Pris 20/03/2022Não é só fofocaEu peguei esse livro única e exclusivamente por ser escrito pela Sica, a verdade é essa. Mesmo eu amando K-pop, e ouvindo há mais de 10 anos, se não fosse um idol que eu gostasse escrevendo, provavelmente eu não ia me interessar em ler, então eu tinha poucas expectativas. No geral, eu esperava um livro divertido apenas e acabei surpreendida.
Shine é realmente divertido de ler, mas toca em pontos importantes de forma bem feita. Jessica é bem melhor escrevendo do que eu esperava, mesmo que sua escrita ainda precise evoluir bastante, para um primeiro romance, está bem melhor do que esperado, isso levando em consideração que esse livro é para um publico mais jovem, então não podemos esperar também algo mais complexo. E é nesse ponto que sinto que ela mais se destaca: em conseguir tocar em assuntos mais pesados, com uma escrita leve para um público jovem, sem soar como se tivesse simplificando demais ou dramatizando demais.
A falta da Sica vem principalmente em desenvolvimento de personagens. Enquanto alguns são muito profundos, com várias camadas, como a irmã da Rachel, Leah, ou a Mina, que é a inimica dela, outros são vazios e muito 2D, como as amigas da Rachel. Existe até uma tentativa do livro de criar um plot para as gêmeas, que fica completamente perdido tendo apenas 2-3 cenas durante as mais de 300+ páginas. No geral, a gente nem sabe nada direito sobre elas ou sobre a Akira, que em teoria é a melhor amiga da Rachel, o que torna complexo quanto o plot exige que a gente se importe com o rumo dessas amizades. Outra coisa é que muitas vezes assuntos aparecem, tem um certo destaque por algumas 10-20 páginas, e depois nem são citados novamente, como por exemplo, o interesse da Rachel por moda, que quando é citado parece super importante, mas esse interesse dura por 10 páginas, pois depois a Rachel nem pensa em nada relacionado a moda em momento nenhum.
Eu gosto da abordagem de K-pop, vindo de uma ex-idol, eu não sabia direito que esperar. Todo mundo que acompanha K-pop sabe o quanto essa indústria pode ser tóxica e o quanto é complicado, e a Sica consegue tocar muito nos pontos negativos. Ela fala das dietas insanas, o que é muito sutil, pois não existe uma conversa sobre distúrbios alimentares (mas a sementinha está plantada caso ela queira explorar isso mais para frente). Ela foca mais em falar da vida de trainee, o quanto é difícil, sobre escancarado machismo na indústria e sobre como as empresas ficam fazendo jogos de poder com as pessoas que fazem parte dela. O quanto esses trainees, e muitas vezes idols, não tem poder de escolha e nem controle sobre o que vai acontecer com eles, e como essa situação piora se você mulher e piora mais se você não vem de família rica. Se você gosta de k-pop, vai conseguir ver histórias de idols que você gosta nessas páginas.
Também tem a discussão de ser descendente coreana, mas nascida na America, que é muito interessante de ler, e me deixou até bem triste. A gente sabe que é complicado, mas ela consegue pontuar muito bem o quanto isso afeta os personagens. Tem uma personagem, uma das amigas da Rachel, que é japonesa, a Akira, e ela é tão pouco desenvolvida que a gente não consegue saber se a Akira para pelas mesmas coisas. Lembrando: elas deveriam ser MELHORES AMIGAS. E isso foi uma falta para mim.
A história do livro me surpreendeu também, tem um plot twist ali no final, nas últimas 100 páginas, que eu definitivamente não vi vindo, eu não estava esperando de verdade mesmo. Achei muito bem feito, achei que faz sentindo e gostei da conclusão que ela deu para a história. Tinha muito potencial para um final ruim, mas eu amei o final e me deixou querendo mais. Quero muito ler o segundo livro que sai esse ano, e ver a evolução da Sica como escritora.
E lembro de novo: se você, como eu, é mais velha, uma pessoa mais velha que staneia K-pop, lembre que o público alvo desse livro são pessoas de 13-14 anos e não espere uma complexidade além do que o livro se propõe a entregar.