Rafael 10/05/2022
Por justiça racial
Para compreender como se dá a reprodução das desigualdades raciais nas relações de trabalho no interior das organizações, Maria Aparecida Bento analisou os discursos adotados por chefes e profissionais de recursos humanos de duas prefeituras do sudeste brasileiro. Esse trabalho resultou na tese de doutorado intitulada "Pactos narcísicos no racismo: branquitude e poder nas organizações empresariais e no poder público", defendida na USP em 2002.
Após 20 anos, ganhou atenção especial, como livro, uma categoria importante para os estudos étnico-raciais e bem desenvolvida pela autora, ao longo de sua trajetória acadêmica: "O pacto da branquitude".
De acordo com Cida Bento, as relações entre brancos e negros, no Brasil, é historicamente caracterizada pela dominação de um grupo sobre o outro, sendo possível observar em diferentes áreas (econômica, política e social), uma estrutura que assegura aos brancos privilégios simbólicos e materiais, e que relega aos negros péssimas condições de trabalho, de vida, e até a morte (p. 15).
A construção da branquitude, da identidade racial branca enquanto expressão de superioridade e do que é universal (p. 91), se verifica a partir da colonização europeia das Américas, com a inauguração de um sistema econômico que ligou raça, terra e divisão do trabalho (p. 36).
Sempre em readaptação, esse capitalismo racial continuou a produzir seus efeitos (p. 41) por meio de um pacto não verbalizado, um acordo tácito em que se buscar garantir às novas gerações, como se fosse mérito exclusivo dela (p. 21), tudo que foi acumulado, de modo a fortalecer seu lugar de privilégio e a excluir outros grupos (p. 25).
Ora, ?É evidente que brancos não promovem reuniões secretas às cinco da manhã para definir como vão manter seus privilégios e excluir os negros. Mas é como se assim fosse: as formas de exclusão e de manutenção de privilégios nos mais diferentes tipos de instituições são similares e sistematicamente negadas ou silenciadas? (p. 18).
Independentemente da intenção que as institiuções tenham de discriminar, são as desigualdades nelas verificadas, através de dados concretos e estatísticas, que confirmam sua manifestação de racismo (p. 77).
Para a mudança desse cenário, em favor da justiça racial, da construção de um estado de bem-estar social substantivo, Cida Bento indica como uma das medidas essenciais a adoção de políticas que tornem as instituições verdadeiramente plurais, como o implemento de cotas e o fomento de programas públicos de financiamento, práticas cujos impactos positivos já foram reconhecidos (p. 110-111).