LER ETERNO PRAZER 29/10/2021
"Duplo foi o segundo romance de Fiódor Dostoiévski, publicado apenas duas semanas após o lançamento de Gente pobre, foi um romance que não agradou muito ao público que havia absorvido bem até demais ao primeiro.
Talvez por "O duplo" ser uma obra onde seu enredo, posso dizer bem estranho!
Aqui nós vamos acompanhar as estranhezas de Golyádkin, um simples funcionário público Russo. Iniciamos com nosso protagonista se preparando para ir a um jantar na casa do chefe do departamento público onde trabalha. Com dinheiro no bolso se emperequeta todo, aluga uma carruagem e parte em passeio por São Petersburgo acompanhado de seu criado, Pietruchka. Mas antes resolve dar uma passada no consultório de seu médico e confiar ao doutor seus medos: a falta de jeito para falar que lhe atormenta e atrapalha a vida. O remédio, segundo o doutor, é sair, se divertir, se entreter. Coisa que Golyádkin pretende fazer nessa noite.
Dostoievski se refere sempre a Golyádkin, como "nosso herói" mas vi que no caso aqui iremos nos depara com um herói trágico. Golyádkin não esperava por tudo que ia lhe acontecer a partir de sua chegada ao jantar, ele é barrado na entrada do jantar, mas mesmo assim consegui entra de penetra, e se aproximar de Clara Olsúfievna, a aniversariante por quem é apaixonado. Mas a falta de jeito é claro, o impede de conseguir manter qualquer diálogo coerente com a moça, e depois de uma tentativa brusca de tirá-la para dançar, Golyádkin é afastado dela e expulso da casa na frente de toda a sociedade de São Petersburgo, de todos os funcionários importantes de seu departamento. A humilhação toma conta do protagonista, e é nesse momento que o senhor Golyádkin não só queria fugir de si mesmo, mas deixar-se destruir completamente, virar pó, sumir. Só que ao contrário desse desejo, porém, ele se duplica. E e aí que nossa história se enche de "estranheza". Nosso narrado se divide em dois, ou melhor "nosso herói" fantasia que dele sai um outro homem, alguém idêntico a ele, com o mesmo rosto e as mesmas roupas, uma pessoa que se dirige para o mesmo lugar para onde ele vai, sua casa. No dia seguinte, quando toma a decisão de aparecer no trabalho apesar de toda a vergonha do ocorrido no jantar, é o segundo Golyádkin, seu duplo, quem ele encontra no departamento. Um funcionário novo, abaixo de sua posição, com quem terá que dividir o nome e a mesa. Apesar de nervoso e confuso, o ?nosso herói? acolhe esse duplo, oferece sua casa para que ele descanse após o trabalho, ouve sua história e se compadece com ela.
Mas esse acolhimento dura pouco, mais especificamente até o momento em que o protagonista começa a notar os planos de seu duplo. O segundo Golyádkin é bem mais comunicativo e desinibido do que seu original, e é justamente por isso que ele consegue bajular e agradar aos seus superiores no departamento. Coisas que o original tem dificuldade em externar e fazer, o duplo o faz com maestria, e em pouco tempo se coloca dentro desse círculo até então fechado para o protagonista.
"O duplo" não é tão tranquilo de ler, isso porque a narrativa se concentra toda na confusão de pensamentos e atitudes de Golyádkin. Há momentos confusos, onde um fala e em segui vem o outro, você precisa estar bem atento para distinguir as nuances de cada um. Mas, mesmo sendo um livro bem diferente de sua primeira publicação, Dostoievski se mantém fiel ao seu estilo e a forma de criar seus personagens, Dostoiévski trabalha com personagens miseráveis, humilhadas, pobres, com poucas perspectivas de uma vida melhor. Golyádkin é uma personagem que, talvez, poderia ascender na vida, não fosse sua loucura e mediocridade como pessoa. Seu "duplo" nada mais é do que uma projeção do que ele gostaria de ser: desenvolto, bonito, falante, persuasivo. E é justamente esse desejo de ser diferente ? retratado pelo seu duplo ? que o leva para mais fundo nesse poço e o afoga em paranóias.
Se você conseguir penetrar no fundo do nosso Golyádkin irá ver que todo o desespero que ele desenvolve só cresce a cada página, você sabe que qualquer esperança que ele possa alimentar é uma fantasia ingênua, porque não há outra saída para ele além de um fim trágico.
"O duplo" um livro complicadinho de se ler, mas com toda a qualidade Dostoievskiana de sempre.