Carla.Parreira 25/10/2023
A morte e a morte de Quincas Berro D?Agua
A história parece uma piada. Quincas é um sujeito que resolveu abandonar a vida certinha, saiu de casa deixando para trás a esposa e filha, e foi ?curtir a vida? como um boêmio mulherengo. Quando ele morre, é motivo de vergonha para os familiares e seu corpo acaba sendo levado pelos amigos dos bares e das ruas. No final ele, ou melhor, seu corpo falecido, é tragado pelo mar. Eis alguns trechos: ?...Era o cadáver de Quincas Berro D?água, cachaceiro, debochado e jogador, sem família, sem lar, sem flores e sem rezas. Não era Joaquim Soares da Cunha, correto funcionário da mesa de Rendas Estadual, aposentado após vinte e cinco anos de bons e leais serviços, esposo modelar a quem todos tiravam o chapéu e apertavam a mão. Como pode um homem, aos cinquenta anos, abandonar a família, a casa, os hábitos de toda uma vida, os conhecidos antigos, para vagabundear pelas ruas, beber nos botequins baratos, frequentar o meretrício, viver sujo e barbado, morar em infame pocilga, dormir em um catre miserável?... Vanda pensara levar o cadáver para casa, realizar o velório na sala, oferecendo café, licor e bolinhos aos presentes, durante a noite. Chamar padre Roque para a encomendação do corpo. Realizar o enterro pela manhã cedo, de tal maneira que pudesse vir muita gente, colegas de Repartição, velhos conhecidos, amigos da família. Leonardo opusera-se. Para quê levar o defunto para casa? Para quê convidar vizinhos e amigos, incomodar um bocado de gente? Só para que todos eles ficassem recordando as loucuras do finado, sua vida inconfessável dos últimos anos, para expor a vergonha da família ante todo mundo?... Só ia dar trabalho, despesa e aborrecimento. O melhor era enterrar Quincas o mais discretamente possível, comunicar depois o fato aos amigos, convidá-los para a missa de sétimo dia. Assim ficou acertado...?