Bruno Araújo 18/05/2024
UM POLÊMICO NATURALISTA
Atravessado pelas polêmicas e críticas ferozes, “Bom Crioulo” de Adolfo Caminha tornou-se uma obra que sobreviveu às marés preconceituosas das décadas para ser considerada historicamente o primeiro romance com temática homossexual da literatura brasilieira.
Amaro, o nosso protagonista gay, negro e trabalhador braçal, vê na Marinha a oportunidade possível de conquistar a liberdade tão almejada e viver distante da realidade bárbara nos cafezais escravagistas. E só por esse recorte de características e pela importância que exerce na narrativa, Bom Crioulo por si só já se apresenta como um personagem transgressor que transita diretamente contra os costumes vigentes em sua época de publicação.
Aleixo, púbere grumete de olhos azuis e cachos dourados, surge na narrativa para movimentar e desestabilizar os eixos de Bom Crioulo, como também de Carolina, uma antiga prostituta e untuosa portuguesa bancada pelo açougueiro da cidade e proprietária de um sobrado na rua da Misericórdia. O adolescente, munido de jovialidade, da mesma maneira que a Lua gira em torno da Terra atraindo por gravidade os oceanos para si, Aleixo atrai, mesmo que inconscientemente, os desejos mais íntimos e os prazeres mais culposos de Bom Crioulo e da dona da pensão onde inclusive passam a se encontrar os dois marinheiros durante as folgas do ofício. Desse modo, o jovem e ingênuo garoto torna-se sob os olhos de seus algozes um corpo fetichizado, objetificado e alvo das paixões brutais de Amaro e Carolina.
“Bom Crioulo” é um romance severo naturalista que retrata a animosidade dos impulsos e da vontade da natureza humana. O final violento e trágico exibe a cena de uma completa aniquilação movida pelo ciúme e pela cobiça incontrolável. A homossexualidade aqui submerge furiosamente em um amor incorrespondido e avassalador entre as ruas urbanas do Rio de Janeiro e o mar de profundezas vertiginosas das emoções humanas.
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