Juan199 09/03/2024
"Entendemos mal a unidade que há entre a bondade e crueldade
Autor(a): Frank Herbert
Faixa etária: +15
Idioma: Português
Música: The Land of All (Woodkid)
Ambientado em um futuro distante, ?Duna? acompanha a casa Atreides, uma das mais poderosas de Landsraad. Seu líder, o Duque Leto, recebe um convite vindo do próprio Imperador para ocupar o planeta desértico Arrakis, único onde é possível extrair mélange, a especiaria mais valiosa do universo. O que parecia ser uma boa oportunidade, no entanto, se mostra uma perigosa armadilha política tramada pelo Império em parceria com o Barão Harkonnen para eliminar Leto e sua família, que oferecem riscos à estabilidade do governo autoritário.
A situação piora ainda mais quando Paul, herdeiro da Casa Atreides, é reconhecido pelos nativos arrakianos como o messias Lisan Al-gaib, suposto profeta que virá de outro mundo e trará água e vida para o planeta árido.
Primeiramente, eu gostaria de destacar alguns pontos sobre a minha leitura. Eu comecei sem ter assistido a nenhuma adaptação e, portanto, não tinha conhecimento algum sobre a história. Para completar, li a obra através do kindle em uma edição antiga, que não só possui uma tradução (talvez) levemente ultrapassada, como também ausenta de glossário. Ou seja, tive que dar meu jeito com os inúmeros neologismos, resultando em uma experiência, arrisco dizer, próxima da dos primeiros leitores do livro quando lançado aqui no Brasil. Deixando isso claro, partamos para a resenha!
Esse livro é magnífico! Definitivamente um dos melhores clássicos que já li. A escrita do Frank Herbert é absurda de tão envolvente e a construção da narrativa é de arrepiar.
A evolução dos personagens é tão sutil e bem trabalhada que se torna impossível precisar quando Paul deixa de ser um garoto fraco e encarna realmente a persona poderosa de Muad?dib. Lady Jessica também sofre um aprofundamento incrível, de modo que não parece nem de longe a mesma Bene Gesserit orgulhosa dos primeiros capítulos.
A criatividade de Frank Herbert é indiscutível. Algo que me chamou muito a atenção foi a maneira como ele retrata o futuro. Em sua visão, adequada à época, Herbert defende que a tecnologia é traiçoeira e que os seres humanos não serão capazes de confiar nos computadores nem em 8 mil anos. Tanto é que diversas soluções são encontradas na ficção para substituir as máquinas. Um exemplo são os mentats, que desempenham, literalmente, a função de um google humano. O romance aborda bastante, inclusive, a importância e o perigo que tamanhos retentores de conhecimento representam.
Na minha opinião, pouca coisa na mitologia de Duna é completamente impossível de se concretizar, considerando a distância temporal que nos separa desse futuro hipotético. Tanto nas tecnologias apresentadas quanto na construção da sociedade, tudo é bastante crível.
Algo que me incomodou muito quando lendo e ouvindo pessoas falarem sobre ?Duna? foi a comparação com os livros de Tolkien, especialmente O Senhor dos Anéis. Entendo que as obras foram lançadas em períodos próximos, e ambas (considerando a ?trilogia? de LOTR como uma unidade) tiveram uma relevância incontestável na elaboração de livros de ficção e fantasia nos dias de hoje, mas as abordagens são praticamente antagônicas! Enquanto Tolkien escreve sobre sua perspectiva religiosa e, de certa forma, imperialista, Herbert deixa clara sua crítica em relação à combinação de política e religião (sendo a segunda e terceira partes do livro basicamente estruturadas nessa ideia). Não estou desmerecendo o trabalho de Tolkien (nem de longe eu cometeria essa blasfêmia kksks), mas acho que nesse ponto a minha opinião tende muito mais para o lado de Frank.
Falando um pouco sobre sagas que se beberam muito na fonte de ?Duna?, eu não posso deixar de citar os meus queridos Star Wars e Game of Thrones. A leitura de Duna não diminuiu nem um pouco o meu amor pelas obras. Na realidade, o fato de ter baseado produções tão populares (e divertidas) só aumenta o meu apreço pelo livro de Herbert.
Sobre a escrita, a princípio, por relatos que já tinha escutado, pensei ser muito difícil, mas por fim não se mostrou tão complicada. Para níveis de comparação de complexidade, colocaria ela entre a de J. K. Rowling e a de George R. R. Martin. Não é exatamente um livro fácil para todos, e em alguns momentos o senti arrastado e confuso (apesar de isso, talvez, se dever à tradução antiga).
Falando dos pontos negativos, não me agradou muito a passagem de tempo brusca na transição da segunda para a terceira parte. Tenho noção que o livro já é bem extenso e que essa porção da história talvez não tenha tanto a agregar, mas custava escrever mais 50 ou 100 páginas detalhando, mesmo que de forma ligeira, os acontecimentos essenciais desse intervalo? (Não fiz uma pesquisa sobre as continuações e prequels da saga, então peço perdão caso o tema seja relatado em outros livros).
Além disso, existem as problemáticas já bastante discutidas sobre a gordofobia, expressa principalmente na elaboração do antagonista Barão Harkonnen, e o machismo na maneira como as personagens femininas são tratadas com desdém (em especial Chani e Lady Jessica, que, apesar de desempenharem papéis extremamente importantes, são rebaixadas a simples concubinas e ?acompanhantes? de Paul e Leto, respectivamente. O final dado à Princesa Irulan também me irritou profundamente).
A mensagem principal do livro, felizmente, é muito boa e continua pertinente ainda hoje. Penso, inclusive, que questões de ecologia voltadas para a destruição da natureza pela ganância humana são ainda mais importantes na atualidade.
Enfim! ?Duna? é praticamente uma aula de como escrever uma ficção científica. O romance definitivamente ocupou o posto de melhor livro que já li do gênero (e dificilmente será tirado de lá). Acho que nunca vai ser tarde demais para visitar essa história. Não tenha medo e leia ?Duna?!
OBS: Eu sei, eu sei, eu passei um pouco do limite com essa resenha gigante ksksks. E isso porque eu me segurei para não escrever mais ;-;. Mas de qualquer forma, ao menos consegui colocar as opiniões centrais. Espero que tenha gostado :)