Zelinha.Rossi 22/06/2021
Perturbador, mas brilhante
Em primeiro lugar, queria dizer que este livro foi, dos que li até hoje, aquele em que mais marquei citações. A escrita da autora é repleta de frases que nos levam a uma profunda reflexão, além de ser muito envolvente (não conseguia parar de ler). A personagem principal, Aglaia, é muito complexa. Sofrendo com problemas de autoestima (devido à obesidade, à falta de atenção do pai, aos bullyings sofridos na escola e à falta de amigos), Aglaia vê sua vida desmoronar com a chegada da meia-irmã Thalie, bela e que, sem aparentemente qualquer esforço, consegue cativar a todos. Aglaia me colocou em um dilema constante: em muitas vezes, suas atitudes movidas pelo ódio e pelo sentimento de "por que Thalie tem tudo e eu não tenho nada?" me chocaram e revoltaram profundamente; mas apesar disso, não consegui deixar de sentir muita compaixão por ela e de pensar se as coisas não poderiam ser diferentes se ela tivesse o amor do pai, se não sentisse que a vida da mãe girava totalmente em busca das migalhas do marido e se o amigo e amado Demian não a tivesse deixado de lado. Particularmente, me partiu o coração quando ela diz que "Até o último instante em que permaneceu ao meu lado, desejei com toda a intensidade do pensamento, que ele recuasse e me dissesse "Isso não parece certo, Aglaia, não estamos sendo justos com você. É ao nosso lado que deve ficar, vamos cuidar de você, filha", me abrisse os braços, me apertasse dentro deles e me levasse de volta para casa." O livro é perturbador principalmente por mostrar a luta constante da personagem contra a "Coisa", que nada mais é do que uma luta psicológica ferrenha com sua mente, ferida por tanta falta de amor ("Deveria existir uma lei dispondo sobre o amor para todos, com igualdade de forma e quantidade. Acho que isso facilitaria a vida das pessoas"). Por isso, em muitos momentos, o livro me deixou sufocada (outro motivo para que eu não parasse de ler - a vontade de acabar com aquele martírio rsrs). Para finalizar, seguem algumas das muitas brilhantes citações da obra:
"Um dia me disse, naquele discurso bonito de médico de almas, que não é o outro quem nos enloquece, tudo é uma questão de aceitação de si mesmo, e um dia, quando eu conseguisse acolher minha face mais sombria, mais imperfeita, mais bem oculta de mim, finalmente estaria livre para ser feliz."
"Se era para me esforçar em ser feliz, eu me esforçava... Ocorre que felicidade não era algo de se ter por esforço, pois ele, em si, já afastava a possibilidade do sentimento."
"Descobri que é preciso estocar no coração uma porção generosa de amor azul, fazer uma reserva para tempos de amor sombrio, de amor que machuca, enlouquece e mata."
"Naquele instante pensei que talvez fossem os medos que enlouquecessem as pessoas, e que fosse para escapar deles que elas se retiravam de si mesmas."
"Há muitos anos digo aos médicos que podemos escapar de lugares, pessoas, situações, mas não de nós mesmos."