Leila de Carvalho e Gonçalves 05/09/2019
?Stat Rosa Pristina Nomine, Nomina Nuda Tenemus "
?O Nome da Rosa", primeiro romance do italiano Umberto Eco, foi lançado na Itália em 1980 e logo se transformou num prodígio editorial, a ponto de no mesmo ano ser publicado em nosso país. Foi nessa ocasião que eu o li pela primeira vez e trinta e nove anos depois, com o mesmo prazer, acabo de reler.
Seu tema central aborda a liberdade de estudo e ensino, tendo como cenário uma abadia medieval cujo dia-a-dia é minuciosamente retratado. Mergulhada no obscurantismo durante séculos, essa instituição assemelha-se a uma fortaleza e sua biblioteca é protegida pelo dogmatismo religioso que considera a circulação do conhecimento potencialmente perigosa à Igreja.
Sede de um conclave, enquanto dominicanos e franciscanos travam um duelo ideológico, uma série de assassinatos misteriosos roubam a atenção do lugar. Durante a investigação, Eco coloca em discussão o paradoxo entre velhos valores, fechados e místicos, e novas ideias, mais abertas e racionais. A própria conduta escolhida para elucidar as mortes aponta para esse aspecto, a princípio consideradas sobrenaturais, no final, sob uma cuidadosa análise, acabam oferecendo uma explicação demasiadamente humana.
O autor é um erudito e sua obra ficcional, rica em conhecimento histórico, é tanto apreciada por seus admiradores como menosprezada pelos detratores. Consequentemente, a leitura é inimiga da pressa e requer atenção, pois a imaginação labiríntica de Eco, às vezes, faz o leitor perder o fio da meada, porém esse é um desafio que merece ser enfrentado.
"O Nome da Rosa", no meu entender, é seu melhor romance e o mais acessível. Uma boa oportunidade para refletir sobre o bem e o mal, o certo e o errado, a medida que a moral cristã é colocada em xeque, comprovando que o que há por trás dos conceitos e crenças atuais, nada mais é do que uma sucessão de indagações que repercutem há séculos no seio da Igreja.
Concluo com a última frase do romance: ?Stat rosa pristina nomine, nomina nuda tenemus", isto é, "A rosa só permanece no nome, nada temos além dele". Trata-se de um louvor ao poder da palavra, que é capaz de expressar até o desconhecido e o inexistente, ideia que permeia e nomeia o livro. De acordo com Eco, uma escolha adequada, à medida que o título não antecipa qualquer interpretação prévia do leitor.
Nota: Meu comentário refere-se a décima segunda edição da Editora Record. Em capa dura, ele foi impresso em papel off-white de alta gramatura e boa opacidade. A fonte escolhida foi a Minion Pro Regular com tamanho um pouco menor do que o habitual, mas essa opção não chegou a incomodar a leitura. Infelizmente, não encontrei nenhuma referência às ilustrações e ao design gráfico, informações que a Editora Record ficou devendo.