spoiler visualizarVictor222 07/06/2023
Resenha Quatro Amores
Antes de adentrar naqueles que serão definidos como os "Quatro Amores", o autor faz uma breve introdução fazendo divisão do que seria amor, em algumas partes, sendo a primeira o amor doação, que é o esforço voluntário para entregar algo para uma ou mais pessoas que amamos, podendo ser exemplificado pelo Julius, pai do Chris, da série "Todo Mundo Odeia o Chris". Ele tem pouco tempo com a família mas isso justifica-se pois está sempre trabalhando buscando formas de prover tudo que a família precisa, não só pela obrigação enquanto pai e marido mas por amor aos seus filhos e esposa, ou seja, ele se doa pelos seus.
Uma segunda parte é o amor necessidade, que de forma bem simples pode ser entendida como nossa necessidade de nos sentirmos amados. Segundo C.S.Lewis a ausência desse amor é marca de egoísmo pois gera a enganosa sensação de absoluta independência do corpo e ao mesmo constata uma vida espiritual ruim, já que expressa um desconhecimento da necessidade de ter humildade para se colocar no papel de buscar a Deus.
Por último, é citado o amor apreciativo, que é a contemplação da pessoa amada. É o desejo não por uma pessoa mas por uma mulher ou homem bem específicos que ocupam nossos pensamentos na maior parte do tempo. Na verdade, não só ocupam espaço mas são contemplados dentro da nossa mente, de um jeito que só uma pessoa imersa em uma intensa paixão acaba se submetendo. Essa definição também é usada para conceituar o Eros, que é um dos Quatro Amores que o autor se debruça em explorar.
Avançando na temática, o autor aborda a questão da proximidade de Deus, e como ela também deve ser dividida, tendo a proximidade por semelhança que consiste nas características provenientes diretamente da natureza de Deus por somos feitos à imagem dEle; e a proximidade por abordagem que como o próprio nome diz, consiste em Deus literalmente nos abordar e nos fazer filhos. É o "sermos alcançados pela graça".
Um apontamento paralelo feito pelo autor, antes de apresentar a definição de outros termos e que julguei importante expor é que Deus é amor mas nem todo amor provém de Deus. Essa afirmação é facilmente comprovada por uma rápida avaliação de nós mesmos, que constantemente somos encontrados amando mais a criação do que o Criador. Esse amor se disfarça de puro e nobre, como se fosse aceitável e tivesse procedência divina, até chegar ao ponto onde dedicamos fidelidade que só caberia a Deus, e isso transforma o que era um puro e inocente amor em "demônios" que nos destroem. Por isso, o autor afirma que os amores humanos devem ser reflexo do amor divino. Nada mais ou menos do que isso.
Retomando a definir termos, o autor traz agora a questão dos prazeres, onde o prazer necessário é aquele que só é prazer quando há uma necessidade básica humana, como o prazer em beber água quando se está com sede, já o prazer de apreciação é aquele que por si só, sempre constituirá um ato prazeroso como beber refrigerante gelado pelo prazer de beber algo de com bom gosto. Uma outra retomada feita pelo autor é acerca do amor necessidade, afirmando que quando ele é de indivíduo com indivíduo é finito, pois acaba junto com a necessidade que fez nascer o amor; enquanto o Amor Necessidade por Deus está em posição diferente, pois a necessidade é infinita e o amor necessidade só morre se o indivíduo perder o entendimento de que é NECESSIDADE e não algo por mero prazer momentâneo.
O primeiro dos quatro amores abordados pelo autor é a afeição, delineada como sendo um amor necessidade que precisa dar e um amor doação que quer ser recebido. Sendo o amor que menos exige para ser concretizado já que não demanda grandes qualidades daqueles que são afeiçoados. O feio se afeiçoa com o bonito, o inteligente com o burro, o rico com pobre, o crente com o ateu, ou seja, pessoas "heterogêneas" se afeiçoam umas às outras. A afeição é sentida por alguém que está sempre presente em algum contexto da nossa vida mas que ao mesmo tempo, não tivemos qualquer apreço no primeiro contato.
Ainda sobre afeição mas entrando em uma espécie de submundo da mesma, o autor fala que nossa necessidade de sentir-se indispensável nos leva a manter pessoas em estado de carência permanente ou criando necessidades irreais para que a dependência exista. O indivíduo deseja o bem mas apenas o bem que ele pode dar. Talvez você esteja lendo e pensando: eu não seria capaz disso. Não só é capaz como pode ter feito ou está fazendo de um jeito que parece muito inocente, sabe como? Sendo "pai ou mãe" de pet. A maioria dá a desculpa que adotou o cachorro por ser fofo ou por ter sido abandonado e outras mil e outras desculpas mas a verdadeira questão é que gostamos da sensação de ter um ser dependente de nós. Pássaros foram feitos para voar mas colocamos na gaiola ou treinamos para não fugir, em troca o coitado do bicho vai passar a vida dependente de um humano para prover água e alimentos, a mesma coisa com outros animais silvestres e até mesmo com aqueles que acostumamos a chamar de animais domésticos.
Para não encerrar o apontamento sobre afeição de forma negativa, C.S Lewis faz um contraponto, afirmando que é possível a afeição ser um amor com natureza saudável, desde que venha acompanhado de raciocínio, reciprocidade e decência.
O segundo dos quatro amores é a amizade, e sobre ela o autor inicia destacando que mantemos um padrão de comportamento diante a sociedade que naturalmente é desmanchado com a companhia dos nossos amigos. Para não ficar falando apenas da minha própria pessoa, cabe citar como exemplo disso os jovens da minha igreja, onde parte deles são sérios quando estão sozinhos ou com pessoas mais adultas e se desmancham completamente quando estão reunidos tornando-se integralmente bobos, por assim dizer.
Adentrando na temática, o autor afirma que homens com amigos fiéis são mais difíceis de ser corrigidos, corrompidos e dificilmente são subjugados pois a união dos mesmos os qualifica para reagir diante de grandes injustiças, ao ponto que grupo de amigos pode fechar-se ao mundo exterior tratando tudo que vêm de fora como passível de repressão e rejeição.
C.S. Lewis ainda trata da ocorrência da "transição da humildade individual para o orgulho corporativo", onde indivíduos são humildes perante os respectivos amigos mas de certo modo, tão orgulhosos da amizade, que passam a enxergar todos os demais como se estivessem em uma posição inferior. "Eu e meu grupo estamos aqui do alto observando sua insignificância, falta de conhecimento e demais virtudes. Por favor, não se aproxime."
Visando novamente não encerrar fazendo apontamento negativo sobre um dos quatro amores, o autor destaca que amizades são instrumento de Deus para que as qualidades que Ele deu aos seus filhos sejam expostas.
Desenvolvendo agora o tópico que aborda o Eros, o autor afirma ser essa a definição para o que sentimos quando estamos amando. Apesar de existir a correlação de tal definição com o ato sexual, C.S. Lewis afirma que isso pode até existir entre os dois apaixonados mas não é isso que é o combustível da relação, já que ela é dirigida por amor contemplativo onde o homem apaixonado só se atenta em pensar naquela mulher que ama e vice versa.
É apontado que o momento do sexo é quando homem e mulher dão menos ênfase em suas individualidades mas se colocam no papel de desempenhar e representar toda uma coletividade masculina e feminina respectivamente falando, buscando prazeres e desempenhos que uma coletividade disse ser o ideal. Baseado no que o autor expressa, entendo que poderíamos definir o eros como um "sentimento burro", já que ele cega apaixonados ao ponto de nem sequer cogitarem desistir de uma relação que já nasce sem qualquer perspectiva de ser bem bem sucedida. Divinamente insensível ao nosso egoísmo, ele é também demonicamente rebelde a qualquer reivindicação de Deus ou do homem que possam opor-se a ele.
O Eros é o amor mais propenso a nos exigir adoração, já que deixa o apaixonado sensível a idolatrar aquela a quem ama mas o autor afirma que o maior perigo não é idolatrar pessoas mas o próprio Eros, usando esse como meio para justificar atos que seiram naturalmente entendidos como reprovados, ou seja, o amor que relativiza princípios até então sólidos.
A nossa felicidade não pode estar atrelada à algo que possamos perder, seja um objeto ou uma pessoa. Essas podem prometer fidelidade mas não podem garanti-la.
Amar é ser vulnerável e essa vulnerabilidade só pode ser evitada não amando mas o autor nos alerta que o único lugar onde o indivíduo pode viver sem riscos de amar é no inferno. Nada que se faça preenche a vida o suficiente ao ponto de substituir o amor.
Voltando ao tópico, C.S. Lewis cita que Deus coloca em nós Amor Doação para refletirmos Ele nas nossas ações, enquanto o Amor Necessidade é oposto. Uma face de nós que em nada nos assemelha à Ele tal como o pecado. É ressaltado que o Amor Doação de proveniência divina é desinteressado e busca somente o bem do outro sem qualquer pretensão pessoal, outro esse que não é necessariamente alguém fácil ou digno de amar.
O Amor Doação divino nos leva à ser intencional com quem já retribuiu nossa "bondade" com ignorância, desprezo, falta de educação, desrespeito e até mesmo aqueles que em nada nos ofenderam mas que não nos seria vantajoso ou interessante demonstrar amor. Segundo o autor, essa forma de Amor Doação pode ser mais corretamente definida como sendo Caridade. Ela só é expressa pois o próprio Deus cria em nós o Amor Necessidade pelo outro. C.S. Lewis assevera que a necessidade não é criada. Ela ja existe por sermos seres decaídos. A "intervenção" de Deus, por assim dizer, é para que tenhamos sensibilidade em ver o outro sem que nossos desejos nos dominem de forma suficiente para nos tornar seres egoístas com olhos somente para si mesmos.
Pela caridade ser um amor onde aquele que a recebe não tem qualquer mérito no que lhe está sendo entregue, muitos veem como algo inferior e até ofensivo falar abertamente que está sendo alvo de caridade, sendo que ninguém sente vergonha de receber amor proveniente da afeição, amizade ou do eros.
O autor assevera que todos amores deveriam ser convertidos em formas de caridade, pois só através dela que podemos amar e ter efetivos atos de amor para aquele que não merece e somente aqueles em que o próprio Amor entrou, subirão até o próprio Amor. Não há ou melhor, não deveríamos falar sobre Ele sem vivenciar aquilo que é sua principal definição. Para finalizar a resenha, cabe destacar a citação final que o autor dá ao Amor Apreciativo sobrenatural. Que deveria ser o dom mais desejado pois nele se encontra o verdadeiro centro da vida humana.