Barbara.Raulino
01/08/2022A escrita como resgate de siEm Caderno Proibido, conhecemos Valeria Cossati, uma mulher de 43 anos na Roma dos anos 50 e que leva uma vida submissa nos papéis de esposa, mãe e filha. Há anos ela não ouve o próprio nome — o marido só a chama de “mamãe”. Em um domingo, ela sai para buscar cigarros para ele, e acaba comprando ilegalmente um caderno – um item que não poderia ser comercializado aos domingos, e faz dele seu diário proibido.
No caderno, ela começa a “passar coisas a limpo como quem remexe as gavetas”, passando a enxergar com outros olhos o marido, os filhos, as amigas, os colegas, a vida cotidiana e, principalmente, a si mesma. A escrita passa a ter uma função de resgate de si, conforme ela se depara com seus pensamentos mais íntimos e que, até então, ela nem sabia que existiam. A escrita ganha uma força incontrolável, a conduzindo por um caminho que, uma vez iniciado, não pode mais ser interrompido. É difícil não pensar em um processo de análise, onde ao associarmos livremente, nos deparamos com o que temos de mais íntimo e (des)conhecido.
“Quanto mais me conheço, mais me perco” diz Valéria, deixando claro que o processo de escrita a leva a um conhecimento e desconhecimento de si. O processo (de escrita/análise) é árduo, pelo encontro com o “proibido”, com o desconhecido, com o, até então, indizível; mas ao mesmo tempo é bonito e libertador, já que produz novos caminhos internos – o que fica evidente ao acompanharmos Valéria, em toda a sua complexidade.
O livro aborda temas caros, como as questões de gênero e classe, as questões sociais, o pós guerra, as relações familiares e a relação mãe e filha. Os diálogos entre ela e a filha Mirela são fortíssimos e é difícil não se comover com os impactos dessa relação, com a distância entre as gerações e os desencontros que isso produz.
Alba de Céspedes (na segunda foto) é referência pra Elena Ferrante e é difícil não encontrar semelhanças entre duas. Recomendo muito, muito. Uma das melhores leituras que fiz esse ano, certamente.
"Aprender a compreender as coisas mínimas que acontecem todos os dias talvez seja aprender a compreender realmente o significado mais recôndito da vida."
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