuldade até esbarrar em Bernardine Evaristo. Que livro de tirar o fôlego! Emocionante, extasiante, incrível. É grande, mas você não está nem aí, só quer consumir mais e mais das narrativas dessas mulheres, cada vez mais distintas entre si mas ao mesmo tempo conectadas num país tão racista como a Inglaterra. Impactada com o poder de prosa da autora, que tem um jeito bem particular de escrever e estruturar o texto e que ainda assim é perfeito. Nenhum defeito nesse livro, ele somente é necessário!!!
Margô 21/05/2021minha estante
Estou lendo... gostando muito!




Alexandre Kovacs / Mundo de K 09/11/2020

Bernardine Evaristo - Garota, mulher, outras
Editora Companhia das Letras - 496 Páginas - Tradução de Camila von Holdefer - Capa: Estúdio Daó - Lançamento no Brasil: 13/10/2020

A anglo-nigeriana Bernardine Evaristo se tornou a primeira mulher negra a ganhar o prestigiado Booker Prize em 2019 com este romance, dividindo o prêmio com a canadense Margaret Atwood, uma decisão que só havia ocorrido duas vezes desde a criação do Booker em 1969, a primeira em 1974 (Nadine Gordimer / Stanley Middleton) e a segunda em 1992 (Michael Ondaatje / Barry Unsworth). O livro, que foi muito elogiado pela crítica internacional, narra a história de 12 personagens dos séculos XX e XXI, a maior parte das quais são mulheres negras vivendo no Reino Unido, mas isso é pouco para entender a genialidade desta obra, muito além do que apenas um bom romance.

O texto é curiosamente editado em versos livres, sem pontuação, uma técnica peculiar logo assimilada pelo leitor que, antes do que possa perceber, estará lendo compulsivamente sem querer largar o livro, contudo este também é apenas mais um detalhe original da autora. A verdadeira engenhosidade do romance consiste em contar uma história que se desdobra em muitas outras, oferecendo múltiplos pontos de vista e fazendo com que as personagens dividam o protagonismo ao longo da narrativa, além de interagir entre si, complementando ou contrariando a perspectiva inicial que se possa ter tido sobre elas. A polifonia narrativa é ainda mais enriquecida pelas diferenças de idade (variando de 19 a 93 anos), herança cultural, classe social e orientação sexual das personagens.

A estrutura se divide em quatro partes principais – além de mais dois capítulos finais que esclarecem algumas conexões –, sendo que cada uma dessas partes desenvolve um grupo de três personagens. Na primeira, o foco é mais contemporâneo com a narrativa centrada em Amma, Yazz e Dominique. Amma é uma dramaturga na casa dos cinquenta, lésbica, e que está vivenciando o dia de estreia de sua peça no National Theatre. Ela sempre trabalhou à margem do circuito oficial e, portanto, é questionada pelo sucesso. Yazz é sua filha, concebida por inseminação artificial, uma verdadeira força da natureza, feminista, sempre questionando os pais e o tratamento da sociedade em relação às minorias. Dominique é a melhor amiga e ex-sócia de Amma na companhia de teatro alternativa que criaram na juventude, ela se mudou para os Estados Unidos envolvida em um relacionamento tóxico.

Na segunda parte, o núcleo de personagens é formado por Carole, Bummi e La Tisha. Carole foi vítima de estupro aos treze anos, depois de uma festa na casa da amiga La Tisha, e este trauma provocou um comportamento compulsivo para conquistar o sucesso na carreira e a necessidade de superação, fazendo com que ela obtivesse notas estupendas no ensino médio e fosse admitida na Universidade de Oxford. Bummi, a sua mãe, luta para manter as tradições culturais da família, ela emigrou da Nigéria depois que o marido morreu em um acidente ao refinar diesel em casa de forma ilegal, "enquanto milhões de barris de petróleo eram sugados a milhares de metros de profundidade na terra pelas furadeiras gigantescas das companhias petrolíferas a fim de fornecer energia preciosa para o resto do planeta". La Tisha, amiga de infância de Carole, acabou se tornando mãe solteira antes de completar vinte e um anos, com três filhos de pais diferentes, até se equilibrar, trabalhando como gerente de um supermercado.

Shirley, Winsome e Penelope, dividem a terceira parte do romance. Shirley sempre trabalhou como professora em uma escola localizada em Peckham, uma região de Londres com muitos imigrantes. Ela era conhecida pelos alunos (inclusive Carole e La Tisha do capítulo anterior) como "Cara de Cu" e teve seu idealismo desmontado ao longo dos anos devido às crises do setor de ensino, tornando-se uma mulher autoritária e ressentida. Winsome, sua mãe, uma imigrante do Caribe, esconde um caso tórrido que manteve com o genro Lennox no passado e Penelope é a única das doze personagens que é branca, colega de trabalho de Shirley. Ela tem um histórico de alcoolismo devido à frustração e crise de identidade por ter sido adotada e não saber nada sobre os seus pais biológicos.

Na quarta parte, ficamos conhecendo Megan (que se transformou em Morgan), Hattie e Grace. Megan preferia usar calças quando criança e uma vez destroçou a sua coleção de Barbies, cortando o cabelo das bonecas, arrancando os olhos e mutilando algumas. Depois de passar por muitos problemas na adolescência, ela (ou "elu" como prefere ser referenciada) se apaixona por Bibi que transicionou de gênero para ter estrogênio, seios e vagina. Megan, por sua vez, quer uma "existência não binária" e se identifica como "gênero neutro", considerando que tem "várias alternativas à disposição" e muda o próprio nome para Morgan. Já Hattie, chamada pela família de GG, é a bisavó de 93 anos que sempre morou em uma fazenda no norte do país e aceita sem restrições as escolhas de Megan/Morgan, diferente do restante da família. Hattie guarda um segredo da sua juventude, uma filha bastarda rejeitada pelos pais. Finalmente, chegamos até Grace, mãe de Hattie, que se casou com um homem branco, herdeiro da fazenda Green Fields, depois da Segunda Grande Guerra, origem das futuras gerações.

Um livro difícil de resenhar devido às dezenas de personagens bem construídas e convincentes, assim como histórias de forte apelo humanista e diferentes pontos de vista que se conectam ao longo de quase quinhentas páginas, apresentando um grande e rico painel sobre a formação e a atualidade da sociedade do Reino Unido pós-Brexit e a luta contra o machismo e racismo. Certamente Garota, mulher, outras é um dos melhores lançamentos do ano.

Sobre a autora: Bernardine Evaristo é uma premiada escritora anglo-nigeriana, autora de obras de ficção, ficção em versos, ensaios, poemas, teatro e crítica literária. É professora de escrita criativa na Universidade de Brunel, em Londres, e vice-presidente da Royal Society of Literature. Garota, mulher, outras é seu oitavo livro. Bernardine Evaristo foi escalada para abrir a edição de 2020 da Flip, agendada para os dias 3 e 6 de dezembro.
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Nataly Rocha 22/12/2020

Realmente tudo que falam
O livro realmente é tudo que falam dele mesmo... envolvente, inventivo. O livro conta a história de diferentes mulheres, todas negras, e relata a diversidade de experiências e resoluções da vida de cada uma. Em alguns momentos as histórias se misturam e você precisa estar atento a cada personagem, porque as vezes eu precisei retomar. Mas a leitura é envolvente, as personagens são complexas e é impossível não terminar adorando cada uma delas!
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Carina 14/01/2021

O romance de Bernardine, escrito de forma experimental, é uma leitura impactante que te envolve do início ao fim. O livro aborda uma série de questões relativas a classe, gênero, raça e sexualidade expondo o leitor a vivências e pontos de vistas muito diversos. Uma das grandes qualidades do livro é que todas as personagens (com suas complexidades) enfrentam grandes dificuldades, mas a autora não segue uma sequência de desgraças, são pessoas que triunfam.
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lacklusterstarchild 25/04/2024

Uma Antíntese À História Única
Nesse dinâmico romance escrito em versos, Bernadine Evaristo inova as fomas como mulheres negras são representadas na tradição literária de maneira plural e belíssima. Sua escrita acessível tirou o meu receio de ser um livro denso (por ter quase 500 páginas) e fiquei surpresa quando percebi o quão rápido me envolvi pela narrativa.

Essa obra reconta a vida diversas mulheres negras - em sua maioria - que cresceram na Englaterra em diversos períodos e localidades, cada uma com sua própria origem, tom de pele, criação, sexualidade, classe, fé, traumas, personalidade, vício, estilo, política diferentes. Impressionante como, em somente 40 páginas, a autora captura a vida inteira de uma das personagens com uma voz tão distinta para representar cada uma. Desde órfãs do séc XIX até a geração Z, entre imigrantes e ascendentes, Evaristo faz espaço para seus personagens falarem por si mesmos e respirarem seu protagonismo.

Além disso, a escritora não se prende ao termo "mulher negra" já que retrata também a história de Morgan (uma pessoa não binarie) e Penelope - que é, em todos os aspectos menos o genético, uma mulher branca. E, assim, estabelece uma abordagem muito interessante sobre os mecanismos socias exercidos sobre indivíuos ditos como "inferiores", e o subsequente processo de individualização tomado por cada uma.
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Camila Faria 27/01/2021

A ideia central do romance, um dos mais comentados e aclamados de 2019, não me pareceu muito promissora/inovadora à princípio. 12 capítulos, cada um deles narrado por uma mulher diferente, com histórias que se conectam e se completam. A premissa me deixou sim um pouco cética, mas… que romance incrível! Um dos principais méritos da narrativa é a facilidade com que Evaristo salta de personagem em personagem, criando uma voz única e autêntica para cada uma delas. As histórias são interligadas de forma tão elegante, que recuperaram a minha esperança no estilo. Amma é a personagem central, uma dramaturga lésbica negra, cuja nova peça está sendo produzida no National Theatre em Londres ~ e é a partir da sua narrativa que o romance decola. São 12 mulheres cujas vidas se sobrepõem, mas cujas histórias não poderiam ser mais distintas. Evaristo é a primeira mulher negra a ganhar o Booker Prize (ela compartilhou o prêmio em 2019 com “Os Testamentos” de Margaret Atwood, a sequência de “O Conto da Aia”). Recomendo demais, especialmente se os temas identidade, privilégio, feminismo e experiência feminina negra estão no seu radar de interesse.

site: http://naomemandeflores.com/os-quatro-ultimos-livros-28/
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Sarah 28/01/2021

"Garota, mulher, outras", da escritora anglo-nigeriana Barnardine Evaristo, não é apenas um livro, mas vários dentro de uma capa única - que te fisga já nas primeiras páginas.

Explico: a obra narra as histórias de diferentes mulheres, todas negras, muitas lésbicas e imigrantes. E cada uma delas é descrita detalhadamente, com começo, meio e fim, apesar de se passar em apenas um curto espaço de tempo. Como a gerente do super mercado de bairro que antes de abrir a loja para mais um dia de vendas reflete sobre seu passado e como chegou até ali.

A narrativa é tão comovente a ponto de você se sentir um amigo próximo da personagem e lamentar o fim de sua história. Isso até ser conquistado por outra personagem.

Todas se entrelaçam em determinados momentos, apesar de os personagens não necessariamente se conhecerem.

E todas tratam das dificuldades de ser mulher, de ser negra, em alguns casos também da pobreza, em outros do preconceito ligado a sua sexualidade e às vezes sobre o processo de adaptação a uma nova cultura.

Evaristo explicou em entrevista que "esse é um romance que um homem branco não poderia ter escrito porque é a experiência que todas nós, mulheres negras, vivenciamos".

Outro ponto que chama a atenção no livro é a pontuação, ou melhor, a falta dela. Escrito em formato de prosa poética, não confunde o leitor, como temia, mas dá a cadência para o texto tantas vezes levado por sotaques dos imigrantes vindos de lugares como Caribe e África.

Não foi por acaso que a obra ganhou, além do aclamado prêmio Booker Prize em 2019, elogios fervorosos de pessoas como Barack Obama e Roxane Gay.

Apesar de ainda ser janeiro, já tenho certeza que será uma das minhas leituras preferidas deste ano.

site: www.instagram.com/invasoesgermanicas
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